Nego Pessoa, adeus

Carlos Alberto Pessoa, o Nego Pessoa, não morreu, como avisaram por aí. Ele resolveu entrar num beco, numa travessa dessas de Curitiba que ele conhecia e transformou em livro, mesmo porque andava a cidade (andar não significa amar), e fez o corpo sumir para sempre. Trombamos por aí algumas vezes. Ele vivia da invenção própria. Torrou uma fortuna porque fortunas herdadas são feitas para isso. Sobrevivente, um dia o flagrei na frente de uma geladeira cheia de garrafas e latas de cerveja.

Gritei, de longe: “Te peguei”. Ele se virou lentamente e, na mão, tinha uma latinha de Fanta. Pensei e disse a ele que aquilo só podia ser coisa de maluco. Entrevistei-o no programa “Musga na Cachola”, na rádio do padre Manzotti. Não lembro mais a conversa, mas sim que ele levou música clássica para tocar. Gostava muito do esporte bretão, como ele ajudou deixar na memória. Era Coxa Branca e trabalhou para o Atlético Paranaense. Isso é sonho de qualquer profissional que se preza.

Escreveu livros. Viveu a vida retumbante. Aí, sem avisar, foi, mas vai ficar nesta terra onde não parava muito tempo nos locais onde se metia a trabalhar, porque essas coisas não combinavam com ele. Agora lembro que depois da gravação do programa ele me levou a uma padaria perto do estádio Joaquim Américo. Encheu a bola dos pães de lá. Pegou alguns e eu paguei. Isso porque ele não veio ao mundo para pagar, mas para cobrar – e ai de quem reclamasse. Amém. Zé Beto

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Morre o jornalista paranaense Nego Pessoa

© Maringas Maciel

Morreu na manhã desta segunda-feira (14) em Curitiba o jornalista Carlos Alberto Pessoa, conhecido como Nego Pessoa. Será velado a partir das 13 horas em uma das capelas do Cemitério Municipal de Curitiba.

O jornalista trabalhou na Gazeta do Povo, Diário da Tarde, Jornal do Estado, além de diversas emissoras de rádio e televisão. O jornalista também lançou vários livros. O último, o Livro Vermelho, foi lançado em novembro de 2015.

Filho de Matilde Anciutti e João de Mattos Pessôa, o jornalista Carlos Alberto Pessôa nasceu na cidade de Irati, mas foi na capital paranaense que construiu sua história. Mudou-se para Curitiba em 1959 para cursar o científico no Colégio Estadual do Paraná, celeiro de grandes talentos.

Começou a escrever para imprensa em 1966, a pedido de Cícero do Amaral Cattani, para a revista Panorama. O resultado foi uma história sobre o futebol e suas raízes, com um texto rico e surpreendente, que marcou de forma decisiva o seu ingresso na crônica esportiva paranaense, com um perfil que comporta muita leitura e reflexão.

Nego Pessôa, como tornou-se conhecido, trabalhou nos principais veículos de comunicação da cidade. Escritor de temas futebolísticos, crítico social, homem culto, excêntrico, bem humorado e espirituoso, tem a habilidade de brincar com as palavras e já foi apontado como um dos melhores textos da imprensa paranaense. Trabalhou nos jornais Gazeta do Povo, O Estado do Paraná e Tribuna do Paraná. Outras empresas de comunicação que contaram com o jornalista foram a RIC TV, além das rádios Lumen e Clube Paranaense. Hoje, mantém o blog “Na contra mão” e escreve para a revista Idéias.

É autor dos livros “A Copa e a Crise do Futebol Brasileiro”, lançado em 1970 em parceria com Walmor Marcelino; “De Letra”, reunião de crônicas escritas na Gazeta do Povo e publicado em 1994, e “O Sábio de Chuteiras”, em 2006, sobre seu ídolo maior, Adolfo (Russo) Milmann, craque do Fluminense de 1934 a 1944. BemParaná

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Hoje!

