Uma lista de desejos

Desde muito, a virada do ano é marcada por promessas de mudanças pessoais. Imagino como isso deve ter mudado em tempos de hoje.

Vivemos sob um bombardeio de conselhos. Já falei sobre um aspecto deles, uma espécie de terrorismo alimentar que combate tudo, desde açúcar e ultraprocessados até o leite, o pão, a lactose e o glúten. Esse bombardeio fez o pão nosso de cada dia virar o pão que o diabo amassou. Impressionante, a julgar pelas advertências, observar como a humanidade sobreviveu, sobretudo depois de Cristo ter multiplicado o pão.

Outro dia, um desses gurus alimentares confessava na rede que toma dez comprimidos de suplemento alimentar antes do café. Não fica claro para que café da manhã, depois de tanto comprimido. Os suplementos são a outra face do bombardeio: ômega 3, magnésio, cúrcuma, creatinina, vitaminas — é uma lista interminável.

Tenho visto também nas redes sociais o grande número de pessoas dizendo o que fazer para sermos felizes. Há algumas senhoras bem vestidas, gurus indianos com seus turbantes, todos garantindo que existem três, quatro ou às vezes até sete conselhos que mudarão nossa vida. Usando tática muito comum na internet, dizem que o último conselho é o mais surpreendente. Assim tentam reter nossa atenção até o fim.

Outro dia, vi uma senhora dizendo que um bom princípio era este: se não te disserem, não pergunte. Levado a sério, isso seria a ruína da profissão de jornalista.

Decidido a levantar nosso moral no Instagram e no TikTok, um guru indiano com turbante e longas barbas brancas diz que estarmos vivos é um milagre. Todos os dias morrem 250 mil pessoas no mundo. Quando olhar o relógio, não veja apenas as horas, mas celebre o fato de estar vivo.

Tenho um velho relógio, que costuma atrasar de três a cinco minutos. Quando sigo os conselhos do guru e vejo as horas, não sei se estou realmente vivo ou se morri há uns minutos atrás.

Todo esse novo batalhão de conselheiros não significa que as pessoas não tenham seus projetos íntimos e pessoais. É importante que os toquem para a frente, na ilusão de que a passagem de ano realmente seja um marco renovador. É algo que faz bem, desejar felicidades, organizar a vida para que ela venha. Estou de pleno acordo com o otimismo do Ano-Novo.

Devo cuidar também da minha lista. Acontece que já são um pouco mais de 80 viradas. A margem de manobra é mais estreita. Creio que, por uma questão de esperança, adotarei aquela velha tática dos antigos países comunistas e farei planos quinquenais. É um tempo razoável para esquecer os principais tópicos e, além de tudo, aqueles planos quinquenais nunca funcionaram mesmo.

Gostaria de não perder mais canetas. E de criar um sistema de inteligência sofisticado para evitar que elas se articulem com os óculos e as chaves e desapareçam ao mesmo tempo, numa ação coordenada destinada a me enlouquecer.

Gostaria também de seguir viajando, mas criar um avatar que me substitua nas longas esperas em aeroportos. Nada contra elas, mas cansam mais que o próprio voo. Poderia ser substituído por um coelho que hesitasse muitas vezes diante do portão, até que finalmente encontrasse o lugar certo. Quase nunca é o previsto.

Outro item importante na lista: se quero combater a polarização que divide o país, tenho de começar a combatê-la dentro de casa. Há duas gatas que não se entendem, às vezes se pegam ruidosamente na sala e deixam tufos de pelo no chão. Como convencê-las de que são da mesma espécie, há comida e carinho para todas?

Na verdade, meu plano quinquenal, ainda que com muitas derrotas e atropelos, será plenamente vitorioso se chegar ao fim. Num caminho tão longo, há muitas coisas repetidas, muito déjà-vu, e, quando me pedirem para comentá-las, usarei apenas um lado da lição de meu guru indiano:

— Desculpe, mas morri cinco minutos atrás.

