Entre 501 a 202 a.C. foram nomeados 85 ditadores em Roma. A principal função da ditadura era militar. Apenas um ditador era nomeado por decreto do Senado romano.
A ditadura no mundo romano representou a legalização da tirania por um instrumento superior à República em momentos de perigo, para proteger a ordem existente. O tirano não tinha limites para impor a normalidade da República. Sua função era transitória e todas as magistraturas ficavam suspensas pelo seu poder.
Passaram-se os séculos e no Brasil as Forças Armadas, a partir do século XIX, em vários episódios históricos, foram protagonistas de golpes e tentativas da tomada de poder do Estado.
Os períodos recentes de malfeitos foram: a ditadura de 1964-85 e o golpe parlamentar de Temer de 2016 que se prolongou até 2022. Na passagem de bastão de Temer para Bolsonaro as eleições foram garantidas pela prisão do candidato que poderia derrotar o então militar reformado, eleito em 2018, e a repentina mudança na jurisprudência do STF.
Essas histórias ainda não foram contadas adequadamente, nem a de 1964-85 nem os seis anos de 2016-22.
Duas obras analisam esse período recente: “Os Onze” e “O Tribunal”, de Felipe Recondo e Luiz Weber, uma radiografia da atuação pendular do STF.
A possibilidade de os poderes serem totalmente engolidos pelo Poder Executivo veio com a estratégia esfarrapada de questionar as urnas eletrônicas. Iriam sucumbir o Congresso, o Supremo e a Constituição.
Dentre outros discursos, atos e tentativas frustradas, o ataque ao STF foi no sentido de isolá-lo institucionalmente dos outros poderes e da população. Um derretimento constante por meio de discursos hostis e desabonadores por parte do Poder Executivo.
Agora, na marcha inevitável da prisão de golpistas, tem-se a resistência de um Congresso Nacional e de alguns governadores com parcela composta por apoiadores daquela proposta de ditadura, eleitos na esteira das emendas secretas e com o apoio neopentecostal messiânico que se instalou na política.
Duas posturas foram preponderantes nesse caminho: a da omissão às investidas antidemocráticas e a do apoio ora velado, ora explícito, pelos partidos a esse movimento ditatorial.
O retrato dessa era de suspiros e pretensões autoritárias é a leitura da biografia de Adriano da Nóbrega, o chefe do Escritório do Crime no Rio de Janeiro.
No livro Decaído, o autor, Sérgio Ramalho, dá uma ideia de como as milícias cresceram e sua íntima ligação com setores da política brasileira.
De um matuto que vivia na miséria, Adriano, no crepúsculo da sua vida, faturava 800 mil reais por mês, uma quantia digna de um CEO, com valores auferidos com a exploração de atividades ilegais: caça-níqueis, assassinatos a soldo, construção de prédios ilegais e da cobrança de taxas de proteção.
Antes do assassinato de Marielle Franco, três políticos foram executados em circunstância análogas, o mesmo modus operandi do Escritório do Crime.
Defendido de forma veemente pelo ex-presidente da República e seus filhos numerais, à medida que os malfeitos de Adriano foram sendo divulgados, a mesma verve foi no sentido contrário, a de negar a amizade com o criminoso.
As semelhanças entre Adriano da Nóbrega e Cláudio Guerra, um ativo e destacado policial da ditadura militar (1964-1985), são muito grandes: grampos ilegais, ligações com o jogo do bicho, milícias, matadores de aluguel e os narcos, mas o principal; o fascínio pelo assassinato de inocentes e dos opositores políticos.
As ditaduras são assim.