Futuro presidente precisa anular as medidas de facilitação do acesso às armas
É aterrador o relato do repórter Ivan Finotti sobre sua visita a uma loja de armas, em São Paulo, para o lançamento de uma marca de fuzil. O novo fetiche da turma da bala custa quase R$ 20 mil e pode ser parcelado em até dez vezes no cartão.
A mesma loja oferece tacos de beisebol não para praticar o esporte, mas como um item a mais para o cliente montar o seu arsenal. Os bastões têm inscrições como “Direitos Humanos” e “Diálogo”. É o recado claro e debochado de como resolver conflitos: no grito, na força bruta, à bala.
Este é apenas um exemplo de como a violência passou a ser um valor promovido pelo governo. Bolsonaro conseguiu afrouxar a legislação sobre armas por meio de decretos e portarias. São instrumentos meramente administrativos, que dispensam a apreciação do Congresso. Alguns deles contaram com a conivência do Exército, que perdeu atribuições de controle e rastreamento.
Quase quatro anos de estímulo às armas produzem muitos efeitos. Tem gente ganhando rios de dinheiro com isso, multiplicaram-se os clubes de tiro pelo país e devem estar abarrotados os depósitos das milícias, facções e outras modalidades de crime.
Há ainda outra consequência, difícil de mensurar, que é a naturalização da percepção de que uma sociedade armada até os dentes seria uma garantia de proteção e segurança para o cidadão. O caso do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, no balcão do aeroporto de Brasília, é autoexplicativo. Ele carregava uma pistola em vez de livros.
Com a convicção de que Bolsonaro não será reeleito, tomo a liberdade de dar uma sugestão ao próximo presidente. No dia da posse, em 1º de janeiro de 2023, como primeiro ato de governo, publique um “revogaço” no Diário Oficial, anulando todas as medidas de facilitação do acesso às armas.
O “revogaço” não resolverá tudo, pois já há um imenso arsenal em mãos erradas. Mas emitirá um sinal poderoso de mudança e de que é possível e urgente dar adeus às armas.
Graciliano Ramos (de Oliveira) (Quebrangulo, Alagoas, 27/10/1892 – Rio de Janeiro, 20/03/1953), depois de perambular com o pai e os irmãos por várias cidades do Nordeste, veio dar com os costados no Rio de Janeiro, por volta do início da década de 1910. Para sobreviver, escrevia, e era mal pago, para o “Correio da Manhã” e para a revista “O Malho”, vivendo no miserê. No meio do ano de 1915, teve que voltar às Alagoas, tendo em vista que seus quatro irmãos foram vítimas fatais da peste bubônica e o pai necessitava de sua ajuda no pequeno negócio que mantinha.
Escolheram residir em Palmeira dos Índios e, nas horas vagas, Graciliano escreveu seu primeiro livro, “Caetés”, e jogou os originais na gaveta, eis que não havia, no Estado, editoras. Também aproveitou para casar com Maria Augusta de Barros, com quem teve quatro filhos. Em 1920, ficou viúvo e em 1928 contraiu segundas núpcias com Heloísa Leite de Medeiros, com que teve, mais uma vez, quatro filhos. Candidato único, em 1927, foi eleito prefeito da cidade, onde escreveu dois relatórios ao governador do Estado de Alagoas (alusivos aos anos de 1928 e 1929). O governador ficou impressionado, não só com a atividades realizadas por Graciliano, mesmo com o baixíssimo orçamento de que dispunha, mas, principalmente, com o estilo literário com que Graciliano descreveu suas atividades como prefeito municipal. Sabe-se lá como, os relatórios foram encaminhados ao Rio de Janeiro e colocados num escaninho qualquer de um Ministério. Com a Revolução de 1930, Graciliano Ramos renunciou ao cargo de prefeito, antes que o interventor, nomeado por Getúlio Vargas, o colocasse no olho da rua, o que de resto fez com todos os outros prefeitos.
Em meados de 1933, um Rogério Distéfano da vida, que nas horas vagas fica furdunçando petições antigas e processos ainda mais arcaicos, resolveu ler os tais relatórios elaborados por Graciliano Ramos. Ficou impressionadíssimo com o estilo literário utilizado e desconfiou que por trás dos mesmos se escondia um grande romancista. Repassou os relatórios para o amigo Augusto Frederico Schmidt.