© Gustavo Rayel Jr.

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Aposta nos ares

A meta fiscal, como sabemos, voltará a ser a velha meta. A equipe econômica de Michel Temer bate cabeça e diz não saber de onde tirar mais dinheiro.

Para tentar fechar as contas do ano que vem, Henrique Meirelles e sua trupe apostam muitas fichas na ampliação do pacote de concessões. Estão sendo contabilizados 20 bilhões de reais decorrentes da privatização de aeroportos e da venda da fatia da Infraero em terminais já concedidos.

O Globo detalha que essa conta envolve a concessão de, no mínimo, 19 terminais, incluindo o de Congonhas, além da licitação de três blocos de aeroportos encabeçados por Santos Dumont, Cuiabá e Recife. Também está no cálculo a relicitação de Viracopos, depois que o consórcio que administrava o terminal devolveu a administração dele ao governo. 

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Olhos de hoje e de ontem

Ruy Castro – Folha de São Paulo

RIO DE JANEIRO – Há cem anos, em 1917, os homens usavam calças muito justas e altas, acima do umbigo, e sapatos de bico fino, apontado para cima. Contrastava com as sobrecasacas largas e folgadas, recheadas pelos coletes, o que dava àqueles homens um perfil de inseto. Nos anos 1920, a situação se inverteu, com a instituição dos ternos americanos, mais leves e estreitos, e as calças de pernas e bocas largas. A moda foi e voltou várias vezes e, hoje, voltamos a ver homens de calças justas e usando sapatos de Aladim, como em 1917.

Também há cem anos, as feministas brasileiras lutavam pelo direito ao voto e ao trabalho, mas eram contra o divórcio. Achavam que, com o divórcio, os homens iriam abandonar os lares em massa e se juntar às suas sirigaitas. O fato é que, em 1932, elas tiveram o direito ao voto e ao trabalho, mas o divórcio, que também viria beneficiá-las, só chegou ao Brasil em 1977. Na França, foi o contrário. Intelectuais, como a romancista Colette, eram a favor do divórcio e do direito ao trabalho, mas contra o voto feminino –achavam que as mulheres atrasadas das províncias iriam votar em quem o padre mandasse. Com isso, as francesas só puderam votar em 1945.

Há 50 anos, as mulheres brasileiras lutavam pelo direito ao próprio corpo, e sair nuas em revistas era um ato libertário. Estrelas como Leila Diniz, Ítala Nandi e Betty Faria foram pioneiras e pagaram caro por isso –a sociedade lhes apontava o dedo acusatório. Hoje, a sociedade está pouco ligando se uma mulher fica pelada ou não, mas, para as próprias mulheres, sair nua em revistas é compactuar com uma cultura machista.

O que era tabu deixou de ser e vice-versa, e isso é normal. O problema é julgar o passado com os olhos de hoje, como se faz muito.

Tão sem sentido quanto julgar o presente com os olhos de ontem.

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Duke

O Tempo (MG)

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Dor na consciência

NÃO SEI SE ERA JOVEM ou senhora de idade. Mulher, sim, o MS na língua de aeroporto esclarecia.  Não vi a pessoa, só a nacionalidade, vietnamita. E do antigo Vietnã do Norte, que captou o imaginário de minha juventude quando na guerra com os EUA o general Giap mostrou-se estrategista do nível de Alexandre e de Bonaparte. Mas afirmo que gostaria de ter conhecido a vietnamita, por mera questão de solidariedade.

