Aprendi na faculdade de Direito que decisão judicial não se discute; cumpre-se. A vida, porém, ensinou-me que uma decisão judicial deve, sim, ser cumprida, mas pode ser também discutida. Nos autos do processo ou fora deles. Afinal, como instituição pública, o Poder Judiciário está sujeito, como todas as demais, a críticas e polêmicas.
Aprendi, também, que ao Supremo Tribunal Federal, a mais elevada corte de Justiça do país, cabe defender a Constituição Federal e julgar questões de constitucionalidade e inconstitucionalidade, em última instância de julgamento. É o consta da Constituição Federal da República.
No entanto, como, segundo o ex-ministro Marco Aurélio de Mello, do próprio STF, vivemos tempos estranhos, às vezes, tenho me surpreendido com decisões do chamado excelso pretório, que, de um tempo para cá, passou a legislar, usar poder de polícia e ditar regras de comportamento. Além de proferir decisões no mínimo controversas.
A mais recente delas, ao liberar juízes para atuarem em causas de escritórios de parentes, foi de doer. Quer dizer, aquilo que já acontecia na surdina, por debaixo dos panos, passou a ser oficialmente permitido. Um absurdo! Segundo se anuncia, a questão foi levada ao STF pela Associação dos Magistrados Brasileiros para quem o veto feria o princípio da proporcionalidade. Votaram pela mudança da regra os ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux, Cristiano Zanin, Dias Toffoli, Kássio Nunes Marques e Alexandre de Moraes. Não por acaso, Zanin tem a mulher advogada, com quem dividia, até bem pouco tempo, o escritório; outros têm também a mulher ou filhos na advocacia. Casos de Gilmar, Toffoli, Moraes, Fux, Luís Barroso e Edson Facchin. Votaram contra Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Edson Facchin.
A AMB alega que a vedação estabelecida pelo Código de Processo Civil “peca” por falta de razoabilidade ou de proporcionalidade ao exigir dos magistrados “uma conduta impossível de ser observada”.
Então, em nome da razoabilidade e da proporcionalidade, os magistrados passam a atropelar outros princípios constitucionais, como o da moralidade, da imparcialidade e da impessoalidade, e incentivam o tráfico de influência no âmbito processual. Coisa de dar arrepio.
Vale registrar que tanto a Procuradoria Geral da República quanto a Advocacia-Geral da União manifestaram-se pela constitucionalidade do dispositivo. O ministro Edson Facchin, relator da ação, já votara, em 2020, pela constitucionalidade, juntamente com Rosa Weber, Cármen Lúcia e Barroso, este com exceções.
O processo, aliás, começou a tramitar no STF em 2018 e o julgamento chegou a ser iniciado em 2020. Mas aí, um significativo pedido de vista – por quem?!. Claro, por Gilmar Mendes, interrompeu a tramitação. E levou três anos para “melhor estudo”…
Que mais dizer? Talvez que a Suprema Corte que, oficialmente, continua sendo a guardiã da Constituição, com a alta responsabilidade de garantir a autoridade da norma constitucional em todo o país e dar a última palavra em matéria de interpretação dos princípios e regras estatuídas pela Carta Magna, não é mais aquela – como tanta coisa neste país.
Nem por isso, no entanto, deve fechar as portas e encerrar as suas atividades, como sonha o bolsonarismo e os seus aloprados criminosos tentaram fazer em 8 de janeiro.