Full range recording. Vocal blues with guitar Acc. All 41 recordings of Robert Johnson. C2K 46222 Columbia, Robert Johnson. The Complete Recordings. 2 compact discs. Original mono recordings. 1990, CBS Records Inc. De Kindhearted Woman Blues até Milkcow’s Calf Blues, takes alternativos diversos. Belíssima caixa. Encarte com 48 páginas, letras de todas as melodias e mais a história de figuras folclóricas do blues. Na capa, uma das duas únicas fotos que se tem de Johnson.
Familiares muitas vezes são facilitadores e coniventes com essa prática doentia
Que adolescente não sonha em se casar com um homem de 65 anos? Quem, aos 16 anos, não se apaixona por alguém com idade para ser seu avô? Que menina em pleno rebuliço hormonal não prefere as dificuldades de uma vida conjugal às descobertas da juventude? A notícia sobre o enlace entre um idoso e uma garota no interior do Paraná é o retrato grotesco de uma prática que acontece em nosso quintal e não apenas nos cafundós da Índia, Bangladesh e Nigéria, os três países que aparecem antes do Brasil no ranking de “casamentos infantis”.
O Código Civil brasileiro estipula em 16 anos a “idade núbil”, o matrimônio com autorização dos pais. Pela legislação, os jovens já teriam aptidão psíquica. Olha, que maravilha: não é contra lei. Curiosamente, a quantidade de meninas que se casam nessa fase é quatro vezes maior do que a de meninos. Outra surpresa: os maridos são, em média, nove anos mais velhos do que as “noivas”.
Por mais inacreditável que seja, até 2019 não havia idade mínima para que crianças fossem submetidas a relações conjugais. Em 2021, houve 16.572 casamentos no Brasil nos quais a noiva tinha até 17 anos (IBGE). Imagine então as uniões não oficiais.
Este tipo de situação é tema que deveria nos preocupar e nos mobilizar como sociedade porque faz parte de um ciclo de violências aos quais as mulheres começam a vivenciar desde muito cedo. Envolve abandono escolar, submissão, todo tipo de assédio, estupro doméstico, gravidez precoce, além de alimentar a cadeia da desigualdade de gênero.
Familiares, em geral, são facilitadores e coniventes com essa prática doentia, em nome da reputação da família, seja lá o que signifique isso, pelo controle da sexualidade das meninas e, obviamente, por segurança financeira.
Este exemplar eu ganhei do Jota (José Pires, do site Brasil Limpeza), editor, que também fez a capa e o planejamento visual do livro, maio de 1990. Na dedicatória: “Pro Solda, amigo, amigo mesmo, ex-amigo de copo, mas não descartável. Amigo do peito”. Sorry, periferia!
O prefeito de Araucária, 66 nas costas, casa com a namorada de 16 anos. Complexo de Michel Temer, libanês como ele, que começou a namorar Marcela nessa idade – de ambos. A coisa funciona, a vitória da esperança sobre a experiência, como o sábio Doutor Samuel Johnson descartava o conselho para casar depois da viuvez. Seria diferente caso o bom doutor pudesse dar cargo em comissão para a sogra, como fez o otimista de Araucária.
Qual será a função da sogra no secretariado? Segurar o biquinho da bela primeira dama, calejada em concursos de miss, que sai da pós adolescência para a pré senescência, diriam alguns de nós, céticos e experientes. Sendo isso, saúde para a pombinha e para o gavião, este o reflexo das propriedades do ar da capital do xisto, que converte a poluição em polução.
Chiste à parte, louve-se o amor, que não tem idade. Problema, só um, e provocado pela ansiedade do prefeito: a oposição não deixará barato isso de dar cargo público como presente de bodas para a sogra. Na sua infinita capacidade de difamar, a oposição ainda dirá que esse cargo sugere um drama bíblico: o prefeito queria a sogra, mas teve que se contentar com a filha.
O Juiz – O Juiz é um homem acima do bem e do mal. Pelo menos no sentido legal da palavra. Agora, se a Lei estiver estabelecido que o bem é o mal e vice-versa, como tantas vezes acontece, o Juiz deixa de fazer parte do substrato na impacialidade humana já que a lei é dura mas é lei. Donde se deduz que nada prejudica mais a natureza humana que o Direito Romano.
Do livro Lições de Um Ignorante, 1967, José Álvaro Editor
Nóis dois vivia intocado e clandestino Nosso destino era fundo de quintar Desconfiavam que nois era comunista Ou terrorista, de manchete de jornar Nois aluguemo casa na periferia No mesmo dia, se mudemo para lá. Levando uma big de uma metralhadora Que a genitora se benzia ao oiá.
Nóis pranejemo de primeiro um assarto Com mãos ao arto, todo mundo pro banheiro Nois ria de pensar na cara do gerente. Oiando a gente, conferindo o dinheiro. Mas o tal banco acabô saindo ileso E fumo preso, jurando ser inocente. Nois não sabia que furtar de madrugada. Era mancada pois não tem expediente.
