Sentimento de vitória é pelo reconhecimento de que isso é questão de saúde pública
Repita comigo: ninguém celebra o aborto. Ninguém. O que é comemorado quando há avanços na legislação que rege os direitos reprodutivos é que o Estado seja impedido de prender, julgar, aprisionar mulheres que decidem interromper a gravidez. Foi o que aconteceu na Colômbia, onde a Corte Constitucional decidiu que o aborto não deve ser tratado como crime até a 24ª semana de gestação. A decisão precisa ser regulamentada pelo Congresso.
O prazo de quase seis meses que poderá ser adotado pelos colombianos virou combustível para que os movimentos feministas sejam acusados de “celebrarem o aborto”. Os supostos defensores da vida ignoram dados oficiais para fazer crer que exceções podem virar a regra. Dados do BMJ Sexual & Reproductive Health mostram que 9 em cada 10 interrupções são realizadas até a 12ª semana em mais de 20 países de alta renda.
Então, repita comigo: nenhuma feminista é “assassina de bebês”, como acusam parlamentares dessa direita histérica que chegou ao poder. O próprio presidente já sugeriu que esta colunista seja “genocida”, mas quem ficará na história como responsável por um governo que enterrou 650 mil numa pandemia é ele.
A discussão sobre prazos seria saudável, mas a argumentação é rasteira e politiqueira. Ninguém quer matar bebês, ninguém defende a adoção do aborto como método contraceptivo, ninguém quer transar por aí sem cuidado. E não dá para dizer que “as mulheres não fecham as pernas” e que “só engravida quem quer”.
Celebra-se o fato de que a Justiça de outro país libertará quase 350 mulheres encarceradas por terem se submetido a procedimentos que não deveriam ser clandestinos. O sentimento de vitória é pelo reconhecimento de que o aborto é uma questão de saúde pública, pelo posicionamento solidário do Estado, que passa a preservar a integridade física e psíquica da mulher.
A conquista das colombianas é de todas nós.