– Castelo Branco, Castelo Branco! Só podia ser parente daquele presidente canalha!
A palavrinha ficou registrada em minha mente por anos. Tinha vergonha de perguntar aos meus pais porque a senhora havia dito que existia um presidente infame com meu sobrenome. Seria eu, por conseguinte, um canalha-mirim? E minha avozinha, tão meiga, uma macróbia canalha?
Outro problema: sonora como era, a palavra poderia ser pornográfica, como punheta, xereca, siririca, xibiu. E proferir isto na frente de uma família nordestinamente patriarcal, seria algo muito canalha de minha parte.
Este pequeno artigo é o resumo de grande uma obsessão, de mais de 40 anos. Ele comprova a célebre frase de Nelson Rodrigues de que “nenhum canalha é ridículo.”
Como sempre, as definições dicionarizadas (do italiano, canaglia; sujeito vil e infame e do latim “canalia” — coletivo de “canis”, cão) não exprimem muito bem a subjetividade dos termos importantes.
Sem querer bancar o canalhocrata, mas os biltres merecem muito mais da nossa linguística nacional. Afinal de contas, não sejamos hipócritas: o Brasil é o maior celeiro de tratantes do Hemisfério Sul. Se a economia e a política prosseguirem nos moldes de hoje, brevemente nosso mais importante produto de exportação não será mais o café, a soja, os sapatos de Franca: serão contêineres e contêineres repletos de pulhas.
Países que desejarem incremento na baixaria de seus Congressos importarão canalhas-políticos “made in Brazil”; nações desejosas de achincalhar a sua imagem importarão canalhas-marqueteiros. Todavia, é bom que se diga, há correntes que defendem os canalhas-advogados como mais ISO 9000 que qualquer outro tipo de nefando.
O produto brasileiro é infinitamente superior a seus concorrentes das Américas Central e Latina.
Para um canalha nacional, 100% puro, a moral e os bons costumes são apenas uma nota de pé de página no livro da vida. O canalha tupiniquim não tem ideologia, tem primazia. Não rouba, malversa. Não se mete, mete. E, claro, faz tudo isso com grande cordialidade, simpatia, suavidade. E de roupa.
Estudiosos da canalhice e da cafajestagem como fenômeno social afirmam que, no Brasil, existem 60 cafajestes diferentes para cada Frei Galvão. Por esses e outros exemplos constatamos que o sociólogo Gilberto Freyre poderia perfeitamente ter batizado seu mais famoso livro de “Casa Grande & Canalha”.
Ainda assim, e com todos esses atributos, o Brasil ainda está bem distante do Primeiro Mundo no quesito patifaria. Mesmo com tantos casos célebres, ainda falta muita calhordice até que se consiga produzir um canalha-premium como Donald Trump.