Memória

Quando morre um cartunista
pra onde será que ele vai?
Existe um céu-dentista
que repõe o dente no sorriso que cai?

E quando o abatem a tiros
como a tigres, leões e elefantes?
Seriam troféus os motivos,
a pele, a juba, as presas elegantes?

Quando o coração fica suspenso
entre o medo e a impunidade,
perguntas e dúvidas perdidas no tempo
silenciam toda a humanidade.

Marta morta viverá do passado?
Geraldão é um caso encerrado?
O mundo virou casa de mãe joana
ou é só uma piada de gente insana?

Eu gostaria de rir e não posso;
respirar aliviado e não consigo.
No ar, há uma sarna e nem coçar eu coço.
Glauco levou todas as respostas consigo.

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Vejo, clara, ali na frente a eternidade estendida na paisagem e sei que ela se aproxima a cada dia, a cada minuto mais e mais próxima está a eternidade.

Sei também que ela me levará daqui e então, eu nunca mais voltarei a ver meus amigos, nem meus filhos, minha mulher, minhas netas, minha cadela vira-lata, nem ninguém!

Estarei sozinho na minha eternidade. Quieto. Sem piscar. Nem respirar. Eternamente.

Eu então, não serei mais eu.

Serei um parte microscópica deste grande nada de onde viemos todos e pra onde, desfeito o nó vital, retornaremos um dia para, eternamente, não mais sermos nós.

Sabe-se da vida quase nada, do pós vida muito menos e, assim sendo, sabe-se lá o que pode vir.

O Tempo, este nosso parceiro que por toda a nossa jornada nos acompanhou, não mais fará sentido quando alcançarmos a eternidade. Não existirão calendários por lá, nem relógios, nem cronômetros, nem distâncias. Ninguém fará mais aniversários. Nem primavera e nem inverno. Nada. Só o colossal abismo do infinito e é alí, dentro do coração desse imenso cristal onde reluzem as galáxias do universo, como ínfimas luzinhas minúsculas diante do todo escuro, que está contido todo o mistério da nossa vida e da nossa morte.

CTBA / 221222

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Bah!

Estivemos fora do ar até agora por falta de energia em nosso locutor.

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Cruelritiba

curitibano2

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Infiéis escudeiros

Há sinal inequívoco de disposição para o embate no Congresso

O centrão se organiza em grandes blocos, informa que a base governista é frágil e deixa o PT isolado na condição de quarta bancada, cujos deputados tampouco têm posição uniforme na defesa dos interesses do Palácio do Planalto. Diante disso, as raposas dizem que está tudo bem, pois a ideia é dar conforto a Luiz Inácio da Silva. Longe da turma intentos belicosos.

Dá para acreditar? Os atuais operadores palacianos, de expertise tida como bem inferior aos do primeiro governo Lula, podem até cair nessa conversa.

Mas, se o presidente estiver na posse do olho vivo e faro fino que lhe atribuem no trato da política, certamente já percebeu que seu alicerce no Congresso está fincado em solo pantanoso.

De um lado, MDB, PSD, Republicanos e anexos formam um grupo de 142 parlamentares. De outro, o PP de Arthur Lira e vasta companhia juntam 173 almas, dentre as quais algumas pertencentes ao PDT e PSB —dois partidos do campo da centro-esquerda governista. A salada junta legendas com assentos na Esplanada, não evita ida de ministros ao circo de “esclarecimentos” e perde o comando em comissões. Na oposição oficial, o PL de Jair Bolsonaro e, no outro extremo, o PT com uma bancada que, segundo o deputado Rui Falcão, está ali para manter acesa a disputa interna no governo. Em outras palavras, para tensionar, fazer ruído.

A versão dos arquitetos desse rearranjo “governista” é a de que a direita foi atraída para a base de Lula. De acordo com eles, é uma soma, jamais uma divisão. Sério? Seria mais eficaz, então, não se dividirem em blocos, ficando todos alinhados no campo da situação e ponto final.

Quando precisam se explicar dizendo que não pretendem confrontar e ao mesmo tempo constroem campos diversos é porque querem demonstrar força. Sinal inequívoco de disposição para o embate. Se o governo acha que está bom assim, é de se lhe desejar boa sorte.