Schmidt era intelectual de nomeada, dominava vários idiomas, e rico, muito rico, herdeiro do Visconde de Schmidt, uma das maiores fortunas do Império. Numa viagem aos Estados Unidos, descobriu os supermercados e, na volta, instalou uma rede deles, com o nome de “Disco”, por todo o Rio de Janeiro, aumentando consideravelmente sua fortuna. Teve arroubos integralistas, mas logo em seguida se assumiu como intelectual de esquerda. Para editar seus livros de poesias e ensaios e não ficar dependendo dos editores, fundou sua própria casa editorial, onde editava e vendia os livros, a Livraria Schmidt Editora, local que reunia a intelectualidade do Rio e granjeava inúmeras amizades para Augusto Frederico. Quando terminou de lançar todos os seus livros, passou a editorar o dos outros, sendo que o primeiro a aparecer no catálogo foi um jovem pernambucano chamado Gilberto Freyre, com um calhamaço intitulado “Casa Grande e Senzala”. Sucesso instantâneo de crítica e nem tanto de público, que não dava muita importância (como hoje) aos livros de sociologia. Entre os supermercados, livraria e editoras, ainda achou tempo para ser presidente do Botafogo. Mais tarde, se encantou com Juscelino Kubitschek e, através de amigos comuns, passou a integrar o Comitê de sua candidatura. Da cabeça de Augusto Frederico saiu o slogan que JK adorou e passou a repetir em todos os seus comícios: “50 anos em 5.” Integrou o governo JK em vários cargos: assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, embaixador do Brasil na ONU e na então Comunidade Econômica Europeia. Em 1964, manteve uma perna, a esquerda do intelectual, na canoa de Jango e a direita, do empresário, na canoa dos militares. Como faleceu no início de 1965, não foi amolado nem por um lado e nem pelo outro.
Schmidt, assim que leu os relatórios, teve a mesma desconfiança do Rogério Distéfano de então: atrás daqueles textos havia um extraordinário romancista. Moveu mundos e fundos para localizar Graciliano Ramos, que, na época, com 8 filhos para criar e encaminhar, havia se mudado para Maceió, onde ganhava o pão de cada dia como servidor da Imprensa Oficial e professor da rede pública. Localizado o endereço, telegrafou para Ramos e perguntou se tinha algum romance, eis que estava interessado em publicar. Graciliano, tomado de surpresa, e já sabendo do enorme sucesso de Gilberto Freyre, disse que tinha “Caetés” na gaveta e estava escrevendo outro, cujo título era “São Bernardo”. Augusto Frederico pediu, então, que encaminhasse os originais de “Caetés”, o que Graciliano imediatamente fez.
A intuição do Rogério Distéfano de antanho e de Augusto Frederico se transformaram em certeza e o livro entrou imediatamente em composição para ir ao prelo. Livro pronto, Augusto Frederico encaminhou o primeiro exemplar para Agrippino Grieco e ficou esperando. Só lançaria o livro depois da crítica do mesmo. No domingo, acordou cedo e abriu o “Jornal”, periódico em que Grieco publicava suas críticas. Nada de nadica. Não se importando com o horário, ligou para Agrippino, tirando satisfações. Grieco limitou-se a responder: “Quando recebi o livro, a minha coluna já estava pronta. Mas já comecei a ler e estou adorando. Aguarde domingo que vem”.
O domingo que vem chegou e Augusto acordou ainda mais cedo e pegou o jornal que estava na porta. Foi direto para a coluna de Agrippino Grieco e quando leu o título quase teve uma síncope. Grieco intitulou a coluna com a seguinte frase: “Caetés, do alagoano Graciliano Ramos, é uma droga”
A carne dos dianteiros do boi é de segunda. Os italianos criaram um processo eletromagnético que realinha as fibras duras e emaranhadas dessas carnes e elas ficam semelhantes ao filé mignon. Isso já aconteceu faz tempo. Mas pode passar agora na televisão e tem gente que vai se espantar, achando um crime. São essas mesmas pessoas que, de tão absorvidas pela vida cotidiana, não percebem o quanto estão sendo alinhadas para consumo mais fácil. Os artistas de antigamente tinham o poder de criar estranhamentos e sacudir os pacatos cidadãos quando eles estavam alinhados demais. Este sacudão mostrava que a sobrevivência estava ameaçada pela inércia. Uma grande dose de ar puro (arte) era injetada de tempos em tempos nos pulmões das pessoas comuns. Os artistas eram incomuns. Hoje, somos todos artistas.
