Ruy Castro – Folha de São Paulo
RIO DE JANEIRO – Há cem anos, em 1917, os homens usavam calças muito justas e altas, acima do umbigo, e sapatos de bico fino, apontado para cima. Contrastava com as sobrecasacas largas e folgadas, recheadas pelos coletes, o que dava àqueles homens um perfil de inseto. Nos anos 1920, a situação se inverteu, com a instituição dos ternos americanos, mais leves e estreitos, e as calças de pernas e bocas largas. A moda foi e voltou várias vezes e, hoje, voltamos a ver homens de calças justas e usando sapatos de Aladim, como em 1917.
Também há cem anos, as feministas brasileiras lutavam pelo direito ao voto e ao trabalho, mas eram contra o divórcio. Achavam que, com o divórcio, os homens iriam abandonar os lares em massa e se juntar às suas sirigaitas. O fato é que, em 1932, elas tiveram o direito ao voto e ao trabalho, mas o divórcio, que também viria beneficiá-las, só chegou ao Brasil em 1977. Na França, foi o contrário. Intelectuais, como a romancista Colette, eram a favor do divórcio e do direito ao trabalho, mas contra o voto feminino –achavam que as mulheres atrasadas das províncias iriam votar em quem o padre mandasse. Com isso, as francesas só puderam votar em 1945.
Há 50 anos, as mulheres brasileiras lutavam pelo direito ao próprio corpo, e sair nuas em revistas era um ato libertário. Estrelas como Leila Diniz, Ítala Nandi e Betty Faria foram pioneiras e pagaram caro por isso –a sociedade lhes apontava o dedo acusatório. Hoje, a sociedade está pouco ligando se uma mulher fica pelada ou não, mas, para as próprias mulheres, sair nua em revistas é compactuar com uma cultura machista.
O que era tabu deixou de ser e vice-versa, e isso é normal. O problema é julgar o passado com os olhos de hoje, como se faz muito.
Tão sem sentido quanto julgar o presente com os olhos de ontem.