Um laudo produzido pelo setor de perícia da Polícia Federal aponta indícios de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a mulher dele Marisa Letícia orientaram reformas feitas no sítio em Atibaia (SP) frequentado pela família do petista.
Segundo os peritos da PF, as obras na propriedade rural começaram a ser projetadas em setembro de 2010 e tiveram início em novembro de 2010, quando Lula ainda exercia o seu segundo mandato na Presidência da República.
Os trabalhos no sítio prosseguiram até outubro de 2014 e custaram ao todo R$ 1,2 milhão, de acordo com a avaliação da perícia da PF. Em fevereiro, a Folha revelou que as obras no sítio em Atibaia custaram mais de R$ 1 milhão segundo fornecedores de materiais e serviços ouvidos pela reportagem, pelo Ministério Público de São Paulo e interlocutores de uma construtora que trabalharam na obra.
Investigadores concluíram, segundo o documento, que a primeira parte das obras, realizadas no fim de 2010 e ao longo de 2011 tiveram a participação da Odebrecht por meio do engenheiro da empresa Frederico Barbosa, o mesmo que conduziu as obras do estádio do Corinthians em São paulo, o Itaquerão.
Como a Folha revelou em janeiro, ele foi o responsável pela condução dos trabalhos no local.
A PF elaborou uma planilha reunindo as 19 reformas feitas no sítio. A mais barata foi a demolição de uma construção antiga, no valor de R$ 1,8 mil, e a mais cara a instalação da cozinha, em R$ a instalação da cozinha gourmet, com custo estimado de R$ 252 mil.
Ao analisar a instalação de equipamentos de cozinha no sítio, o laudo aponta que a “execução foi coordenada por arquiteto da empreiteira OAS, Sr. Paulo Gordilho, com conhecimento do presidente da OAS, Léo Pinheiro, e com orientação do ex-presidente Lula e sua esposa, conforme identificado nas comunicações do arquiteto da empreiteira e de Fernando Bittar”.
‘FAZENDA DE LULA’
O laudo aponta mensagens de texto trocadas entre Léo Pinheiro e Gordilho, nas quais este último se refere à propriedade como “fazenda do Lula” e diz que o assunto deve ser tratado com “sigilo absoluto”.
“Sigilo absoluto hein. Amanhã vou em um churrasco em Atibaia com o Léo [Pinheiro] na fazenda do Lula e vamos encontrar com ele na estrada e vou passar o dia com ele e D. Mariza”, diz o arquiteto da OAS em comunicação interceptada pelos investigadores.
Em outra mensagem, Gordilho diz que “ele [Lula] quer uma coisa e Mariza outra. Lá vai eu e eu Léo dar opinião”. Posteriormente, dá a entender que a visita ao sítio de Atibaia foi concluída. “Bebemos eu e ele [Lula] uma garrafa de cachaça da boa Havana mineira e umas 15 cervejas”, escreveu.
As mensagens interceptadas indicam que as despesas de compra e instalação da cozinha no sítio e em um triplex em Guarujá(SP) foram lançadas em um centro de custos da OAS denominado “Zeca Pagodinho”.
“Vamos abrir centros de custos: 1o. Zeca Pagodinho (sítio) 2° Zeca Pagodinho (praia)”, escreveu o arquiteto para Pinheiro.
Posteriormente, Gordilho informa o dono da OAS que o proprietário do sítio no papel, Fernando Bittar, “aprovou junto à Dama [Mariza Letícia], os projetos tanto de Guarujá como do sítio”, recebendo como resposta “manda bala”.
A perícia traz uma foto de Lula que foi tirada no sítio e foi obtida em uma mídia pertencente a Gordilho, segundo a PF.
Como Folha noticiou em março, Bittar, um dos donos do sítio, afirmou em depoimento à força-tarefa da Operação Lava Jato que Marisa coordenou parte das obras feitas na propriedade rural.
Indagado na época sobre quem foi o autor dos pagamentos das obras, Bittar disse não saber e ressaltou que tal questão deveria ser esclarecida pela mulher de Lula.
Segundo seu advogado, Bittar “primeiro fez um projeto com uma arquiteta da confiança dele, mas Marisa não gostou. Aí foi feito um segundo projeto por um engenheiro da OAS que a agradou. Ele sempre dizia para o engenheiro da OAS: ‘Me apresenta a conta’. Mas o engenheiro respondia: ‘Não, pode deixar, pode deixar'”.
O laudo também traz notas de materiais entregues no sítio e que foram pagos por terceiros. Entre os produtos está uma porta de correr adquirida por Paulo Henrique Moreira Kantoviz em fevereiro de 2011 por R$ 5.950, segundo nota apreendida. Na época, Lula já frequentava a propriedade. Como a Folha revelou em abril, Kantovitz é engenheiro da Odebrecht.
A perícia indica que no período específico entre 2010 e 2011 o dono do sítio no papel, Fernando Bittar teria gasto cerca de R$ 1,7 milhão com a compra da propriedade e reformas. Porém, os rendimentos declarados por Bittar nas declarações de imposto de renda, nesses dois anos, são incompatíveis com os gastos apurados no sítio, de acordo com o laudo.
Procuradores investigam se as empreiteiras Odebrecht e OAS e o pecuarista José Carlos Bumlai favoreceram ilegalmente o ex-presidente por meio do pagamento de obras e melhorias para o sítio.
O relatório será analisado pela força-tarefa da Lava Jato que decidirá se denunciará ou não o ex-presidente por benfeitorias de empreiteiras realizadas no sítio de Atibaia pelo crime de lavagem de dinheiro por meio de ocultação de patrimônio.
A assessoria de Lula informou que ainda não teve acesso ao laudo da PF e por isso não iria se manifestar.
Folha de São Paulo