Senhoras e senhores, o quadro é este: por meio do presidente da República e sua súcia, os cidadãos foram informados de que os esquadrões da morte, milicianos e adjacências usam a expressão “CPF cancelado” em referência a execuções perpetradas em nome da lei. A foto divulgada ontem, com Jair Bolsonaro segurando o cartaz vergonhoso, com aquele sorriso entre idiota e cínico, ao lado de mais uma torpeza produzida pela TV brasileira e ministros, inclusive o da Educação (sim, temos um), é uma das imagens mais ignominiosas já produzidas pela política brasileira. A morte foi festejada em meio a centenas de milhares de “CPIs cancelados” pelo vírus assassino e os seus cúmplices no Brasil, o maior deles o próprio presidente da República.
A divulgação da foto veio na sequência de outra aberração moral: no julgamento no Supremo Tribunal Federal que chancelou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro nas condenações de Lula e, assim, jogou no lixo a montanha de provas contra o ex-condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou textualmente que o combate à corrupção promovido pela Lava Jato gerou mais prejuízos ao país do que a própria corrupção, num tipo de contabilidade criativa que não leva em conta quaisquer valores que costumam fazer a grandeza das nações, como a honestidade, o esforço e o mérito — e cujas recompensas são estendidas a toda a sociedade, não apenas a um pequeno grupo de salafrários. O ministro também rasgou a lei ao admitir que não havia problema nenhum no tribunal lançar mão de provas criminosas, as mensagens roubadas por hackers, para livrar Lula, porque elas haviam sido amplamente divulgadas e o seu teor não havia sido negado. Um juiz que renuncia à forma legal não é juiz: é carrasco da Constituição e dos códigos de processos. A Justiça também teve o seu “CPF cancelado” no STF.
Enquanto isso, no Legislativo, senadores e deputados, com as exceções de praxe, continuam a mentir que o país seria paralisado com o impeachment de Jair Bolsonaro. Que o negócio é “trincar os dentes”, como afirmou Tasso Jereissati, muito à vontade no seu novo papel de “Biden brasileiro”. A verdade é que uma parte anseia por achacar ainda mais o Palácio do Planalto, urubus disputando nacos da carcaça estatal, e a outra quer ver o presidente sangrando até as eleições de 2022, por acreditar que ele será o candidato ideal a ser enfrentado, já que o seu cartão de visitas será a pilha de brasileiros mortos por Covid e a economia arruinada. Deputados e senadores, portanto, preferem deixar de lado o remédio rápido para estancar as barbaridades de Bolsonaro em relação ao combate à pandemia e apostar nos “CPFs cancelados” dos que virão a morrer por falta de coordenação nacional no enfrentamento do vírus.
Tal é o quadro, senhoras e senhores. O Brasil é um CPF cancelado.