Olhos da cor fúcsia

Inspirou longamente, com tanta força como jamais fizera. Então, num movimento melodramático, saltou no oceano. Estava gelado, percebeu nas primeiras braçadas. Selvagem, quase sacrílego. À medida em que mergulhava, libertava-se de todos os vínculos. Achou-se uma imensidade: a água era sua cidade. Teve início um desfile de criaturas fantásticas. O peixe-fantasma, o cavalo marinho das crinas de fogo e uma comissão de ninfeias vieram se exibir. Apresentou-se Netuno.

Estava sorumbático. Com ele, sua esquadra iniciática: libélulas portando incenso, polvos oferecendo mirra, enguias douradas; plânctons, seres perfumados, luminescentes (de estupendos olhos da cor fúcsia). Tantas lisonjas que, de repente, sentiu-se nua.

Recordou-se que amou. Sua echarpe carmim, o colar de ametistas, tudo que fosse paixão, qualquer coisa que gerasse frisson – aquele frêmito ingênito, aquele átimo sem fim. Era embalada por águas amnióticas, que iam e vinham, subiam e desciam, útero acima, ventre abaixo. Foi daí que, chegado o momento, luzes inesperadas revelaram a face do abismo. Encantada, chorou.

E foi um vagido tão cheio de vida, de um orgulho tão exasperante, que pareceu insulto. Acendeu então as estrelas, para que todos pudessem admirá-la, e – numa última pulsão – atirou o corpo nas ondas desarmoniosas, assimétricas, que vieram buscá-la. Voltava a ser mar.

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Restis

Um vento anima os panos e as cortinas oscilam,
fronhas de linho (sono) áspero quebradiço; o sol passeia
a casa (o rosto adormecido), e em velatura a luz
vai desenhando as coisas: tranças brancas no espelho,
relógios deslustrados, cascas apodrecendo em seus volteios
curvos, vidros ao rés do chão reverberando, réstias.
Filamentos dourados unem o alto e o baixo
 
– horizonte invisível, abraço em leito alvo:
velame de outros corpos na memória amorosa.

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Quando fumar era obrigatório

© João Urban

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Relendo

Coleção Edições do Pasquim. Vol.36. Vaca do Nariz Sutil, Campos de Carvalho, copyright 1978. Edição: Editora Codecri Ltda. Rua Saint Roman, 142, Copacabana. 22.071, Rio de Janeiro, RJ. Editor: Jaguar. Editoria de Livros: Jeferson Ribeiro de Andrade. Coordenação de Produção: Sandra Siqueira. Capa: Fortuna. Diagramação: Orlando Fernandes. Revisão: Alice Carvalho e Geraldo Nogueira Mesquita. Composição: Linotipia Luna. Impressão: Editora Vozes.

Quem procurar, acha.

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Flume. © IShotMyself

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Os livros do Prof. Thimpor

Cicuta Sem Gelo, de José Parmênides de Eléia; Editora Priori; oitocentas e tantas páginas, uma mais enfadonha que a outra. O autor não é, seguramente, pela Ética Tomista. Esta, baseada na finalidade metafísica, supõe que todos os seres têm um fim prefixado. Neste livro, José Parmênides contraria toda uma filosofia iniciada em “Raios Catódicos”, polêmico e fundamental para a carreira do volúvel mineiro, que, aos 97 anos, é considerado um dos baluartes do “orelhismo”, movimento banido da Semana de 22 por não ter pé nem cabeça.

Na página 346, Parmênides nega tudo o que disse antes ao propor que “para se chegar a um determinado fim, é preciso passar pela metade, assim, um outro fim foi atingido, não o fim final, mas o fim começo” ou “o cume da escolástica é muito mais alto do que se imagina”.

Se os orelhistas atuais não estivessem tão euforicamente encurralados, teriam em Parmênides um colaborador de grande vulto, principalmente depois que, encarado pela intelectualidade pós-guerra, ele virou o rosto e escreveu “Moldando Baquelite”, oferecido às duas irmãs numa dedicatória simples e fulminante: “À Dulcinéia e à Rutinéia, sem as quais eu não continuaria na boléia”.

Parmênides sempre teve na baderna uma arma contra a imensa seriedade peculiar de seus contemporâneos. Olhar os lírios da estante, para ele, sempre foi uma discussão linguística, mas “Cicuta Sem Gelo” dificilmente será aquilo que todos esperam de um livro de Parmênides, contraditório do começo ao fim, em todas as páginas.

A mais cara das contradições, que deve custar ao autor o esquecimento por muito tempo, está na tonalidade discursiva, demonstrando talento e habilidade ao folhear o palavreado, mas deixando para trás o motivo inicial do livro, isto é, a finalidade dialética pura de encontrar a verdade.

E ela estava debaixo do tapete.

