O castigo nas patas do jumento

RENATO FEDER divulga longa nota aos blogs, na qual explica o imbróglio do vai-não-vai para o ministério Bolsonaro. Ele ainda pega o apelido de Renato Serrote, como o da antologia escolar dos anos 1950, quando a escola era pública e franca e o ensino, presente e próximo. A nota não chegou ao Insulto, que os políticos negam ler; só os outros blogs fazem isso, o que é honra bastante. Ah, sim, também é lido pelos assessores alfabetizados dos políticos – do microcosmo do pinhão dos pinhais, claro.

Nosso retornado secretário faz o mea culpa tardio e desnecessário: não foi empresário da educação, não quer o ensino à distância, não sonha em esbodegar o ensino público. Faz sua loa a Ratinho Júnior – não mais que obrigação, pois o governador, que tem Beto Preto como secretário, podia bem dizer que “se não serve para Bolsonaro, não serve para mim”. O governador, sabemos, entrega um canal de televisão para não entrar em briga e a rede inteira para continuar fora.

O mea culpa do secretário Feder tem toque FHC, do “esqueçam o que escrevi”. O secretário justifica as ideias pelas quais é criticado – mais aqui no Insulto, por aí afora suas ideias só merecem ataques petistas e para-petistas. Não as renega, apenas as atribui a um escorregão da juventude: divulgou-as em livro aos 26 anos, um pecadilho da juventude. Na época, vaidoso, esqueceu que aos 26 a genialidade e a fortuna só bafejam os Castro Alves e os Arthur Rimbaud da vida.

Como promete – e não cumpre – mestre Célio Heitor Guimarães, este será o último post do Insulto sobre Renato Feder. Ele que fique lá na secretaria a purgar a rejeição. O Insulto a tudo perdoa, menos aquilo de chamar Jair Bolsonaro de estadista para se cacifar para ministro. Se o secretário dominasse a ironia teria ficado quieto. Seu castigo veio a cavalo nas patas do jumento; Bolsonaro rejeitou-o duas vezes. Não se chama estadista a um projeto de ditador do Haiti.

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Perguntas sobre as eleições deste ano

A emenda constitucional 107 de 2 de julho de 2020 mudou a data das eleições municipais de outubro para o primeiro turno, em 15 de novembro, e para o segundo turno, em 29 de novembro.

Se a pandemia não tiver acabado há questões importantes para se debater.

Por exemplo, se o eleitor estiver no grupo de risco, ele pode se negar a votar e deverá pagar a multa por não ter votado? E este fato, não compromete o pleito eleitoral sob o aspecto da igualdade?

Os mesários e todo pessoal de apoio se forem do grupo de risco, terão que ficar nas escolas em salas apertadas, e sem ar condicionado, no calor de novembro atendendo os eleitores?

A emenda constitucional abre a possibilidade para a alteração das datas das eleições mediante parecer de Comissão Mista do Congresso Nacional e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), colocando como data limite o dia 27 de dezembro de 2020.

Mas como fica, neste caso, o calendário da propaganda eleitoral, no meio do processo eleitoral? Será prorrogada? Ficará suspensa? Qual a data limite para decidir isto?

A emenda suspendeu a aplicação da regra constitucional da anterioridade da lei eleitoral, pois a alteração, só poderia valer para o ano seguinte à sua publicação. Isto é constitucional?

As reuniões partidárias serão por teleconferência? E todo aquele caciquismo partidário como ficará? Alguém ouvirá os patrões partidários e seus asseclas?

E os gastos das contas de campanha que serão julgados após a diplomação dos eleitos? Houve o recado do TSE que se as contas foram reprovadas haverá a invalidação dos eleitos e assumem os colocados subsequentes.

E as pessoas em isolamento social, realmente, têm condições de discutir política com seus amigos e colegas para refletir sobre a safra de demagogos que se elegerão neste pleito?

E as agremiações religiosas que formam uma massa de eleitores muito maior que qualquer partido político? Deixarão de fazer campanha eleitoral em seus cultos, mesmo afastando seus divulgadores? Isto é isonômico sob o ponto de vista eleitoral e num estado supostamente laico?