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Ela

DeniseAssunção-doisDenise Assunção (1956|2024). © Mauricio Shirakawa

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Rettamorfose

Todo dia Luiz Carlos Rettamozo acorda transformado na Linha Retta, que é a distância mais curta entre dois pontos. © Rodolfo Pajuaba

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Espeto Corrido – 2019

Quem vê os jornais de hoje, bem diagramados, com uma exuberância de fotos, não faz idéia do esforço dos pioneiros da imprensa para manter suas publicações. Os clichês eram caros e difíceis. Havia um jornal do interior que possuia apenas um deles. Como estava desgastado pelo tempo e saia muito borrado, servia para tudo. Desde o Presidente da República até um flagrante de enchente. Só mudava de posição e de legenda. Era um tempo de muita criatividade.

Aqui em Curitiba contam que no antigo jornal O Dia, em certa ocasião, na hora do fechamento, ocorreu um crime no centro da cidade que foi manchete. Naquele tempo não havia essas facilidades de fotografia e fotolito. Impossibilitado de estampar o criminoso, o secretário não teve dúvidas. Colocou um enorme clichê do General Osório, “figura histórica, que empresta o nome à praça onde se deu o monstruoso assassinato”.

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Requiescat in pace

Denise Assunção nasceu no dia 5 de dezembro de 1956 em Tietê, interior de São Paulo. Ela atuou nos shows da Banda Isca de Polícia do seu irmão, Itamar Assumpção, que foi um dos principais expoentes da Vanguarda Paulista. Em 2021, Denise teve o show “Pantera” produzido e dirigido por Alexandre Borges. Participou também do grupo Teatro Margem, dirigido por Manoel Carlos Karam, em Curitiba, década de 1970.

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Todo dia é dia

hoje eu não estou
pra conversa
meu vício já não versa
palavras
que não se entendem
e vice-versa

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Flagrantes da vida real

Samuel Lago: crush no peito e Rádiocaos a todo vapor. © Maringas Maciel

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Isso!

Dezembro, 1972. Ditadura militar. Revista Isso (Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba), Nelson Padrella, Luiz Rettamozo, Dico Kremer, Solda, Walmor Marcelino, J. Gaspar e outros super heróis.

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Moraes diz que planos do 8/1 visavam prendê-lo e enforcá-lo

Em entrevista ao jornal ‘O Globo’, o ministro do STF falou sobre as investigações e julgamentos dos responsáveis pelas invasões dos três Poderes. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que os manifestantes mais exaltados do 8 de janeiro defendiam que ele fosse “preso e enforcado na Praça dos Três Poderes”, conforme entrevista publicada pelo jornal O Globo nesta quinta-feira, 4.

“Eram três planos. O primeiro previa que as Forças Especiais (do Exército) me prenderiam em um domingo e me levariam para Goiânia. No segundo, se livrariam do corpo no meio do caminho para Goiânia. Aí, não seria propriamente uma prisão, mas um homicídio. E o terceiro, de uns mais exaltados, defendia que, após o golpe, eu deveria ser preso e enforcado na Praça dos Três Poderes. Para sentir o nível de agressividade e ódio dessas pessoas, que não sabem diferenciar a pessoa física da instituição”, disse Moraes.

O magistrado afirmou não ter ampliado sua segurança pessoal porque os autores das ameaças são “extremamente corajosos virtualmente e muito covardes pessoalmente”.

“Então, chegam muitas ameaças, principalmente contra minhas filhas, porque até nisso eles são misóginos. Preferem ameaçar as meninas e sempre com mensagens de cunho sexual. É um povo doente”, acrescentou.

Sobre as investigações, Moraes disse que elas apontam que os discursos nos quartéis onde os manifestantes estavam acampados já indicavam o que estava por vir em Brasília e criticou as autoridades do governo Bolsonaro por terem permitido os acampamentos.

“Nas investigações e nos interrogatórios de vários desses golpistas, temos que os discursos nos quartéis onde estavam acampados diziam que deveriam vir para Brasília. De vários financiadores, (a ordem era que) deveriam vir, invadir o Congresso e ficar até que houvesse uma GLO para que o Exército fosse retirá-los. E, então, eles tentariam convencer o Exército a aderir ao golpe. O que mostra o acerto em não se decretar a GLO, porque isso poderia gerar uma confusão maior, e sim a intervenção federal. Não que o Exército fosse aderir, pois em nenhum momento a instituição flertou (com a ideia). Em que pese alguns dos seus integrantes terem atuado, e todos eles estão sendo investigados”, afirmou o ministro do STF.

