O impeachment de Dilma Rousseff e a cassação de Eduardo Cunha estão agora entrelaçados, mais distantes no calendário, mas com futuros separados e perspectivas diferentes.
O pedido de cassação de Eduardo Cunha, por iniciativa do PSOL e da Rede de Marina, demorou 15 dias para ir da Mesa da Câmara ao Conselho de Ética, onde chegou ontem. É um prenúncio. Os prazos do Conselho e as férias de verão do Congresso, a começarem em 22 de dezembro, não se entendem bem com a decisão sobre Cunha. Não há previsão do que o relator pretenda, entre inquirição de testemunhas e coleta de documentos, para formar sua proposta ao Conselho. Não é provável, portanto, que mesmo nessa instância preliminar haja decisão antes do recesso parlamentar.
Remota embora, no entanto pode haver. Se, porém, houver e for pela cassação de Eduardo Cunha, a proposta ainda terá de passar à instância seguinte, o plenário que efetivará a medida extrema ou a absolvição. Logo, mesmo que o Conselho de Ética submeta a proposta de cassação ao plenário, só daqui a mais de três meses haveria a decisão final.
Pressa, ou desejo mal controlado, produziu ontem a notícia “Câmara recomenda a Cunha dar aval ao impeachment”. Falta muito para a Câmara chegar à etapa de iniciativas e decisões. A pedido de Eduardo Cunha, assessores teriam concluído parecer que aprova o embasamento jurídico do pedido de impeachment de Dilma assinado por Hélio Bicudo, Reale Jr. e Janaína Paschoal. Mas também há a informação –aliás, citada de raspão pelo “Globo”– de um parecer em sentido contrário e também pedido por Cunha. Para dar ares jurídicos à decisão que tome, de encaminhar ou arquivar o requerimento de impeachment. Duplicidade sensata, mas sobretudo típica de Eduardo Cunha, o astuto.
Nestes dias de “nova mídia”, depois de ler o noticiário é recomendável recorrer aos mais bem informados para saber qual das informações contraditórias é mais confiável. Ou menos inconfiável. Do almoço na casa de Eduardo Cunha, anteontem, aquele jornal do Rio publicou que os presentes ouviram dele que sua decisão, sobre encaminhamento do pedido de impeachment, “dependerá de um fator externo”. Qual seja, haver ou não pedido do procurador-geral da República ao Supremo para o afastamento de Cunha. A medida o levaria a agir contra Dilma. Mas também se podia ler que os outros presentes nada ouviram sobre o procurador-geral e sobre tal assunto.
É óbvio que Eduardo Cunha fez do pedido de impeachment uma arma de muitas utilidades. Mesmo inexistindo submissão do procurador-geral ao governo ou a Dilma, associá-los é a maneira encontrada por Cunha para justificar sua manipulação do impeachment. Mas, sem contrariar esse jogo, da sua e da parte do governo há sinais de novos conceitos mútuos. Os quais, se consolidados, vão se refletir em disposições também mútuas.
Em prazos, as perspectivas para Dilma, quanto ao pedido dos três juristas, são mais ou menos as de Cunha. Mesmo o potencial de um processo parlamentar proveniente do Tribunal de Contas da União, sobre as “pedaladas”, é pequeno, já por não se tratar de crime de responsabilidade, como exigido para impeachment.
Logo, tudo no Brasil está e continuará, ainda por meses, pendurado em dois assuntos tão vivos quanto mortos. Ainda que se resolvam algumas pendências do governo no Congresso, para o desajuste econômico, para os próximos meses não se vislumbra promessa de situação definida, em qualquer sentido.
Afora uma hipótese, merecedora de expectativa. Na Procuradoria Geral da República aumenta a confiança em que seu material sobre Eduardo Cunha leve a muito mais do que processos comuns por recebimentos ilegais, evasão de divisas, lavagem e contas não declaradas. Nas suas considerações, a Procuradoria nem se preocupa com férias parlamentares.
Rodrigo Janot leu que o verão vai ser quente como poucos. E não havia outra notícia dizendo o oposto.