Acusado de crimes contra a humanidade, Jair Bolsonaro ainda tem a caneta na mão e pode fazer muito mal. Todo cuidado é pouco
“Este relator está sobejamente convencido de que há um homicida homiziado no Palácio do Planalto”, disse o senador Renan Calheiros em seu último discurso na CPI da Pandemia. São palavras fortes e Renan, um orador à moda antiga, também recorre a termos pouco usuais, como “sobejamente” e “homiziado”. Mas o ex-presidente do Senado falou por todos nós. E também acertou em cheio ao comparar Jair Bolsonaro ao pastor Jim Jones, responsável pela morte de mais de 1.000 pessoas na Guiana em 1978. Segundo ele, Bolsonaro agiu como “um missionário enlouquecido para matar o próprio povo”.
Nove crimes foram imputados ao “enlouquecido”, que é responsabilizado pelo alto número de mortes na pandemia. Bolsonaro é acusado desde charlatanismo até prevaricação e crimes contra a humanidade. Tudo isso fartamente documentado nas 1.287 páginas do relatório, que expressa os seis meses de trabalho da CPI. Em circunstâncias normais, tais crimes levariam ao impeachment de um presidente da República. Mas nesta quadra terrível da vida nacional, tudo indica que Bolsonaro contará com o escudo protetor do procurador-geral da República, Augusto Aras, a quem caberia tocar os processos.
É quase certo que Aras vai engavetar os pedidos de investigação ou empurrá-los com a barriga. Mas o que foi apurado pela CPI apurado está. E as acusações contra Bolsonaro também serão levadas à Corte Interamericana de Direitos Humanos na Costa Rica e ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (já há denúncias na Corte Internacional de Haia). Mesmo com a cumplicidade de Aras, Jair Bolsonaro dificilmente vai escapar da Justiça ao fim de seu mandato. Seus desmandos e crimes não ficarão impunes.
Mas todo cuidado é pouco com o “homicida do Planalto”. Se o escudo de Aras não falhar, o Capitão Corona só deixará o cargo em 31 de dezembro de 2022. Até lá, mesmo como um pato manco impopular e desmoralizado, ele continuará com a caneta na mão e poderá trazer prejuízos ainda maiores para o país. Hoje o balanço de seu governo é pra lá de medíocre. O desemprego atinge mais de 13 milhões de trabalhadores. A inflação supera 10% ao ano, na maior taxa desde 1995, e o crescimento da economia deve ficar entre 0,5% e 1% no ano que vem. Mal na economia, o governo Bolsonaro é um desastre em todas as frentes. O ex-capitão é, sem dúvida, o pior presidente de todos os tempos.
Seu fracasso só é comparável ao do general João Figueiredo, o último presidente da ditadura militar, que chegou ao Palácio do Planalto com inflação de 40% e o deixou com taxa anual acima de 200%. Dizem em Brasília que, se as pesquisas indicarem que as chances de reeleição são remotas, Bolsonaro sairá candidato ao Senado ou à Câmara. Assim, contará com a imunidade parlamentar para enfrentar os futuros processos. Pode ser. Mas o mais certo é que ele repetirá o exemplo de Figueiredo e deixará o Palácio pelas portas do fundo. Dali, a exemplo do último ditador, Bolsonaro vai para o lixo da história.
Para completar a trilogia do amor, iniciada com o homem que amava as flores, seguida de o homem que amava as cores, nada mais indicado do que o homem que tinha um caso de amor com a vida. Era Rubem Alves, o meu querido e saudosíssimo Rubem Alves, professor, escritor, filósofo, pensador, poeta e extraordinário ser humano.
Demorei para conhece-lo. Por culpa minha. Foi numa noite, através da televisão, no “Roda Viva”, da Cultura de São Paulo. Lá estava o Rubem no centro da roda, alegre, simpático e faceiro, falando sobre os temas que tanto adorava: educação, crianças, poesia, literatura e vida. Foi amor à primeira vista. Depois, vi-o no “Aqui Entre Nós”, da nossa TV Paraná Educativa, desfilando a simplicidade dos sábios, fazendo amigos e conquistando admiradores. Mas aí eu já me tornara seu leitor e admirador. Hoje, posso vangloriar-me de haver lido praticamente toda a sua extensa obra – mais de uma centena de títulos. A conselho do próprio autor, li-o e leio-o devagar, sem nenhuma pressa, entremeando a leitura com pensamentos, para não atropelar o prazer e afetar o sabor, na linha de ensinamento de Schopenhauer – tão citado por Rubem –, segundo o qual a leitura só é boa quando bovina, isto é, quando leva à ruminação. E a leitura de Rubem Alves faz bem à alma, traz felicidade e sabedoria, rejuvenesce o ser humano.