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Revista Ideias

Travessa dos Editores|Fevereiro, 2019

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Faça propaganda e não reclame

Arno-Banheiras-2

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Flatos e panfletos

Gosto de ler panfletos tanto quanto pessoas mais sérias gostam de soltar flatos em reuniões da mais alta sociedade. Fufffff! Sereno e simples, levantando levemente a bunda da cadeira. Fuffffffff! Mas, como dizia, gosto de ler panfletos, principalmente esses que se querem sérios, escritos por doutores ou pessoas de estirpe e verve absolutamente impolutas. Alguém, um doutor, que indica, por exemplo, alongamento: “Todo treinamento físico envolve um estímulo e uma adaptação do organismo. Neste caso, o estímulo é explorar os limites de amplitude das articulações.”

Cara, me imagino explorando os limites de amplitude das articulações… e me sinto chique de butique. Quando ele conta por que é bom fazer alongamento, diz: “(…) o alongamento aumenta a segurança de exercícios físicos ou tarefas motoras do cotidiano como brincar com os filhos, (…)” Quase tive um orgasmo lendo tarefas motoras do cotidiano. Logo a seguir ele tem um primor: “Um outro benefício ainda pouco esclarecido é a melhora da coordenação motora e reflexos em geral.” Caramba!

A frase inteira mata tudo o que ele escreveu em três lâminas do panfleto! Se tudo o que se quer de um alongamento ainda é pouco esclarecido, então, estamos fritos. Ah, e tem mais! Veja: (O alongamento) “Parece facilitar a comunicação entre o cérebro e os músculos, o que contribui para um maior controle e precisão dos movimentos. Nota-se que até o andar de um praticante de alongamento é mais coordenado, menos tenso e até mais confiante, repare…” Meus sais! Já vejo o cérebro brigando e ficando sem falar com os músculos que não foram alongados!

E essa mulherada, que agora usa os pneus bem calibrados pra fora da blusa curtinha, será que alonga? É por isso que amo panfletos. Servem para que eu faça alongamentos cerebrais intensos aumentando a amplitude do sorriso logo cedinho. Tente. Leia um até em voz alta. E ria muito. O cérebro vai se alongar até chegar quase perto do de um Einstein, por exemplo. Se não chegar, pelo menos passa de um tipo Ratinho. Fuufff!

*Rui Werneck de Capistrano alonga seus horizontes culturais.

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Tempo

Paulo Leminski, Paulo Vítola, Marinho Gallera, Ivan Graciano e Belarmino & Gabriela, no Sir Laboratório, gravação do disco “Cidade da Gente”, década de 1980. © Nego Miranda

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Fraga

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Gilla. Zishy

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Os intolerantes entram para a História pela porta dos fundos.

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Pessoas são agredidas; ideias, não

Imputar crime a críticas sobre discursos de movimentos sociais revela fraqueza argumentativa e autoritarismo

O anúncio de uma série da HBO Max baseada no universo do personagem Harry Potter foi acompanhado de pedidos de boicote por parte da audiência. O motivo? A autora da saga, J.K. Rowling, seria transfóbica.

Boicotar é recurso válido no livre mercado. Se uma empresa usa trabalho escravo, consumidores podem escolher outra e aconselhar que os demais façam o mesmo.

Contudo, no caso em tela, é curioso que a ação se deva a uma opinião que não faz parte do conteúdo da série e tampouco é criminosa.

Desde 2020, Rowling sofre cancelamentos por criticar discursos que menosprezam o aspecto biológico do sexo, como: “Se sexo não é real, a realidade vivida por mulheres ao redor do mundo é apagada. Apagar o conceito de sexo remove a habilidade de muitos discutirem suas vidas de forma significativa. Não é ódio dizer a verdade”.

Em entrevista, o biólogo Richard Dawkins disse que Rowling sofre “bullying” e que, para a ciência, sexo é binário: “Há apenas dois sexos”. Afirmou ainda que o tema foi capturado por uma minoria que produz discursos sem sentido.

Jornais, inclusive no Brasil, afirmam que as falas são de fato transfóbicas. Se a acusação vale para a escritora, pode valer para qualquer um.

Mas, segundo decisão do STF que criminalizou a transfobia enquadrando-a na lei de racismo, impedir acesso a lojas, negar trabalho, ofender ou agredir transexuais, com razão, é crime, mas criticar teses e conceitos do movimento ativista não.

A legislação é sensata, já que pessoas são agredidas, ideias não. Caso contrário, seria impossível criticar o catolicismo, o fascismo ou qualquer outra linha de pensamento —o que travaria o livre debate público necessário, nas democracias modernas, para que nos aproximemos da verdade e encontremos soluções para os problemas que nos cercam.

Não é preciso acusar crime (transfobia) para demonstrar que uma ideia está errada. Na verdade, isso apenas revela fraqueza argumentativa e autoritarismo do acusador.

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© Rogério Dias

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