Aconteceu nos dois aeroportos, no de partida e nos de chegada, o da vietnamita em questão e o meu. Ambos partíamos do mesmo aeroporto, viajaríamos pela mesma companhia, despachamos a bagagem ou no mesmo guichê ou em guichês vizinhos. Devemos ter cruzado casual e acidentalmente, ou estivemos no mesmo lugar com segundos de diferença. Uma de tantas brincadeiras do destino

Não sei como a vietnamita viajava, se, como eu, que servia de laranja para quem vinha com bagagem excessiva, e daí o atrapalho com os recibos de bagagem, seis na mão. Naquele estresse de aeroporto vi um recibo no chão. Como quase perdera meu bilhete de passagem, achei que o recibo era dos meus, tanto na função mim como na de laranja de bagagem. Juntei aos outros, enfiei no bolso e embarquei.

No desembarque recolhi as malas, nem olhei os recibos, no Brasil ninguém confere. Em casa notei um a mais, da passageira que viajou para Hanói, capital do antigo Vietnã do Norte, hoje unificado no pós-comunismo. No desembarque, um resquício de rigor estalinista terá retido a bagagem de Huang Loan Tran por falta do recibo? Ainda encontro Huang pela internet. Descargo de consciência.

Rogério Distéfano

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O Millôr sempre foi muitos

máerio-prata-e-millõrRio de janeiro, 1999. Os escritores Mario Prata e Millôr Fernandes na Bienal do Rio. Acervo pessoal

A foto é de 1999, na Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Me lembro bem porque foi a última vez que fui, pois eles não pagavam cachê para escritores. Nem avião. Acho que não pagam até hoje. A Bienal de Brasília, que começa daqui a uns dias, está pagando. E um dinheirinho bem honesto. Mas não era nada disso que eu queria falar. Quis recordar a data e lembrei disso.

O que interessa é o seguinte. Naquele tempo, eu estava na editora Objetiva, dos meus queridos Bob e Isa, e recebi dias antes o crachá com o meu nome. Por um mal-entendido qualquer, quando cheguei ao hotel tinha outro crachá, também com o meu nome, mandado pelos organizadores da Bienal. Mas não era nada disso que eu queria falar. O que interessa é o seguinte: eu fui com os dois crachás, idênticos. Tinha lá um lugar reservado aos escritores, para onde fui levado assim que cheguei. O uísque era de graça. Naquele momento, o outro único palestrante presente era o Carlos Alberto Parreira (aquele mesmo, capitão do Exército e técnico de seleção), que também iria palestrar sobre não sei bem o quê.

Aí apareceu a minha parceira de mesa, a Cora Rónai, procurando alguém da organização porque o Millôr estava lá fora, sem crachá e, sem crachá numa bienal, por mais millôres que você seja, tem uns lugares aos quais você não tem acesso. Por exemplo, o bar onde estávamos eu, o Parreira e a Cora. Dei um dos meus crachás, ela desceu e logo sobe o Millôr com o meu nome no peito.

“Eu fico incomodado”

Talvez tenha sido um dos momentos de emoção mais forte da minha vida. Uma emoção profissional, meu! O cara era o pai para a minha geração! O mestre! O Millôr era quase 30 anos mais velho do que eu. Cresci lendo o “Pif-Paf”, no Cruzeiro. (Só um parêntese: o meu filho Antonio disse que a morte do Millor – tem gente por aí acreditando que ele morreu – pra ele era como perder um avô. Sim, eu era filho do Millôr, portanto.)

Quando começou O Pasquim, ele tinha 40 e cacetada, e eu, 23. Ousei mandar um texto para ele. E ele decidiu publicar. E dizia isso por aí, como se falasse de um filho dele. Por coincidência, enquanto falávamos mal de alguém, toca o telefone e era o “neto” dele, Antonio, igualmente escritor. Sem falar nada para o Antonio, coloquei o Millôr na orelha dele. Falaram uns quinze minutos. Nunca se encontraram: só de orelhas. Mas foi uma bênção. E o cara ali, ao meu lado, com um crachá escrito Mario Prata.

