Acho muito complicado para um senador votar a favor de uma indicação desavergonhada como esta. Vai pesar inclusive o sentimento corporativista, para evitar o risco de uma decisão desmoralizante demais para o Senado. E deve pesar também a dificuldade de cada parlamentar para explicar para suas bases uma desonra desse tamanho.
A verdade é que o negócio foi exagerado, mesmo para um Bolsonaro, ou melhor: dois Bolsonaro. A indicação para a embaixada mais importante da diplomacia brasileira foi com certeza acertada entre pai e filho, espertalhões que não têm capacitação para avaliar o conjunto das implicações políticas de uma decisão dessa envergadura.
Falei do risco de Bolsonaro ser o primeiro chefe de governo a ter uma indicação recusada pelo Senado, mas é claro que pode acontecer de Eduardo ser aceito como novo embaixador. Pois neste caso o problema se agigantará. Falta a Bolsonaro e a seu filhão a capacidade pessoal para prever os riscos, mas com certeza, entre o bolsonarismo existem pessoas capazes de avaliar a complicação que pode ser o filho do presidente virar embaixador, ainda mais no país de sua ambição.
O episódio demonstra inclusive a fragilidade intelectual das relações políticas de Eduardo Bolsonaro no plano internacional. O filho de Bolsonaro é o representante na América Latina da organização direitista internacional presidida por Steve Bannon, o marqueteiro americano descartado por Donald Trump depois de eleito. A organização tem muito dinheiro, que evidentemente não sai do bolso de Bannon. Está com uma sede internacional em um antigo mosteiro na Itália, com um contrato de aluguel pelos próximos vinte anos para o imóvel ser usado como espaço de estudos, conferências e demais proselitismos para ampliar no mundo o pensamento de extrema direita.
O grave erro dessa indicação de Bolsonaro mostra que Bannon tem uma certa dificuldade de organização estratégica. Colocar o filho do presidente brasileiro com embaixador nos Estados Unidos traria sérias dificuldades para nosso país, pois é estreita demais sua identificação com um grupo restrito da direita americana. O Brasil estaria com um embaixador de relações limitadíssimas, fechadas em um círculo da direita americana. A indicação revela a ansiedade um grupo que escancara seus planos. Dá para entender porque uma das primeiras coisas que Trump fez depois de se eleger foi chutar pra fora seu marqueteiro.
São os rolos criados de forma absolutamente estúpida pelo paizão junto com o filhão. Creio que uma parcela de bolsonaristas mais preparados — que não são muitos, mas existem — deve ter capacidade para prever problemas que se avizinham. Duas estrelas da direita, a deputada estadual Janaina Paschoal e Olavo de Carvalho, já deram o alerta em mensagens pelas redes sociais. São dois cínicos, pois passaram por cima da questão do nepotismo. Olavo nem fala disso e Janaina procede de um modo muito ruim, se assemelhando a petistas pegos em maracutaias: ela fala em “eventual nepotismo”.
Os argumentos de ambos servem unicamente como desculpa política para Eduardo Bolsonaro sair dessa. Resumidamente, os dois apelam pela sua desistência do cargo, alegando a importância política de sua presença no Brasil, o que é uma balela. O deputado é um fracasso como articulador. É genioso e briguento. Sob sua presidência o PSL paulista é um partido rachado. Mas autocrítica não conta muito para esse pessoal.