Ruy Castro – Folha de São Paulo
Cientistas ingleses, depois de 40 anos submetendo a sequenciamentos de DNA o corpo mumificado de uma mulher do século 18 encontrado na reforma de uma igreja de Basileia, descobriram que se tratava da tataravó do atual ministro do Exterior britânico e ex-prefeito de Londres Boris Johnson. Chamava-se Anna Catharina Bischoff, viveu de 1719 a 1787, era suíça e, nascida numa família rica, fazia trabalhos de assistência social na França, como o de cuidar de pessoas com sífilis.
Como você se sentiria se soubesse que a sua tataravó, que julgava entregue ao descanso eterno, levara as últimas décadas pulando de geladeira em geladeira, tendo suas gazes desenroladas e sendo escovada e escarafunchada por sujeitos de jaleco? Para sorte de Johnson, vovó era uma mulher formidável. Mas suponha que ela participasse de eventos de que foi contemporânea, como ter sido fornecedora dos brioches de Maria Antonieta ou namorada do marquês de Sade –como explicar isso para o eleitorado?
Da mesma forma, outra equipe de cientistas britânicos –ninguém ganha deles no quesito múmia– acaba de estabelecer que duas famosas múmias egípcias, datadas de 1.800 a.C., filhos de um importante nobre local e conhecidos como “Os dois irmãos”, são, mais exatamente, meio-irmãos.
O exame de DNA deu que a mãe é a mesma, mas os pais são diferentes. Ou seja, quase 2.000 anos depois, a ciência cria uma nova narrativa no seio de uma influente e feliz família do Cairo, insinuando que, sob a alegação de que precisava ir ao mercado para comprar um quilo de tâmaras, madame ia na verdade se encontrar com o sultão no oásis. E aí, como ficam seus descendentes?
Lula já está no sarcófago, mas as futuras múmias de Temer, Aécio e outros que se cuidem. Suas gazes serão desenroladas assim que perderem o foro privilegiado.