Vida longa a todos os gigantes da pequena ambição no mundo da ambição gigante
Sou do tempo em que porta de banheiro era folha de papel. Ali os poetas começavam cedo a sua carreira, trancados no sanitário da escola com caneta na mão declarando seu amor ou seu desejo por algum colega em versos cheios de hormônios e erros de ortografia.
À medida que os poetas de porta de banheiro amadurecem, amadurecem seus temas. Dentro da porta do banheiro de bar, surge o A de anarquia, a letra do Renato Russo, o verso de Rimbaud, a poesia autoral de quem já aprendeu que o amor, assim como o crime, nem sempre compensa.
E que desça mais uma rodada, já que a bebida ajuda a soltar a mão dos tímidos e ferver a mão dos experientes, fazendo das portas de banheiro de bar um acontecimento literário, uma ode à musa Noite, uma dignificação das cagadas. A riqueza de certas portas é tamanha que muitos estabelecimentos as tratam como relíquia, mantendo-as por décadas longe das reformas –já soube do caso de um proprietário que tentou restaurar com Pilot o haikai de um célebre mijante.
Mas isso não é para qualquer portinhola. Nunca vi poesia atrás de porta de banheiro de avião, talvez porque ali, se flagrado em exercício, o poeta não tem para onde correr. Portas de banheiro de firma também não costumam ser brindadas com o sangue esferográfico das palavras, talvez porque simplesmente não mereçam. Se querem que a fórmica ganhe o calor de um desabafo, que paguem ao poeta maquinal uma hora extra!
Já apontam alguns donos de porta que, de uns anos para cá, a produção artística vem decaindo. Muitos poetas do gênero, tomados por uma nova e avassaladora incontinência verbal, acabam soltando os versos nas redes sociais antes de chegar ao W.C.