Muda tudo, nada muda

A câmara dos deputados acaba de aprovar a terceirização de todas as atividades. Explico. Os empregadores não estão obrigados a registrar em carteira os empregados; podem trata-los como trabalhadores autônomos, até empresários. Tipo assim, você chama sua secretária com vinte anos de trabalho e diz a ela “a partir de amanhã você é Jhennifer da Silva ME”. ME significa microempresa, ainda que a secretária faça e aconteça dez horas por dia.

Não é bem assim, exato assim, só adoto a filosofia Nelson Rúbens, antigo jurado de Sílvio Santos: “eu aumento, mas não invento”. É a técnica de carregar nas tintas para ressaltar a cor chocante da realidade. Rodrigo Maia, o presidente da câmara, fez isso ao dizer que a Justiça do Trabalho é perniciosa ao ver empregado até em chifre de cavalo, dando-lhes direitos em demasia. Foi uma demasia do deputado. Apenas uma demasia. Os juízes trabalhistas foram ficando intoxicados pelas sobras do protecionismo getulista.

Fiquei trinta anos nessa seara, a maior parte deles ao lado dos beneficiados pela Justiça do Trabalho. Se exageros vi, foram poucos, como de resto em qualquer Justiça, como a federal, da Lava Jato. O problema não está na Justiça do Trabalho, está nos deputados e senadores. Os juízes não inventam direitos, eles os retiram das leis, que os atribuem com demagogia por deputados e senadores. Os juízes trabalhistas são sim tolerantes com as provas de violação dos direitos dos empregados.

Por que a tolerância com as provas? Porque neste Brasil de pequenos empresários e trabalhadores sem maiores cuidados com documentação, os juízes dão elasticidade na identificação dos direitos. As leis podem atribuir direitos até inviáveis, mas estes são paliativos para a crônica situação econômica do subdesenvolvimento. Assim o décimo-terceiro, férias de trinta dias com adicional, fundo de garantia, PIS são meros complementos de salário, os dois últimos impostos em disfarce.

Já fui longe para as dimensões do blog, o dobro das vinte linhas que não cansam o leitor nético. Terceirizações liberadas sem critério significam mais um ato irresponsável, resposta imediatista a demanda empresarial, que de um lado favorece o fluxo de caixa das empresas e de outro agrava o subemprego. Funcionará no padrão dos ciclos curtos, diminutos, como tudo no Brasil. Passada a eleição, a reivindicação pela volta bate no Congresso. E teremos a desterceirização. Plus ça change…

Rogério Distéfano

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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