E a igualdade do pleito entre os atuais eleitos que contam com estúdios e verbas para divulgação da atividade parlamentar e os que querem entrar e não contam com nada disto?

O orçamento público destinou 2 bilhões de reais para propaganda eleitoral em tempos de pandemia. Isto foi um abuso se considerarmos a drástica redução de custos de campanha e as urgentes necessidades de combate à pandemia no Brasil?

A última pergunta vai para deputados estaduais e federais, senadores, governadores e presidente, todos de olho nas eleições de vereadores e prefeitos: – Será que farão uma bancada municipal para reelege-los, daqui dois anos, considerando o atual (des)governo?

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Eu, prefeito de Curitchiba

O eu antes de tudo, o eu acima de todos, a macaquice bolsonárico-rafaelita da luz dos pinhais.

COMO O VÍRUS só vai embora quando quiser, o prefeito Rafael Greca bem que podia pôr sua boca em quarentena. Não dá para aguentar aquele narcisismo infantil do “eu, prefeito de Curitchiba”, “MinhaMargarita”, “xô, corona”, mais o gongorismo superlativo das hipérboles para si mesmo.

Tem qualquer coisa de muito errada com o eleitor curitibano que até agora não se encheu dele. Se Jair Bolsonaro não fosse tão imbecil, ele seria menos intragável que Rafael Greca. O prefeito ainda é o garotinho exibido que a mãe chamava na sala para fazer gracinhas para as visitas.

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Playboy|1980

1989|Petra Verkaik. Playboy Centerfold

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Jô e Fernanda Montenegro explicam talento de Carl Reiner e Michel Piccoli

O americano Carl Reiner morreu na segunda-feira, aos 98 anos. O francês Michel Piccoli se foi há um mês e pouco, aos 94. Um era ator cômico e o outro, dramático. E ambos obtiveram o afeto de seus pares e do público sem terem sido astros, galãs e, muito menos, celebridades.

Raramente eram protagonistas: ninguém ia ao cinema, ou ao teatro, ou ligava a televisão, exclusivamente para vê-los em ação. Ainda que não atraíssem multidões, os dois foram essenciais à arte e a outros artistas.

Michel Piccoli deu vida ao talento de dúzias de diretores, sobretudo ao gênio de Luis Buñuel. E sem Carl Reiner o humor americano seria mais pobre. De Sid Caesar a Steve Martin, passando por Dick Van Dyke e Woody Allen, trabalhou com todos os grandes —escrevendo, dirigindo e contracenando.

Além da generosidade, compartilharam o gosto pela palavra falada. Precisaram tão-somente da pureza da voz para expressar diferentes desvãos e descaminhos da experiência humana. A elocução deles era antagônica e, mais uma vez, ambos a puseram a serviço dos outros.

É o caso do “Homem de 2.000 Anos”, que nasceu de uma pergunta improvisada de Carl Reiner a Mel Brooks: “Você estava presente na crucifixão, conheceu Jesus?”. “Oh, boy, claro que conheci”, respondeu o outro. “Ia sempre à minha loja com 12 caras, todos de sandália. Nunca comprou nada.”

A brincadeira virou um diálogo no qual Carl Reiner fazia um repórter que entrevistava o hiper-Matusalém. Este explicava sua longevidade por não comer fritura nem correr para pegar o ônibus. Dizia que namorara Joana D’Arc, mas o caso não foi adiante “porque ela tinha uma missão”.

Durante uma década, a dupla apresentou o esquete em festas de amigos. Com um sotaque judaico hilário, o Homem de 2.000 Anos contava que o medo era motor de propulsão no início dos tempos: “Uma fera rosnava, e a gente corria duas milhas em um minuto”.

Ele se casara 700 vezes, tivera 42 mil filhos, “e nenhum deles vem me visitar”. Comentava que investira numa peça perdida de Shakespeare —“A Rainha Alexandra e Murray”— e que o dramaturgo tinha uma caligrafia péssima. Não fizeram o esquete em público: era uma diversão entre eles.