Rubem nasceu em Boa Esperança, MG – “aquela cuja serra Lamartine Babo imortalizou numa canção” –, em setembro de 1933. Estudou música: quis ser pianista, até que comparou o seu talento com o do conterrâneo Nelson Freire. Em seguida, pensou em ser médico, por amor a Albert Schweitzer. Andou pelos caminhos dos deuses: estudou teologia no Seminário Presbiteriano de Campinas, SP; fez mestrado no Union Theological Seminary, de Nova York; doutorou-se em filosofia pelo Princeton Theological Seminary; tornou-se psicanalista pela Associação Brasileira de Psicanálise; e foi pastor protestante. Depois, confessou ter ficado mais modesto e passou a andar nos caminhos dos heróis: militou na política, esteve na lista dos procurados pelo golpe militar de 1964 e foi professor livre-docente da Unicamp. Quando os seus “deuses e heróis morreram”, como assinalava, seguiu o caminho dos poetas, dos pensadores e das crianças: virou escritor e cronista. Mas foi, sobretudo, a vida toda, um menino e um avô que adorava brincar e compartilhar pensamentos: uma extraordinária figura humana, que amava a beleza, a natureza, as netas, os jardins e os pássaros, a sabedoria das crianças, o vento fresco da tarde, os ipês floridos, o outono, os animais, os campos e os cerrados, o mar e as montanhas, o orvalho sobre a teia de aranha e os pores-do-sol.
Ah, os crepúsculos!… “Na cidade onde eu vivi, no interior, ao crepúsculo se tocava a Ave Maria, e era como se toda a Natureza parasse e rezasse. Eu gostava de ficar olhando para as árvores, havia uma imobilidade absoluta no ar. Nem um único tremor perturbava a tranquilidade pensativa das folhas. E as nuvens ao poente se coloriam de verde-claro, passando pelos amarelos, laranjas e vermelhos, até o roxo, que se preparava para desaparecer na escuridão”.
As palavras de Rubem Alves eram e continuarão sendo lições de vida. Suas crônicas emocionam e fazem-nos pensar. Às vezes é irônico e bem-humorado; outras vezes, lírico e romântico; e outras mais, crítico e até mordaz. Mas sempre inteligente, humano e sincero. Ele era capaz de, com toda a simplicidade, construir verdades eternas, de profunda significação. Uma delas: “Minas não tem mar. Mas Minas tem céu. E o céu é o mar de Minas”.
Houve apressadinhos desinformados que me acusaram de excesso de admiração. Em vez de ofender-me, a pichação valeu-me uma ponta de vaidade, pois só não admirava, respeitava e queria bem Rubem Alves quem não tivera a glória de desfrutar do pensamento dele e das suas aulas de viver.
Ele nos deixou fisicamente na manhã de 12 de julho de 2014, mas suas lições serão eternas. Em uma de suas últimas crônicas, quando a doença ainda não havia dominado o seu corpo e a sua mente, o grande Rubem deixou consignadas as suas derradeiras vontades para o momento final neste mundo:
“Vou ser cremado por não gostar de lugares fechados. As cinzas podem ser soltas ao vento ou colocadas como adubo na raiz de uma árvore. Assim posso virar nuvem ou flor. Um jantar para os amigos com sopa, vinho e Jack Daniels. Será que no outro mundo há Jack Daniels? Ofício religioso, Deus me livre. Não quero que se digam palavras dizendo que fui para o céu. O céu me dá calafrios. Mas gostaria que meus amigos ouvissem algumas das músicas que amo. São muitas. Separei algumas. Gluck: Melodia, da ópera Orfeu e Eurídice, Nelson Freire ao piano. Está no seu DVD. De Bach: o Minueto, do Livro de Ana Madalena. É a coisa mais singela… O CD Bach, do grupo O Corpo, com o Uakti. A primeira suíte para violoncelo, sobre a qual escrevi o livro O Barbazul. O CD Lambarena, em homenagem a Albert Schweitzer, com ritmos africanos. Bach ficaria assombrado! A ária para a quarta corda. Carl Orff, a canção “In trutina”, da Carmina Burana. De Mozart, a Sonata em lá maior KV. 331 (Marcha turca); Uma pequena serenata (Eine kleine Nacht Music). Eu fazia meu filho Sérgio dormir ouvindo essa delicadeza…”
Algum tempo depois, quando já bastante doente, Rubem escreveu uma mensagem para os filhos. Ela foi confiada ao amigo de quarenta anos, o antropólogo Carlos Brandão, e somente lida no dia de seu funeral. Nela ele se dizia grato pela vida e acrescentava: “Não terei últimas palavras a dizer. As que tinha para dizer, disse durante a minha vida. Fui muito amado. Tive muitos amigos. Plantei árvores, fiz jardins. Construí fontes, escrevi livros. Tive filhos, viajei, experimentei a beleza, lutei pelos meus sonhos. Que mais pode um homem desejar? Procurei fazer aquilo que meu coração pedia.” Depois, reafirmava o desejo de ser cremado e suas cinzas despejadas aos pés de um ipê amarelo – provavelmente na Fazenda Santa Elisa, que ele tanto amava, na cidade paulista de Campinas –, enquanto seriam lidos poemas de seus poetas preferidos, como Cecília Meireles e Fernando Pessoa.