Mas não era bem isso que eu queria falar. Quando foi montada a mesa para a palestra, éramos eu, a Cora e o Dapieve. E o Millôr sentou na primeira fila, exatamente na minha frente, na minha cara. E eu comecei a gaguejar com o cara ali esperando minhas “inteligências”. E eu disse para o público. É o seguinte, tem um cara aqui na primeira fila me olhando e eu estou ficando incomodado. Ou ele vem aqui pra mesa, ou eu saio correndo. Felizmente, ele foi para a mesa. Mais felizmente ainda, sentou-se e falou por duas horas. Acho que foi por isso que não pagaram a gente, penso agora, 13 anos depois.

“Eu te falei, não te falei?”

Mas não era essa história que eu queria contar.

Foi assim, a verdadeira história: depois da “palestra do Millôr”, fomos cada um para um lado e marcamos de nos encontrarmos às 11h na Nova Fronteira, que tinha um uísque honesto, segundo o Millôr. Nos encontramos e o Millôr me contou que estava caminhando pela feira quando duas velhinhas olharam para a cara dele, reconheceram (segundo relato dele), depois olharam o crachá com o meu nome e foram em frente. “Mas eu senti que elas estavam me seguindo. Até que a mais jovem me cutucou: desculpa, mas o senhor não é o Mario Prata, né?” “Não, não sou, minha senhora. É que…”

Foi cortado pela mais velhinha, que categorizou:

“Eu te falei, não te falei? É o Verissimo!”

Mario Prata|Reproduzido do suplemento “Ilustríssima”
da Folha de S.Paulo, 8/4/2012

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Cabeça desocupada, oficina do Demônio

A Vereadora Professora Josete (PT), compósito excepcional das companheiras Dilma, Ideli Salvatti e Gleisi Hoffmann, superou as três. Estas, trituradas e misturadas no liquidificador, não cogitariam o que Josete concebeu em projeto de lei.

E olhe que aquelas cabecinhas, em trio ou solo, descobriram a pedra filosofal petista: transformar a massa cinzenta em massa marrom. Com a lei genérica do gênero, nossa mulher sapiens da câmara superou as três companheiras em gênero, número e grau.

Um dia Josete acordou com tensão de gênero e encrencou com os nomes de rua. Tinha que ser meio-a-meio, uma, nome de homem, outra, nome de mulher. A vereadora não cogitou que no atual estado das coisas e das cotas faltaria mulher para tanta rua.

Numa dessas teria que dar às ruas nomes de mulheres de rua. Concordo em gênero e número. Perto da câmara, rua Visconde de Guarapuava, há operosas merecedoras da homenagem.  Desocupada, a cabeça de Josete, virou oficina do demônio.

No afã angustiante de emparelhar o gênero com o número, a professora seria capaz de propor que a rua André de Barros mudasse para Andréia de Barros. Essa rua, por sinal, é o puctum dolens da vereadora, que a tomou como paradigma de sua lei.

Melhor seria fazer com que André de Barros terminasse na João Negrão e dali em diante, até a Nilo Cairo, recebesse o nome de Professora Josete. Isso de gênero enche o saco, gera desarmonia entre homens e mulheres que se apreciam uns aos outros.

Foram-se Dilma e o inútil ‘presidenta’ e vêm suas filhotas iletradas com a pentelhação de masculino e feminino. Por que não a lei chamando ‘marida’ à parceira gay e ‘mulhero’ ao parceiro gay? Não é o substantivo do gênero que diminui a mulher. É o adjetivo da vida.

Josete fez como o colega vereador que nos impôs envoltórios para os talheres de bares, inutilidade para os consumidores e utilidade para os fornecedores. Andei no primeiro mundo por estes dias. Por lá não se usa camisinha em garfo, nem jontex na colher.

Como só pensa em femês, Josete queria que os papéis oficiais fossem obrigatoriamente redigidos nos dois gêneros, o do fato e o da fata. Como se lixa para o que nos custa sua inutilidade, queria nos impor mais a despesa do papel, da tinta e da impressora.