Até que um produtor sugeriu que registrassem alguns diálogos. Se não gostassem do resultado, destruiriam a fita. Os dois convidaram uma plateia de amigos, gravaram um disco ao vivo e, como disse Mel Brooks, “nos rendemos ao capitalismo”.

Lançado em 1960, o disco vendeu 1 milhão de cópias. Cary Grant o levou ao Palácio de Buckingham e até a rainha Elisabeth morreu de rir.

Fizeram mais quatro discos, todos de sucesso estrondoso. São ouvidos até hoje porque retêm o prazer da criação, a gratuidade da arte pela arte.

O pândego Homem de 2.000 Anos não existiria sem a cara de pau de Reiner, sem a sua disposição em servir de escada para os absurdos de Brooks. “Ele tinha a humildade do grande talento, o que esclarece muita coisa”, diz Jô Soares, que encomendou o livro de memórias do humorista ao saber da sua morte.

Com Michel Piccoli o caso foi outro. É o que explica Fernanda Montenegro: “Ele pertence à categoria fundamental na dramaturgia que é a do ator central. Onde houver necessidade da credibilidade cênica, lá tem que estar um Michel Piccoli: luz, inteligência e emoção exata. Olho em volta e não vejo ninguém à sua altura”

O ator usou sua luz, inteligência e emoção para iluminar e aclarar um texto crucial da literatura moderna, os “Pequenos Poemas em Prosa”, de Baudelaire. Gravou-os na íntegra, em quatro CDs preciosos.

Prodigiosos, eles não são apenas declamação. Servem de introdução, expressão, comentário e até de crítica literária. Piccoli faz tudo isso por meio exclusivamente da voz, de modulações e de ênfases, sem dizer uma palavra que não esteja na obra prima, na difícil beleza de Baudelaire.

A literatura é tida por uma operação cerebral. Nem sempre foi assim. Ela começou antes que a escrita fosse inventada. Os cantos da “Odisseia” e da “Ilíada” eram recitados por rapsodos em praças gregas. Congregavam, ensinavam, socializavam.

A poesia vem do corpo e se destina ao aqui e agora. Isso ocorre quando o Baudelaire do rapsodo Michel Piccoli parece falar de livros de autoajuda, ou de economistas, lidos durante a pandemia.

“Confinei-me no quarto com livros na moda”, diz. São livros que ensinam povos e pessoas a serem “felizes, sábios e ricos em 24 horas”. E aí os “empreendedores da felicidade pública aconselham os pobres a serem escravos”.

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Antes e depois

Liz Glazowski, revista Playboy, 1980 e ela, 30 anos depois, 2011. 

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Padrelladas

Diário da Pandemia

A vizinha de cima, todo mundo chama ela de Mia, foi o seguinte. Me deu vontade de provocar. Fui até lá e falei pela porta fechada: “A senhora faz pão pra vender?”. Ela achou estranho e respondeu que não produzia alimentos.”É que todo mundo comenta sobre pão de Mia”. Ela disse que não achou graça nenhuma. Pra falar a verdade, nem eu.

O pessoal do delivery traz tudo pra gente. Esse serviço facilita nossa vida de confinados. Traz tudo, só não traz coisa. O orégano vou ter que batalhar eu mesmo.

Depois de velho, quem diria que ia exercer Medicina Veterinária. Ouvi – foi por acaso – vizinho se queixando de dor na anca, e eu me intrometi e perguntei se tinha cavalgado muito. Eu precisava saber para poder oferecer um diagnóstico seguro. Respondeu que não montava a cavalo. Eu sei – respondi – preciso saber se o senhor transportou alguém no lombo. Em todo caso, receitei boldo quando fosse comer sua alfafa, vamos que fosse o fígado. Outro vizinho se queixava de dor de cabeça e outras queixas correlatas. Não me foi difícil diagnosticar a febre da vaca louca. Receitei porções generosas de feno e milho, o que não mata engorda. A menina do Freitas estava se queixando de enjoos, eu diagnostiquei na lata: Tá prenha. Espero que lembrem de me pagar pelas consultas.