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Mural da História – 2011

2 de setembro|Blog do Fábio Campana

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© Jan Saudek

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Bom de padrinhos

Embora até parlamentares petistas tratem Flávio Dino (PSB-MA) como o favorito para a vaga da ministra Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal, defensores de Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União, tentam uma última cartada em seu favor.

Durante a posse do ministro Luís Roberto Barroso como presidente do STF, na quinta-feira (29), aliados de Dantas fizeram circular a informação de que ele ainda estava no páreo – e com força.

A versão é que Lula não teria fechado as portas para nenhum candidato – além de Dino e Dantas, há também o advogado-geral da União, Jorge Messias, o preferido de alas do PT.

Dantas tem o apoio de Gilmar Mendes, Rodrigo Pacheco, Renan Calheiros, Arthur Lira e José Sarney. Todos tiveram conversas informais com Lula sobre o tema e reforçaram o pedido.

O favoritismo de Dino, como mostrou o Bastidor, fez com que petistas que trabalharam pela indicação de Messias começassem a considerar o apoio a Dantas.

Entre aliados de Lula, comenta-se que a escolha sai em duas semanas, no máximo.

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Voltando à vaca fria

Neste libelo do teólogo Erasmo de Rotterdam (1469-1536), quem fala é a Loucura. Sempre vista apenas como uma doença ou como uma característica negativa e indesejada, aqui ela é personificada na forma mais encantadora. E, já que ninguém mais lhe da crédito por tudo o que faz pela humanidade, ela tece elogios a si mesma. 0 que seria da raça dos homens se a insanidade não os impulsionasse na direção do casamento? Seria suportável a vida, com suas desilusões e desventuras, se a Loucura não suprisse as pessoas de urn ímpeto vital irracional e incoerente?

Não é mérito da Loucura haver no mundo laços de amizade que nos liguem a seres perfeitamente imperfeitos e defeituosos? Nas entrelinhas de Elogio da Loucura, o humanista Erasmo critica todos os racionalistas e escolásticos ortodoxos que punham o homem ao serviço da razão (e nao o contrário) e estende um véu de compaixão por sobre a natureza humana.

Pois a Loucura esta por toda parte, e todos se identificarão com algum dos tipos de loucos contemplados pelo autor. Afinal, como ele proprio diz, “Está descrito no primeiro capítulo do Eclesiastes: 0 número dos loucos é infinito. Ora, esse número infinito com-preende todos os homens, com exceção de uns poucos, e duvido que alguma vez se tenha visto esses poucos”.

Portanto, amigo, se você está rasgando merda ou comendo dinheiro (ou vice-versa), fique tranquilo. Nem tudo está perdido. Coleção L&PM Pocket, Volume 278, 2007, tradução de Paulo Neves. Quem procurar, acha. 

PS: Ouvindo o CD “Acorda”, de Rogéria Holtz, o vozeirão de Itararé, encontrei O Saudoso Maluco, de Marcelo Sandmann e Benito Rodrigues.

Já me mandei pra fora de mim
Mas não achei a saída
Será que alguém se importa em me mostrar
A porta de volta pra vida
Eu já cansei de me atormentar
Não me acostumo comigo
Faz tempo eu penso em desaparecer
No avesso do meu próprio umbigo

De tudo quanto é terapia estranha eu já tentei
Gastei mais de um milhão
Mas não, eu fracassei
Macumba, mapa astral, diazepan, boate gay
Até tratamento de choque eu aguentei

Haxixe, missa negra, botequim, seicho-no-iê
Anúncio de jornal, namoro na TV
Urtiga, sanguessuga, chá de pira com ginseng
Fervi flora e fauna no tacho e não me curei

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A vida vicária

Funciona assim: o casal famoso termina o casamento de 20 anos e anuncia pela internet, com a praxe da declaração de que continuam amigos que se amam pelo bem dos filhos. Depois, com a propagação em milhões de sites, o casal participa de programa de televisão de grande audiência para contar as circunstâncias da separação, do porquê de não continuarem juntos, não obstante tenham compromissos agendados para shows no Exterior, que cumprirão – em quartos separados, I presume. Da entrevista na televisão sobram fotos, a mulher desenxabida não consegue esconder a tristeza e o constrangimento; o marido faz cara de esperto, de bem com a vida, gozando os últimos momentos da fama que veio com o casamento.

Refiro-me a Sandy, a cantora e seu marido, que expuseram a intimidade que alimenta a mídia. Ainda que midiática e mercenária, a crônica da separação foi contida, diferente das de prostituição explícita e do exibicionismo sexual das celebridades no ocaso, dos dotes viris ostentados pelos cantores sertanejos e das trivialidades tolas e amenas de artistas de segunda extração. É a vida vicária, por substituição, quando o famoso sopita a frustração, nutre o sonho e aplaca a curiosidade doentia do público. P. T. Barnum, o grande empresário circense dos EUA, dizia que “nunca perdeu dinheiro quem apostou na burrice do povo dos EUA”. No Brasil também gostamos de circo – mas somos mais inteligentes.

