Há 20 anos, uma conhecida me pediu ajuda para realizar um aborto. Éramos estudantes em um país onde o procedimento é legalizado. O relacionamento que vivia tinha se tornado violento e ela avaliou que um filho, naquelas circunstâncias, não era opção. Foi um dos episódios que, anos mais tarde, me fez levantar a bandeira do feminismo. Nunca passei por um aborto, mas entendi que nenhuma mulher pode ser criminalizada.
Outras razões me levaram a empunhar a carteirinha de ativista. Elas foram se impondo à minha vontade de permanecer às margens das discussões. Percebi que ter tido uma criação igualitária era um privilégio; que as minhas conquistas, só possíveis pelos caminhos abertos pelas mulheres da minha família e por aquelas que se sacrificaram ao longo da história, precisavam ser compartilhadas e defendidas para que outras pudessem viver essas mudanças.
Se, na prática, eu exercitava uma vida plenamente livre, na teoria nem sempre fui feminista, por falta de identificação com parte do movimento. Descobri a pluralidade do feminismo, o que me aproximou de bandeiras que beneficiam as maiores vítimas do machismo, aquelas menos favorecidas socialmente. Deixo para uma minoria que não me representa as pautas que parecem questões individuais e deságuam em frustração e raiva e só reforçam estereótipos que enfraquecem a causa.
Precisamos de reforço. É urgente que mulheres e homens abracem o feminismo mesmo que pensem que não dependem dele ou que não farão diferença, como também pensei. Se você acredita em igualdade, é feminista e vai achar a sua turma.
Minha colega, de quem eu perdera o contato, me achou nas redes sociais. Agradeceu a ajuda. Está casada, tem dois filhos adolescentes e é feliz. Agradeço a ela por ter despertado a sororidade em mim quando eu nem sabia o que isso significava e por ter regado a sementinha da feminista que eu viria a me tornar um dia.