Para eventual lápide – que, em virtude da cremação do corpo, não haverá –, Rubem lembrou de Robert Frost e concluiu que era a frase que ele escolheria para constar sobre sua sepultura: “Ele teve um caso de amor com a vida”.
Acusado de crimes contra a humanidade, Jair Bolsonaro ainda tem a caneta na mão e pode fazer muito mal. Todo cuidado é pouco
“Este relator está sobejamente convencido de que há um homicida homiziado no Palácio do Planalto”, disse o senador Renan Calheiros em seu último discurso na CPI da Pandemia. São palavras fortes e Renan, um orador à moda antiga, também recorre a termos pouco usuais, como “sobejamente” e “homiziado”. Mas o ex-presidente do Senado falou por todos nós. E também acertou em cheio ao comparar Jair Bolsonaro ao pastor Jim Jones, responsável pela morte de mais de 1.000 pessoas na Guiana em 1978. Segundo ele, Bolsonaro agiu como “um missionário enlouquecido para matar o próprio povo”.
Nove crimes foram imputados ao “enlouquecido”, que é responsabilizado pelo alto número de mortes na pandemia. Bolsonaro é acusado desde charlatanismo até prevaricação e crimes contra a humanidade. Tudo isso fartamente documentado nas 1.287 páginas do relatório, que expressa os seis meses de trabalho da CPI. Em circunstâncias normais, tais crimes levariam ao impeachment de um presidente da República. Mas nesta quadra terrível da vida nacional, tudo indica que Bolsonaro contará com o escudo protetor do procurador-geral da República, Augusto Aras, a quem caberia tocar os processos.
É quase certo que Aras vai engavetar os pedidos de investigação ou empurrá-los com a barriga. Mas o que foi apurado pela CPI apurado está. E as acusações contra Bolsonaro também serão levadas à Corte Interamericana de Direitos Humanos na Costa Rica e ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (já há denúncias na Corte Internacional de Haia). Mesmo com a cumplicidade de Aras, Jair Bolsonaro dificilmente vai escapar da Justiça ao fim de seu mandato. Seus desmandos e crimes não ficarão impunes.
Mas todo cuidado é pouco com o “homicida do Planalto”. Se o escudo de Aras não falhar, o Capitão Corona só deixará o cargo em 31 de dezembro de 2022. Até lá, mesmo como um pato manco impopular e desmoralizado, ele continuará com a caneta na mão e poderá trazer prejuízos ainda maiores para o país. Hoje o balanço de seu governo é pra lá de medíocre. O desemprego atinge mais de 13 milhões de trabalhadores. A inflação supera 10% ao ano, na maior taxa desde 1995, e o crescimento da economia deve ficar entre 0,5% e 1% no ano que vem. Mal na economia, o governo Bolsonaro é um desastre em todas as frentes. O ex-capitão é, sem dúvida, o pior presidente de todos os tempos.
Seu fracasso só é comparável ao do general João Figueiredo, o último presidente da ditadura militar, que chegou ao Palácio do Planalto com inflação de 40% e o deixou com taxa anual acima de 200%. Dizem em Brasília que, se as pesquisas indicarem que as chances de reeleição são remotas, Bolsonaro sairá candidato ao Senado ou à Câmara. Assim, contará com a imunidade parlamentar para enfrentar os futuros processos. Pode ser. Mas o mais certo é que ele repetirá o exemplo de Figueiredo e deixará o Palácio pelas portas do fundo. Dali, a exemplo do último ditador, Bolsonaro vai para o lixo da história.
O Vigia – A vida organizada do vigia de um sanatório abandonado é perturbada pela chegada de um casal estranho que pede para ficar em um dos quartos. Os três têm algo de que querem fugir e também esconder no deserto.
Três personagens enfrentam tormentos do passado no drama russo O Vigia. Vlad escolhe um trabalho solitário como o único vigia de um sanatório fechado. A instituição, hoje vazia, possui mais de 300 quartos e se localiza distante de qualquer cidade. E, o isolamento parece ainda maior no gélido inverno russo, quando se desenrola a trama do filme.
Acima de tudo, O Vigia mantém um tom sufocante de desesperança. De fato, como o desfecho trágico e pessimista comprova, não há solução para os problemas dos protagonistas. Nesse sentido, o clima gelado e o local isolado e vazio reforçam uma sensação triste de vidas sem perspectivas.
O Vigia (Storozh / Guard) 2019. Rússia. 90 min. Direção e roteiro: Yuriy Bykov. Elenco: Yuriy Bykov, Vladislav Abashin, Alla Yuganova, Aleksandr Kuzmin, Artur Beschastnyy, Gela Meskhi. Distribuição: A2 Filmes.
Gilda – Era a única disponível na festa, estava alucinada e não sabia dançar. Mas o sábado foi magnífico e se não fosse um tango mal acabado o fim de semana teria sido perfeito.
Hortênsia – Ela se recusou a dizer seu nome durante semanas e foi nesse período que gastei todas as minhas economias em pescarias insossas e pacotes de algodão doce, sem falar nos pés-de-moleque. Uma paixão passageira, mas gratificante.
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