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Daria Werbowy. Foto enviada por Ricardo Silva, o Zé do Fole, direto de Palmeira dos Índios.

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Mania de perseguição

Só de recordar essa história hoje já está me dando um negócio

Karen, estudante de psicologia, me escreve contando que é minha leitora há um tempo e que, ao analisar meus textos e postagens mais triviais, tem certeza de que sofro de algum grau de mania de perseguição.

Ela não está errada. Padeço sim de um esporádico issue relacionado a persecutoriedade, mas quando alucino (que alguém está querendo me ferrar tremendamente), sou eu que passo a perseguir o sujeito. Já cismei com poucas e inesquecíveis figuras absolutamente aleatórias e me perdi, por curtos períodos, em insistências obsessivas.

Uma vez, faz pelo menos uns 15 anos, estive em uma reunião no Facebook com jovens que prometeram “cuidar melhor da minha conta”. Uma garota de Rio das Ostras, interior do interior do Rio de Janeiro, havia feito uma fanpage com o meu nome e angariado cerca de um milhão e meio de seguidores.

Ela usava o espaço para vender produtos bem vagabundos e, muito pior, passava o dia postando umas desgraças de textos que não eram meus, mas que poluíram para todo o sempre o Google. Até hoje, se alguém procurar por meu nome na internet, antes de chegar a qualquer trabalho realizado por mim, receberá uma enxovalhada de palavras que, quando postas lado a lado, traduzem o pior da literatura nacional. Não estou afirmando que sou essa maravilha toda, mas, acreditem: as opções que o Google traz, com meu nome, são infinitamente piores.

Foram meses estranhíssimos em que tive de provar para o Facebook e alguns advogados, usando meu RG, CPF, certidão de nascimento, documentos dos meus pais, corpo presente e digitais, que eu era eu e a menina de Rio das Ostras não era eu. A menina insistia comigo que ela, sim, era eu, e que eu deveria ser presa por falsidade ideológica. E seu namorado disse que viria pessoalmente a São Paulo me dar um susto porque “ser eu” era o único emprego que a menina de Rio das Ostras tinha —emprego que a ajudava a manter toda uma família, e eu havia tirado isso dela e agora ela não sabia quem era. Complexo.

Bem, então o Facebook me chamou para uma conversa e prometeu cuidar melhor de mim. Inclusive me ensinando a tirar o melhor proveito profissional da minha página. A mulher disse: se essa garota ganha dinheiro com “sua brand”, “sua label” está na hora de você fazer o mesmo antes que outros façam novamente.

Eu estava péssima de dinheiro na época, já tinha gastado uma pequena fortuna com advogados para provar minha inocência no caso “eu dizendo que sou eu mesma” e fiquei animada. Foi a primeira vez que alguém me chamou de marca.

Entrei numa crise, claro, eu sonhava em ser misteriosa, deprimida e premiada em Berlim, mas pensei: por que eu estou aqui devendo 20 mil no banco, meus amigos, se sou “uma label”, “uma brand”? E passei a sonhar com jatinhos, viagens e homens nus dançando para mim (mentira, porque não gosto de muita gente num mesmo lugar, além do que, já tive essa experiência, e quando há muita gente pelada num lugar o ambiente fica com cheiro de cu, e quase sempre prefiro não sair de casa).

E a mulher que me iludiu, a jovem senhora do Facebook que me prometeu tudo isso, saiu de licença maternidade uma semana depois. Ela não deixou a senhorita que entrou em seu lugar avisada dessa promessa. Então, a menina de Rio das Ostras fez outra página e seguiu dizendo que era eu, falando com um milhão e meio de pessoas, postando textos terríveis com meu nome e vendendo cremes de cabelo medonhos.

A nova executiva de não sei o quê, que estava cobrindo as férias da jovem senhora, agora mãe, não respondia meus emails ou telefonemas, e toda a equipe que trabalhava com ela não respondia meus emails ou telefonemas.

Uma única vez, desavisadamente, a executiva de não sei o quê me atendeu, soltou um gemido de tédio e desdém, falou que retornaria, deu uma risadinha, desligou a seco e JAMAIS nos falamos. Eu contei toda essa história para chegar até aqui porque a partir dessa risadinha dessa garota eu fiquei alucinada, maluca, crazy mother fucker, e pensava nisso no banho, dormindo, sonhando, acordando e não tinha outro assunto na terapia.