Não fosse o vereador homo sapiens que mandou o projeto para aquele arquivo redondo, nossa vereadora mulher sapiens ainda nos atocharia o registro LGBTTS – oito idiomas de gênero. Sorte termos o prefeito Greca, que vetaria tamanho delírio.

Rogério Distéfano

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Nicolielo

Jornal de Bauru (SP)

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Recurso de Lula será julgado “de forma isenta e desapaixonada”

Luiz Inácio Lula da Silva – © Myskiciewicz

O presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, disse ontem em Porto Alegre que “a 8ª Turma vai julgar de forma isenta, imparcial e desapaixonada, como o Poder Judiciário deve ser” o recurso de Lula no caso da condenação pelo triplex.

Ele acrescentou que, ao elogiar a sentença de Moro no Estadão, ele o fez quanto aos aspectos formais. Forma é tudo.

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Mia Couto, com muito prazer

Mia Couto – © Myskiciewicz 

Acabo de conhecer Mia Couto e me apresso em apresentá-lo ao Grupo dos 13 – universo de leitores destas linhas. Mia, que se chama, no registro de nascimento, António Emílio, é um poeta, escritor e biólogo moçambicano, nascido na Beira, que já escreveu mais de trinta livros, entre prosa e verso. Por isso, já recebeu uma série de prêmios literários, entre os quais o Camões, em 2013, tido como o mais prestigioso da língua portuguesa.

Mia Couto me foi apresentado pelo velho camarada e amigo de fé Edson Dallagassa, através de “Terra Sonâmbula”, edição nacional da Companhia das Letras, considerado um dos doze melhores livros africanos do século XX. Encantei-me desde a primeira linha. Além de escritor, Mia é um extraordinário contador de história. Mais do que isso: sabe brincar com as palavras, valoriza-as, reinventa-as à moda de Guimarães Rosa e tem plena consciência do que está fazendo. Com isso, enriquece a narrativa, obriga o leitor a raciocinar e, no fim, todos se sentem felizes e satisfeitos.

Vejam só o início do primeiro parágrafo:

“Naquele lugar, a guerra tinha morto a estrada. Pelos caminhos só as hienas se arrastavam, focinhando entre cinzas e poeiras. A pausa se mestiçara de tristezas nunca vistas, em cores que se pegavam à boca.”

E um pouco mais adiante:

“Um velho e um miúdo vão seguindo pela estrada. Andam bambolentos como se caminhar fosse o seu único serviço desde que nasceram. Vão para lá de nenhuma parte, dando o vindo por não ido, à espera do adiante.”

Precisa dizer mais? A última frase foi o modo de Mia dizer “sem destino”. Genial.

Segundo a orelha do livro, “cada frase de Terra sonâmbula resulta de um meticuloso trabalho de lapidação poética e confere nobreza artística a seu material linguístico primordial: as mitologias tribais e os casos que circulam de boca em boca pelos meandros da cultura oral africana, bastão de resistência num país como Moçambique, devastado por quase trinta anos de guerra anticolonial (1965-75) e civil (1976-92)”.

Mia Couto está no Brasil ou aqui esteve como participante do Congresso de Cérebro, Comportamento e Emoções, realizado em Gramado (RS). Participou também da “Conversa com Bial”, na Globo, na última segunda-feira. E isso valeu-me duas certezas. Uma: o acerto da emissora platinada ao trocar Jô Soares por Bial. O programa de fim de noite ficou mais palatável, mais diversificado e mais inteligente. Pedro Bial sempre foi um excelente jornalista, muito mais preparado que o exibido e arrogante gordinho, cuja aposentadoria chegou em boa hora. Teve, é certo, um (imenso) momento de fraqueza, quando aceitou “animar” uma mediocridade chamada BBB. Mas parece haver-se recuperado a tempo, felizmente.

