Todo escritor já sonhou com isso: criar personagens cujos nomes se incorporem à língua como se eles tivessem existido. Algo assim como Iracema, Capitu, Macunaíma, Gabriela ou a garota de Ipanema —tornaram-se tão parte de nossa vida que muitos se surpreendem ao saber que eles foram inventados. E, pensando bem, por que precisariam saber? Bem, não posso falar pelos outros, mas eu quero saber. Daí, fiquei contente por descobrir, pelo obituário da Folha (26/8), quem batizou aquela deliciosa turma dos quadrinhos: Luluzinha, Bolinha, Aninha, Raposo, Glorinha, Alcéia —a turma do Bolinha, você sabe.
Foi a tradutora paulistana Maria Flora Whitaker Salles, que acaba de nos deixar, aos 86 anos. Em 1955, “Little Lulu”, um sucesso dos gibis americanos, fora comprado pela então poderosa editora de O Cruzeiro, cuja diretora, Maria Amélia Whitaker Gondim de Oliveira, era prima de Maria Flora. Maria Amélia lhe ofereceu o trabalho. Maria Flora aceitou e, de seus amigos, conhecidos e familiares, saíram os nomes que ela sapecou em Luluzinha e demais personagens —no caso dos mais antipáticos, não sem uma ponta de maldade da tradutora.
Daí me perguntei sobre outros antigos heróis dos quadrinhos. Quem batizou os sobrinhos do pato Donald, Hughie, Dewie e Louie, de Huguinho, Zezinho e Luizinho? E Scrooge McDuck de Tio Patinhas? E os esquilos Chip e Dale de Tico e Teco? Quem fez de Bugs Bunny, Pernalonga? De Alley Oop, Brucutu? De Maggie e Jiggs, Pafúncio e Marocas? De L’il Abner, Ferdinando? E, da mãe de Ferdinando, Mammy Yokum, Chulipa Buscapé? Alô, pesquisadores.
Nem sempre deu certo. Clark Kent, recém-chegado ao Brasil, ganhou o nome de Edu. Não colou. Já Batman começou como o Homem-Morcego e logo teve de voltar a ser Batman.
Mas ninguém supera Maria Flora. Foi madrinha também de Zé Colméia, Catatau, Dom Pixote, Manda-Chuva, Babalu e Pepe Legal.