Não me importava mais a menina de Rio das Ostras, o Facebook, eu sendo eu mesma, eu sendo a menina de Rio das Ostras, eu sendo uma marca, eu sem dinheiro, cremes vagabundos sendo vendidos com meu nome, textos medonhos sendo expostos ao mundo a partir de uma página com a minha cara sorrindo feito trouxa. Só me importava a nova executiva de sei lá o que que me atendeu, bufou, fez aquela voz anasalada fresca, riu da minha cara e me esnobou. Aquilo, meus amigos, despertou em mim 67 gatilhos mal resolvidos e eu passei a pensar naquela mulher 24 horas por dia.

Descobri o telefone das pessoas da sua equipe, eu ligava e mandava mensagens. Descobri telefones e emails de diretores, presidentes, donos, sócios, investidores, bancos. Fui pela via nojenta das carteiradas. Fiz crônicas naquele estilo arrasando a vida de pessoas, posts expondo situações. Eu fiquei completamente maluca. E isso aconteceria outras vezes na vida. Poucas, bem poucas (acho que duas ou três vezes), mas muito marcantes.

Tenho vergonha, tristeza, medo, pavor, de pensar que algo em mim escala até chegar nesse lugar sombrio. Quando passa (dura de duas semanas a um mês?), eu penso que foi um período de apagão em que estive muito doente.

Essa mulher nunca, jamais, me retornou. Não lembro o nome dela. Isso faz certamente mais de 15 anos. Mas, cacete! Só de recordar essa história hoje, já está me dando um negócio.

Publicado em Tati Bernardi - Folha de São Paulo | Deixar um comentário
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Osni Bermudes, na Lua, um dia antes de Neil Armstrong

Diz a história oficial que o comandante da Apollo 11 pisou na superfície da Lua no dia 16 de julho de 1969. Chegou tarde. Eu já estava lá e apresso-me em dizer que, contra qualquer dúvida, tenho fatos invencíveis. 

No dia anterior, Osni Bermudes, talvez o mais brilhante diretor de TV do seu tempo, abriu câmera no estúdio do Canal 4 até encontrar o melhor enquadramento para uma chapa de madeira que havia mandado fazer. A chapa tinha cerca de 4 metros quadrados de área e estava apoiada sobre dois cavaletes a mais ou menos um metro do chão. Sobre ela, uma camada de areia fina. Eu era assistente do Osni e aquilo era o cenário para as chamadas que deveriam ser exibidas nos intervalos comerciais, anunciando a transmissão ao vivo, “diretamente do solo lunar”, da chegada do homem à Lua, com trilha sonora épica e locução de cabine.

Embarquei na aventura munido de uma das poucas tecnologias que então eu dominava: a curiosidade. E foi com ela que vi Osni Bermudes inventar colinas, planícies e vales por meio de luzes e sombras projetadas naquela paisagem desértica. E a cereja do bolo: um horizonte curvo a contrastar com a profundidade do espaço, ali sugerida por um painel de feltro preto colocado ao fundo. Quem olhasse para o monitor, estaria diante de uma imagem inequivocamente lunar. 

Naquele tempo, eu não sabia quase nada de televisão. Quase nada de coisa nenhuma. Nem imaginava estar prestes a viver o que hoje poderia ser chamado de um momento Forrest Gump da vida. Mas foi exatamente o que aconteceu. 

Quando o cenário ficou pronto, Osni permaneceu na câmera e na luz. E, provavelmente na falta de um contrarregra, entregou-me uma miniatura do módulo lunar da Apollo 11. Ele mesmo havia construído aquela pequena maravilha que, mesmo sabendo tratar-se de uma engenhoca moldada em lata, emassada e pintada, eu segurava como se fosse feita de cristal tcheco. Tinha nas mãos nada menos do que a réplica miniaturizada do famoso módulo, com não mais que 30 centímetros de altura.

Meu papel consistia em colocar o módulo em cena. … “Um pouco mais para a frente, mais, mais, aí, agora um palmo para a esquerda, isso mesmo, perfeito!”… Pousei cerimoniosamente, com a concentração digna de um piloto treinado pela NASA. Bastava olhar o monitor para ter certeza: tínhamos chegado à Lua. 

No dia seguinte, dei plantão na mesa de corte e, com grande emoção, coloquei no ar a imagem do nosso pouso na Lua muitas vezes, bem antes que a televisão americana começasse a fazer sua transmissão. Chegado o momento, veio aviso pelo interfone, apertei um botão na mesa de corte e – como se estivesse vivendo um déjà vu quase sem graça – vi a portinhola do módulo se abrir e o comandante Neil Armstrong descer a escada, pisar a superfície arenosa da Lua e deixar gravada, ali e na retina de bilhões de telespectadores ao redor do mundo, a marca que amanheceria na primeira página de todos os jornais: o desenho da sola de sua bota impresso na areia cinzenta, uma das imagens mais reproduzidas da História. Na minha opinião, sinceramente, nada que pudesse sequer ser comparado à nossa façanha do dia anterior.  

Palavraria

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