O sal que nos proteje

Se Iemanjá é a rainha do mar, força poderosa do fundo dos oceanos, sentado no trono de soberano dos sete mares e das colônias abissais está Sua Majestade o rei Sal, este senhor da natureza que nos dá energia, saúde e nos protege da inveja e do mau-olhado.

Do sal da terra veio o primeiro perfume do homem, o primeiro tempero da civilização. Ele traz esperança de um novo dia desde o primeiro sopro de vida. Quando baianos, cariocas e milhares de seus outros súditos deitam flores entre sete ondas, não sabem eles que todas as oferendas serão depois encaminhadas ao soberano Sal, o senhor de Iemanjá.

O caminho de um ano novo, repleto de saúde, paz e prosperidade, leva ao mar. Depois do

champanhe, Iemanjá nos lava, nos limpa e nos perfuma com a maresia. Quem nos impregna a pele de viço para os dias que vão chegar é Sua Majestade o Sal.

Quando dizem que nada é mais afrodisíaco que um demorado banho de mar, os motivos vão bem além da poesia
– Olha que coisa mais linda / Mais cheia de graça / É ela menina, que vem e que passa / Num doce balanço a caminho do mar.

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Segundo o livro Sal: uma história do mundo, de Mark Kurlanski, o psicólogo Ernest Jones, amigo de Sigmund Freud, publicou em 1912 um ensaio sobre a obsessão humana com o sal, uma fixação que ele considerava irracional e, em nível subconsciente, sexual.

O sal, dizia Jones, está associado à fertilidade. Uma noção que pode ter se originado da observação de que os peixes de água salgada têm proles muito maiores que os animais terrestres. Ainda no mar, os navios que transportavam sal eram geralmente infestados de ratos, e durante séculos se acreditou que os

ratos se reproduziam sem sexo, simplesmente porque viviam no sal.

Os romanos, lembra Jones, chamavam o homem apaixonado de salax, em estado salgado, e daí deriva a palavra salaz.
“Nos Pirineus, os noivos iam à igreja levando sal no bolso esquerdo para prevenir-se contra a impotência. Em algumas partes da França, somente o noivo carregava sal; em outras, somente a noiva. Na Alemanha, era comum salpicar os sapatos da noiva.”

Ernest Jones vai mais além na sua tese:
“Os celibatários sacerdotes egípcios abstinham-se de sal porque este excitava o desejo sexual; em Bornéus, quando os homens da tribo dayak retornavam da caça, a abstinência de sexo e sal era um requisito; quando um pima matava um apache, marido e mulher se abstinham de sexo e sal por três semanas”.

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Um banho de mar é preciso, porque os espíritos malignos detestam sal.
“No teatro japonês tradicional – lembra o livro de Mark Kurlanski -, espargia-se sal sobre o palco, antes de cada apresentação, para proteger os atores dos espíritos do mal. Judeus e muçulmanos acreditam que o sal protege contra o mau-olhado. O livro de Ezequiel recomenda esfregar os recém-nascidos com sal para resguardá-los do mal.”

Na “Última Ceia”, Leonardo da Vinci pintou um saleiro entornado diante do cotovelo de Judas. Desperdiçar sal não presta, traz mau agouro. Deixá-lo cair no chão dá azar. Passar o saleiro diretamente para as mãos de outras pessoas chama a morte.

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“Sois o sal da terra”, disse Jesus aos apóstolos (Mateus, 5: 13).

Homens e mulheres de boa vontade, todos ao mar neste primeiro dia de 2008.

Dante Mendonça [30/12/2007]O Estado do Paraná

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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