Glória envelheceu, claro. Todos envelhecemos, mas o que Glória desfilava era o vigor de sua existência. Ao se recusar a dizer sua idade nas últimas décadas sabia que a sociedade tenta nos colocar em caixinhas etárias, à medida que nos cobra aposentadoria do trabalho, da vida social, do sexo, cabelo longo, da saia curta.
Glória foi “ageless” (sem idade) muito antes desse termo entrar na moda. Ageless no RG, por escolha dela, e ageless na vida que levava. Foi responsável por derrubar vários estereótipos geracionais que são impostos às mulheres desde que o mundo é mundo. Uma cultura tão impiedosa que foi preciso surgir uma palavrinha para definir uma onda feminina que desafia os conceitos caquéticos do envelhecimento.
Se hoje as mulheres se orgulham em dizer a idade, de gritar seus 50, 60, 70 anos, é porque tivemos Glória Maria, que mostrou a todos o conceito ageless na prática. Uma vida sem as amarras do tempo, na qual há vários caminhos para o envelhecimento e em que nenhum deles o destino é o tédio de uma rotina desinteressante.
Ageless é abraçar os anos, a experiência acumulada com outra atitude. É manter autonomia, exercer a cidadania. É olhar para o presente e para o futuro com otimismo de quem tem muita história para viver.
Glória sabia que aos 50 anos ganhamos um tapinha nas costas, um carimbo de prazo de validade vencido e um bilhete para o maravilhoso mundo das mulheres invisíveis. Um abismo onde não somos mais ouvidas, vistas e não temos mais representatividade. Ao se recusar a dizer a idade, ela desafiou todas as convenções. Mostrou que num RG desbotado cabem muitas novas possibilidades, histórias de amor, desafios profissionais, roupas justas e decotadas, viagens exóticas, filhos.
Não importa a idade de Glória Maria. Importa como ela viveu. E ela viveu como poucos.