Ruy Castro – Folha de São Paulo
Desponta uma nova e inevitável aliança
Uma amiga minha estava diante de uma juíza prestes a decidir um duro conflito envolvendo sua filha e seu genro. Parecia não haver dúvida sobre quem era o vilão da história. Mas, para surpresa geral, a juíza decidiu a favor dele —do vilão. Minha amiga não pôde conter uma exclamação, tipo “Oh!” ou “Ah!”, de espanto e decepção. A juíza a ouviu. Vendo naquele “Ah!” ou “Oh!” uma afronta ao Judiciário, a juíza acusou-a de desacato e mandou prendê-la ali mesmo. Minha amiga passou a noite na cadeia. Seu ex-genro saiu rindo.
Mas isso foi no tempo em que decisões judiciais não se discutiam —cumpriam-se. Hoje, qualquer veredicto de um juiz ou colegiado leva uma chuva de ataques assim que é proclamado. Se o resultado não agrada a uma das partes, duvida-se em voz alta da idoneidade do juiz, de sua boa-fé e até de sua honestidade. Os juízes, agora, fingem não ouvir. Seus ofensores —vários vergados sob processos que recomendariam um mínimo de prudência —continuam assobiando no azul.
Julgamentos só são considerados isentos se favorecerem certo ponto de vista. Mas que ponto de vista é este que só enxerga um viés maldoso quando o desfavorecido é Lula —e, pela omissão, parece achar perfeita a situação de Sérgio Cabral, Eduardo Cunha, Paulo Maluf, Marcelo Odebrecht, Léo Pinheiro e outros presos e/ou condenados?
E onde foi parar a solidariedade para com velhos camaradas como José Dirceu, Antonio Palocci, Delúbio Soares, João Vaccari, João Santana, José Carlos Bumlai, Henrique Pizzolato, Nestor Cerveró? E será que virarão as costas a Delfim Netto, que tantos bons serviços lhes prestou?
Mas esse viés é mais elástico do que se pensa, e a prova disso pode acontecer em breve. Desmoralizando uma famosa palavra de ordem, desponta uma nova e inevitável aliança: Lula e Temer.