A segunda certeza: Mia Couto merece especial atenção. Não apenas pelo que escreve, mas também pelo que pensa, diz e faz. Como biólogo ativo, está a serviço da preservação da natureza. E, como intelectual, a serviço da inteligência e dos verdadeiros valores do ser humano.

Eis um trecho do discurso que proferiu na abertura do ano letivo do Instituto Superior de Ciências e Tecnologia de Moçambique:

“A pressa em mostrar que não se é pobre é, em si mesma, um atestado de pobreza. A nossa pobreza não pode ser motivo de ocultação. Quem deve sentir vergonha não é o pobre mas quem cria pobreza.

(…)

“Recordo-me que certa vez entendi comprar uma viatura em Maputo. Quando o vendedor reparou no carro que eu tinha escolhido quase lhe deu um ataque. ‘Mas esse, senhor Mia, o senhor necessita de uma viatura compatível’. O termo é curioso: ‘compatível’.

“Estamos vivendo num palco de teatro e de representações: uma viatura já é não um objeto funcional. É um passaporte para um estatuto de importância, uma fonte de vaidades. O carro converteu-se num motivo de idolatria, numa espécie de santuário, numa verdadeira obsessão promocional.

“Esta doença, esta religião que se podia chamar viaturolatria atacou desde o dirigente do Estado ao menino da rua. Um miúdo que não sabe ler é capaz de conhecer a marca e os detalhes todos dos modelos de viaturas. É triste que o horizonte de ambições seja tão vazio e se reduza ao brilho de uma marca de automóvel.”

Nada mais precisa ser dito.

Célio Heitor Guimarães

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Todos extintos – ou quase

Ruy Castro – Folha de São Paulo

H.L. Mencken (1880-1956), o jornalista americano cuja pena perturbava os poderosos, escreveu em 1922: “Onde fica o cemitério dos deuses mortos? Algum enlutado ainda regará as flores de seus túmulos?”. E escalou um escrete de divindades que, em seu tempo, significavam a morte para quem os desafiasse: Júpiter, Ísis, Baal, Amon-Rá, Thor, Saturno, Cronos, Belus, Vênus, Odim, Marte, Plutão, Huitzilopochtli, Tezcatlipoca e dezenas de outros. “Todos foram deuses da mais alta dignidade —deuses de povos civilizados”, escreveu Mencken. “Todos eram onipotentes, oniscientes e imortais. E todos estão mortos”.

O equivalente moderno de tais potestades foram certas marcas que, por décadas, fizeram parte de nossas vidas —de certa maneira, comandaram-nas— e nos habituamos a ver como eternas: Esso, Gulf, Texaco, Cadillac, Buick, Pontiac, RCA Victor, Pyrex, Catalina, Ray-Ban, Constellation, PanAm, Rinso, Kolynos, Gessy Lever, Gumex, Brylcreem e, até há pouco, Kodak, Xerox, Blockbuster. Não é necessário explicar a que produtos se referiam. Todas soam familiares. E todas se evaporaram de nossas vistas e vidas.

Assim como, no terreno nacional, o Mappin, a Mesbla, a Sears, o Fusca, o FNM (Fê-Nê-Mê), a Panair, a Varig, a Vasp, o “Correio da Manhã”, a TV Tupi, o Liberty Ovais, o Crush, o Grapette e, mais recentemente, o Bamerindus, o Unibanco, o Banco Real —e, se até os bancos brasileiros morrem ou se fundem, imagine as outras empresas.

Pois assim foi e será também com os partidos políticos. No passado, tivemos o solerte PSD (Partido Social-Democrata), de JK e Tancredo. Depois, a lúgubre Arena (Aliança Renovadora Nacional), que, um dia, julgou-se “o maior partido do Ocidente”. E, hoje, o PT e o PSDB, agarrados à ilusão de que ainda têm eleitores.

Todos extintos —ou quase.

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Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come!

República dos Bananas

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Duke

O Tempo (MG)

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