Despois de um ano apertado numa cela. O sentinela veio e anunciou: “O delegado pergunto se ocês topa Ir prás oropa, a troco de um embaixador”. Na mesma hora arrumemo passaporte Pois com a sorte não se brinca duas vez. E os passaporte que demos no aeroporto, Era de um morto e de um lord finlandês.
E quando veio aquela tar de anistia Nem mais um dia fiquemo no exterior E hoje já fazendo parte da história Vendendo memória, hoje nois é escritor.
Guca Domênico e João Lucas – LP Língua de Trapo|Lira Paulistana|1982
Lembro do Leminski usando essa expressão em palestras que assisti lá em Londrina. Leminski dizia que a “A única razão de ser da poesia é que ela faz parte daquelas coisas inúteis da vida que não precisam de justificativa”. Enfim ele queria dizer que a poesia não precisa exatamente estar a serviço de porra nenhuma. Ela simplesmente tem que existir como o orgasmo, a amizade ou o afeto. Simplesmente ela existe pq nos faz bem. Um bem indescritível que dinheiro nenhum pode pagar. Acho inclusive que a expressão foi criada pelo grande poeta Manoel de Barros se não me engano no livro “Arranjos para Assobio” de 82. Lembro de ter ouvido o Leminski usando a expressão em 85 ou 86, algo assim. Às vezes fico pensando mesmo que somos todos (artistas, escritores, músicos, etc) inutensílios pq no mundo das pessoas movidas apenas por interesses de ordem prática, somos vistos mesmo como “inúteis”.
E isso se agrava consideravelmente em tempos sombrios como o que estamos vivendo onde o presidente que está no poder não tem a menor preocupação com a vida humana no sentido mais literal da palavra. Como esperar que um presidente desses tenha algum apreço por literatura (acho que nunca deve ter lido um livro na vida) ou por música de verdade ou por pintura. Como esperar que alguém assim já tenha ido ao teatro alguma vez na sua vida. A sua maneira de falar expõe sua tosquice. E os seus seguidores refletem a mesma tosquice. Gente que desconhece qualquer sílaba da palavra “sofisticação”.
É só ver o filho que também herdou a sua breguice, comprando uma mansão de 6 milhões com pia e torneira douradas, uma brinquedoteca (é claro que não seria uma biblioteca), piso do banheiro de mármore carrara, enfim tudo o que o dinheiro pode comprar de mais ostensivamente cafona. Então se essa gente é que tem alguma utilidade para a maioria, prefiro mesmo ser visto como um “inutensílio”. Tá tudo certo. Hoje estava lendo “Paris é uma Festa” do Hemingway e tem um trecho do livro onde ele encontra um cara que era um engolidor de fogo profissional e que entortava moedas com as gengivas.
O cara não tinha mais nenhum dente e suas gengivas estavam obviamente inflamadas. Nem convida o cara pra beber uma com ele que conta tristemente para o escritor que estava totalmente na miséria e que nesse mundo não havia mais futuro para um engolidor de fogo e entortador de moedas com as gengivas. Fiquei pensando que nesse mundo árido de bolsonaros não há mesmo mais nenhum futuro para nenhum de nós, meros e desprezíveis inutensílios. Afinal se pessoas tão imprescindíveis como profissionais de saúde são desprestigiados, maltratados e desprezados, o que pensar de nós que somos apenas pessoas que não precisam de justificativas para existir.
Assim como a poesia, como o orgasmo, como a amizade ou como o afeto. O que eu sei é que pessoas como Hemingway, ou Isadora Duncan ou Modigliani ou Jimi Hendrix ou Will Eisner foram fundamentais na minha vida simplesmente por eu ter descoberto a arte que eles defenderam. E me fizeram um bem indescritível e uma pessoa com mais vontade de viver e de ser generoso e atento para com as outras pessoas ao meu redor.
Pessoas como os bolsonaros da vida são o oposto de tudo isso. Eles causam um mal irreparável por onde passam. São cavalos de Átila. Enquanto isso Leminski atravessava a rua brincando como atravessou sua vida se divertindo fazendo valer o que costumava dizer “Espero que todos se divirtam. Não há há muito mais a se fazer nesse mundo”. Por enquanto ainda não podemos nos divertir. É impossível se divertir com tanta gente sofrendo. Não que nós não estejamos, mas é que tem muita gente muito mais ferrada, sofrendo em hospitais, passando fome, vendo os filhos sofrerem. É impossível ligar a tv e ficar impassível diante de tanta tristeza. Mas eu espero que ainda possamos. Nós merecemos. Todos nós que não compactuamos com a barbárie. Pena que ainda não criaram um antônimo para “intelligentsia”. Serviria muito bem aos seguidores e simpatizantes do nosso atual governante, Jair Bolsonaro.
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