“Foi um erro muito grande das autoridades deixar, durante o ano passado, aquelas pessoas permanecerem na frente dos quartéis. Isso é crime e agora não há mais dúvida disso. O Supremo Tribunal Federal recebeu mais de 1.200 denúncias contra quem estava acampado pedindo golpe militar, tortura e perseguição de adversários políticos. No dia do segundo turno, também tivemos um problema grave com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), objeto de inquérito, que inclusive gerou a prisão do ex-diretor (Silvinei Vasques). Houve a greve dos caminhões tentando parar o país. A violência estava numa crescente. No dia da diplomação, 12 de dezembro de 2022, houve prisões após a (tentativa de) invasão da Polícia Federal. Como na posse não houve nada, infelizmente as pessoas da área de segurança talvez tenham ficado mais otimistas. O grande erro doloso foi permitir a entrada (dos golpistas) na Esplanada dos Ministérios. O 8 de janeiro foi o ápice do movimento: a tentativa final de se reverter o resultado legítimo das urnas”, acrescentou.

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Padrelladas

Comprei um quilo de feijão ungido do Waldomiro e estarei promovendo uma feijoada para o próximo sábado. A feijoada será grátis. Estaremos aceitando uma doação obrigatória nunca inferior a miu reau. Tragam todo mundo. Vai ter dança e música de sanfona. Alguém traga uma sanfona.

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O irmão do Maracanã

Os regimes mais canalhas nascem e prosperam em nome da liberdade.

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Mural da História – 1979

 

Revista Atenção, Grafipar|Gráfica e Editora – 1979

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Não é não, mas nem tanto

A lei 14.786/2023 de 28/12/23 criou o protocolo “Não é Não”.

A finalidade é de prevenção ao constrangimento e à violência contra a mulher e para proteção à vítima, bem como a instituição do selo “Não é Não – Mulheres Seguras”. Se compararmos a lei brasileira com a lei espanhola e outras, constatamos que pouco avançamos em matéria de proteção às mulheres.

Por exemplo, o testemunho da vítima não tem o peso probatório maior que o do agressor, ao contrário da nova legislação espanhola, que privilegia as mulheres.

Na caracterização do constrangimento a lei prevê a insistência, física ou verbal, o que deixa implícita a necessidade da repetição da conduta para a ilegalidade. A insistência é mais de uma vez ou o número de investidas tem que ser maior que isso?

O conceito de violência remete à legislação penal em vigor, outra repetição desnecessária. Em síntese, afirma-se que as leis devem ser cumpridas. No direito romano essa lei seria qualificada como imperfeita, pois não impõe sanção ou nulidade a ato praticado contra suas previsões. É um mero conselho legislativo, e, na prática, não possui nenhuma consequência.

Direitos e deveres sem sanções são como a deusa da justiça sem a espada da punibilidade, com a venda sobre os olhos bem amarrada, para não ver a realidade dos fatos.

Há uma exceção na lei: ela não se aplica a cultos nem a outros eventos realizados em locais de natureza religiosa. Então nesses locais, o não é um sim?

Essa excepcionalidade resulta do crescente estado teocrático que se instala no Brasil, e apequena o caráter laico das instituições.

Isso ocorreu, primeiro, com a quebra do estado secular nas telecomunicações, com a distribuição de centenas de emissoras de rádio e televisão para os setores neopentecostais. Segundo, na partidarização dessas empresas religiosas criando forças políticas sem limites de propaganda e de divulgação dos seus candidatos.

Uma nova moral política instala-se no país; a pauta dos costumes e o negacionismo são seus anexos. Tudo isso, em grande parte pelo favorecimento da imunidade tributária, a partir da década de 1990l que fez brotar o grande negócio da fé.

Coisas que jamais seriam permitidas no mundo civilizado, aqui prosperam.

Resultado, na lei do “não é não”, de pouco efeito prático, há essa aberração jurídica de que ela não vale nas instituições religiosas. Uma lei inconstitucional que assombra o mundo jurídico civilizado.

Na verdade, a lei não deveria ser aplicada apenas a bares e a casas noturnas, mas em qualquer ambiente público ou privado e poderia conferir valor probatório maior à palavra da vítima, coisas que são impensáveis no atual atraso histórico brasileiro.

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Mural da História – 2013

Capa do CD de Ana Larousse, “Tudo começou aqui”, 2013, independente. © Rosano Mauro Jr.  

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