Logo, somos todos comuns. E todos enfileirados, alinhados. Nesta toada vem a contradição: criou-se o mundo da individualidade (o artista para si, o homem comum para si) mas, ao mesmo tempo, o mundo tecnocomputadorizado em escala mundial urra logo ali na porta e obriga a participar. Um individualista ferrenho usa cartão de crédito aceito em todo mundo, em todas as lojas. A propaganda individualiza o cidadão para que ele seja global. O cartão que ‘só você tem’ é o cartão de milhares de pessoas. Perplexidade a toda prova! O sonho de um mundo não linear (o linear era o da escrita pura) transformou-se num pesadelo. Porém, estranhamente, é um pesadelo do qual ninguém quer acordar. É o primeiro pesadelo quentinho, com música ambiente e cheirinho de sabão em pó com aloé vera.
Antes da chegada da era eletroeletrônica, o ser humano tinha um roteiro de vida: uma geração levava à outra. Hoje, as mudanças culturais são muito rápidas, minimizando as mudanças genéticas. Não temos mais começo, meio e finalidade. Apenas fazemos conexões e vamos indo. Se não cair, estamos “conectados com o mundo”. Mas, não há no break para garantir a estabilidade emocional.
DEPOIS do camarão fatal em Santa Catarina, Bolsonaro voltou à lanchaciata, em Brasília, ontem. Enquanto não voltar à rachaciata é tudo firula, conversa pra suas reses dormirem.
Pensei em escrever artigos sobre novos temas. Mas como fugir da ameaça de golpe que domina o noticiário? O problema é que nem sobre isso posso escrever como queria. A preparação para resistir a um golpe implica inúmeras iniciativas. Vivi dois, um no Brasil, outro no Chile, sem contar tentativas fracassadas.
Lembro-me de ter escrito em Santiago um artigo para a revista Punto Final sobre o golpe no Brasil e algumas lições sobre seu êxito. Escrever sobre resistência a um golpe num jornal nacional acabaria dando ao próprio golpe algumas ideias de como melhor se instalar no país, neutralizando a resistência.
Prefiro, no momento, outro caminho: escrever sobre as vantagens da democracia. Isso me dá a possibilidade de abordar alguns temas sepultados no Brasil de hoje.
Refiro-me a políticas públicas que melhoram a vida das pessoas. Participei ativamente de uma delas: o combate à aids no Brasil. Fui o braço parlamentar da decisão de distribuir gratuitamente os coquetéis antivirais. José Serra, então ministro da Saúde, foi mais longe questionando, internacionalmente, as patentes que davam exclusividade aos laboratórios, numa questão de vida ou morte.
Meu objetivo hoje era escrever sobre a doença de Alzheimer. Na época, consegui um estudo produzido pelo governo francês. No princípio do século, quase ninguém falava disso no Brasil. Procurei Serra e perguntei:
— Já ouviu falar de Alzheimer?
Ele disse, sorridente:
— Sim. Tenho muito medo disso.
Serra era visto como hipocondríaco e estava brincando com sua fama.
Eu ainda não tinha lido todo o estudo, mas disse apenas que a conclusão central para uma política era reconhecer que as famílias sozinhas não tinham condições de administrar o problema.
O tempo passou, a doença ficou mais conhecida, foi tema de um interessante filme, “Meu pai”, protagonizado por Anthony Hopkins.
Alguns amigos e conhecidos já foram atingidos por essa doença e, cada vez que ouço um novo caso, fico muito triste. Dizem, não tenho condições de confirmar cientificamente, que 20% dos octogenários podem ser atingidos por Alzheimer. Será um grande problema social e de saúde.
Não conseguimos criar uma política nacional abrangente para o Alzheimer. As famílias continuam desamparadas. Com as redes sociais, pelo menos podem trocar informações e atenuar seu fardo. O processo democrático é importante porque abre a possibilidade para essas políticas. Hoje, estão muito mais distantes.
O orçamento secreto é um assalto ao dinheiro público para fins paroquiais. É muito difícil apoiar políticas públicas que favoreçam a todos.
Esse é um tema importante quando pensamos na resistência ao golpe. O que restou da democracia, sequestrada pela extrema direita, religiosos, militares e políticos?
