RIO DE JANEIRO – Uma das coisas que admiro nas pessoas que sabem muito é o desapego. Elas não se contentam em saber –espalham generosamente o que sabem, vivem prontas a ensinar e fazem isso de graça, pelo prazer de ajudar. O conhecimento não é para ser guardado a ferros, mas dividido –aliás, a única maneira de multiplicá-lo.
Tive a sorte de trabalhar ou conviver com alguns verdadeiros arquivos vivos, gente capaz de responder na lata sobre muitos assuntos além dos de sua área –entre outros, Otto Maria Carpeaux, R. Magalhães Jr., Franklin de Oliveira, Antonio Moniz Vianna, José Lino Grünewald. Uma pergunta a um deles era a garantia de uma aula. Talvez fossem movidos pela vaidade, mas pode haver vaidade mais benigna?
De 15 anos para cá, o Google se esforça para substituir as sumidades do conhecimento. É o maior banco de dados do mundo e ameaça tornar ociosos os dicionários, enciclopédias e compêndios –já absorvidos por ele, ao alcance de consultas rápidas e, melhor ainda, grátis.
Ou não? Posso estar errado, mas tenho visto que, de algum tempo para cá, ao procurar por qualquer assunto no Google, ele nos cumula de pechinchas comerciais sobre o dito assunto. Se você pesquisar “sorvete”, “livro” ou “apartamento”, ele aproveitará para apregoar um irritante varejo desses produtos. Mas, se você quer pesquisar um conceito abstrato, obscuro ou mesmo absurdo, ele não se toca, faz igual. Exemplo: “o lulopetismo estrebucha”.
Digite isto no Google e ele responderá: “À procura de o lulopetismo estrebucha?”; “Tudo que você precisa saber sobre o lulopetismo estrebucha”; “Encontre as melhores ofertas sobre o lulopetismo estrebucha”; “Preços baixos para o lulopetismo estrebucha”; “Verifique nossa ampla seleção de o lulopetismo estrebucha”.
É só escolher e clicar.
Ruy Castro – Folha de São Paulo