A passividade diante de absurdos como o orçamento secreto é, na verdade, uma ajuda ao golpe, na medida em que suprime uma das vantagens centrais da democracia: destinar racionalmente os recursos orçamentários.
Da mesma forma, a presença de pastores no Ministério da Educação, subvertendo o conceito de Estado laico, não pode ser entendida exceto como uma preparação para o golpe. A educação deixa de formar as crianças para os novos tempos e as entope de bíblias superfaturadas.
A presença das Forças Armadas num processo eleitoral de que deveriam manter distância segura, os supersalários de generais que se dizem salvadores da pátria, mas salvam seu próprio bolso — tudo isso fortalece um golpe porque reduz o potencial da própria democracia.
Um roteiro para enfrentar o golpe, desde o princípio, é lutar milímetro por milímetro por uma democracia plena. Tivemos mais demonstrações contra ela do que a favor, figuras autoritárias e grotescas concentram a atenção da mídia no Parlamento.
Há muito o que fazer, especificamente, para derrotar um golpe. Mas tudo será mais difícil se a gente não reconhecê-lo no cotidiano, na simplicidade das notícias que aparentemente não têm relação entre si.
Em discurso transmitido para dois milhões de robôs no Youtube, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que são infundados os temores de intervenção nas eleições pelo simples fato de que não teremos eleições. Ele disse que nunca criticou as urnas e que sabe comer farofa sem se emporcalhar.
Bolsonaro aproveitou para apresentar algumas sugestões dos militares para melhorar a votação. As urnas, por exemplo, passariam a dar choque elétrico cada vez que alguém apertasse um número diferente de 22. De acordo com o presidente, os militares apresentaram vários indícios de fraude, como por exemplo o fato de ser permitido teclar o 13.
Parte dos movimentos sociais está preocupada com o sentido opressor das palavras e buscando soluções para o problema. Exemplos: substituir o termo “seminário” por “ovulário”, e “esclarecimento” por “escurecimento”. O objetivo é mostrar como a sociedade oprime mulheres e negros ao valorizar características masculinas e brancas no léxico da língua portuguesa.
Porém “seminário” vem do latim “seminarium” (“viveiro de plantas”) que, por sua vez, vem de “semen” (semente). Logo, o sentido é de encontro para divulgar e debater ideias (analogia com germinar conhecimento). Da mesma forma, “esclarecer” não tem a ver com raça e sim com luminosidade: tornar claro para poder ver melhor.
Mesmo se a etimologia machista e racista estivesse correta, o uso corrente dessas palavras não apresenta significado preconceituoso. Além disso, exigir que as pessoas sempre reflitam sobre a origem das palavras antes de utilizá-las é um contrassenso. Isso demandaria um desgaste mental e ocasionaria uma perda de tempo que impossibilitariam a comunicação e as ações no mundo social.
A atual obsessão política pelo léxico se baseia na noção de que palavras têm poder e de que é possível mudar o mundo com palavras. Palavras podem muito, de fato: informar, debater, criticar e, algo fundamental no mundo político, conquistar audiência, efetuar parcerias que ampliem o raio de ação das ideias e tornem viáveis as demandas.
Será que inventar palavras sem motivo e produzir estranhamento no interlocutor é uma boa estratégia política? Não é. É academicismo elitista desligado da realidade social e linguística da maioria da população. Gera ridicularização por parte dos opositores e dificulta a compreensão. A luta de qualquer movimento social precisa fazer sentido para além do próprio movimento. Menos paranoia com palavras e mais seminários, mais esclarecimento sobre os problemas que de fato afetam as minorias talvez seja uma estratégia discursiva menos narcisista e mais eficiente.
PRIMEIRA, segunda ou terceira vias levando a eleição não fará diferença. Só os recém nascidos e os sempre morridos não sabem quem vencerá a eleição. Será a quarta via, a antigamente chamada quinta coluna, os que estão sempre agarrados ao poder. Olhe ao redor, se ainda consegue enxergar. Eles estão na primeira e na segunda vias, por enquanto e até sinal em contrário.
A quarta via corre para quem der mais. Ela usa a palavra milagrosa, sinônimo da picaretagem, do saque ao Estado: governabilidade. E nós tolinhos iremos todos à via dolorosa, aquela em que o inocente mata a sede com vinagre.
A Netflix passará por uma grande reformulação em seu sistema de assinaturas e terá anúncios. A empresa vai oferecer assinaturas mais baratas desde que você não se importe de parar sua série no meio para assistir a comerciais de supermercado.
Haverá um pacote chamado Nostalgia, que vem com uma antena portátil com bombril na ponta. No Brasil, não haverá diferença porque com nossa qualidade de internet é praticamente impossível assistir a algo sem que a imagem congele.
Depois de alguns meses exilado neste inóspito país estrangeiro chamado Brasil, voltei a morar em “Get Back”, o documentário com imagens inéditas dos Beatles. Quando o calo aperta, pego meu saco de dormir e me meto no estúdio londrino: entre a Yoko e o hare krishna, passo horas vivendo com meus amigos imaginários de Liverpool.
Uma das partes mais interessantes é quando a Scotland Yard aparece para acabar com o último show da banda, na cobertura da Apple. Enquanto dois delicadíssimos e imberbes policiais são engambelados pela secretária e pelo manager da banda, um repórter na rua entrevista os passantes: o que estão achando daquilo?
Para uma senhora de cabelo azul, o show é “Supimpa! Uma maneira bonita e solar de terminar o dia!”. Para um tiozinho de cartola, “Traz vida à cidade de Londres”. Há, contudo, almas atormentadas cuja primeira reação, ao ouvirem Beatles entrar pela janela do escritório no final do expediente, não é pensar na sorte de estarem vivos naquela época, naquela cidade, naquele bairro, mas chamar a polícia. Um sujeito cinza, de terno cinza e bigode cinza, grasna: “Atrapalha completamente todos os negócios da região!”.
Tenho de concordar com o plúmbeo bigodudo. Os Beatles tocando no telhado, no meio da tarde, atrapalham completamente todos os negócios na região. Acontece que o contrário também é válido: todos os negócios da região, ao chamarem a polícia, atrapalham completamente o show dos Beatles. E aí, como é que fica?
A resposta cinzenta padrão é: as pessoas precisam trabalhar para ganhar dinheiro e pagar as contas, enquanto a música é uma atividade inútil. É. Vá lá. Mas há maneiras menos tacanhas de se encarar o fato de haver nascido.
O mundo produzido por aquelas pessoas que discaram 190 ao ouvir “Don’t Let me Down” viria a dar aqui: neste apocalipse político climático zumbi com tanta desigualdade, Romero Britto e pizza de sushi. Passamos horas no trânsito. Quem não tá gordo é anoréxico. A humanidade se divide entre os ansiosos e os deprimidos e, embora saibamos que a vida é curta, gastamos boa parte dela vendo imagens da falsa felicidade alheia nas redes sociais. O que só nos deixa mais ansiosos ou deprimidos. Ou gordos ou anoréxicos. E ainda aumenta o aquecimento global, pois precisamos de cada vez mais energia pra ver mais fotos da falsa felicidade alheia nas redes sociais. Bem, aqueles caras, ali no telhado, estavam sugerindo uns outros caminhos.
Durante o Carnaval, no Rio de Janeiro, um taxista furibundo começou a rosnar quando viu, num bloco de rua, garotas de maiô com a bunda (meio) exposta. “Falta de vergonha! Elas não se dão o respeito, depois reclamam se alguém passa a mão!”. Tentei argumentar que mostrar meia bunda era um direito de qualquer brasileiro, passarem a mão nela, não, mas o homem vivia uma lua de fel com o semelhante.
Lembrei, na hora, do documentário. À época do lançamento, alguém tuitou que a queda de braço entre os SUJEITOS CINZENTOS X BEATLES NO TELHADO seguia vivíssima —e com ampla vantagem para o primeiro time. Ó que enrosco: o mundo acabando, a humanidade infeliz pra burro e ainda acham que loucas são meninas dançando de maiô na rua ou a maior banda de todos os tempos tocando de graça pra população da cidade.
“I have a dream!”, diria Martin Luther King. “I have a dream that one day” os Beatles e as bundas poderão mais do que os bigodes grisalhos! “I have a dream” de que um dia o menino da Scotland Yard e o hare krishna e a Yoko Ono estarão de mãos dadas cantando “All together now!”.
Não. Aí também já é demais, Antonio. Além de inalcançável, soa piegas. Sejamos pragmáticos na utopia: se deixarem em paz os Beatles e as bundas, já tá de bom tamanho.
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