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Militares e olavistas contra Feder

Alas ligadas a Olavo de Carvalho e aos militares no governo pressionam o presidente Jair Bolsonaro a reverter o convite feito ao atual secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, para o Ministério da Educação (MEC). Antes mesmo de ser anunciado oficialmente, Feder já virou alvo do grupo ideológicos e da base bolsonarista nas redes sociais.

Olavistas têm um histórico de sucesso em frituras iniciadas nas redes sociais que terminaram em demissão, como a ex-secretária de Cultura, Regina Duarte, e os ex-ministros Luiz Henrique Mandetta (Saúde) e Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo). Eles chamam a atenção para a ligação dele com o governador João Doria (PSDB) e dizem que a escolha foi feita para agradar empresários e apaziguar a guerra ideológica.

Já os militares foram surpreendidos com o convite do presidente e querem um nome ligado a eles, que acreditam ter mais força política. Passaram a divulgar também incoerências em seu currículo.

Feder é formado em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Seu currículo na plataforma Lattes indica que ele tem um “mestrado em andamento” desde 2002 em Economia pela Universidade de São Paulo (USP). Mas o site da secretaria da educação do Paraná informa que ele é “mestre em Economia”.

Inconsistências no currículo, como uma suspeita de fraude na dissertação no mestrado na FGV e a conclusão de um doutorado desmentido pela Universidade Nacional de Rosário (Argentina), estão entre os fatores que levaram à queda do economista Carlos Alberto Decotelli, que nem chegou a tomar posse.

Contam também pontos contra Feder a suspeita de sonegação fiscal da Multilaser, empresa da qual Feder é sócio. E principalmente da possível ligação com o Centrão, Feder teve o apoio do governador do Paraná, Ratinho Jr (PSD), partido do ex-ministro e ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab.

O ministro das Comunicações, Fábio Faria, também é do PSD. Ao anunciá-lo para o cargo em junho, Bolsonaro disse que se tratava-se de uma escolha pessoal.

Para os militares, Feder é um empresário que quer fazer carreira na política, mas não tem experiência. O secretário do Paraná tem apoio da Fundação Lemann, por exemplo, algo que também incomoda militares.

O nome também não agradou aos evangélicos, cujos líderes no Congresso também têm pressionado o presidente. O mesmo ocorreu com o educador Mozart Neves, que chegou a ser convidado para ser ministro no início do governo Bolsonaro, mas depois o presidente voltou atrás por causa das pressões.

Por outro lado, educadores e entidades elogiam a escolha de Feder, por ele ter experiência na gestão da educação pública.

O Semesp, entidade que reúne universidades particulares de São Paulo, soltou nota dizendo que a indicação “renova as expectativas de que sob sua gestão o MEC consiga superar os difíceis desafios que vêm sendo enfrentados pela educação brasileira” já que ele já teria “manifestado sua inclinação para políticas públicas mais eficientes, consistentes e objetivas e estratégias pedagógicas mais inovadoras”.

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Tempo

Cada louco é um exército, em algum lugar do passado.

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Comparando as digitais

Em 9 de maio, eram 10 mil mortos; hoje são 60 mil. Vamos passear de barco?

Em 9 de maio último, um sábado, Jair Bolsonaro teve uma tarde deliciosa passeando de moto aquática no lago Paranoá, um cartão postal de Brasília. Foi a alternativa a um churrasco para 300 (“ou 3.000”) amigos no Palácio da Alvorada, que ele anunciara fartamente pelos canais oficiais. Diante da grita geral –como promover um churrasco com milhares de brasileiros morrendo pelo coronavírus?–, Bolsonaro cancelou-o e, para variar, acusou a imprensa de tê-lo inventado. “Fake news!!!”, ladrou.

No comando do barco, Bolsonaro acelerou, fez piruetas no lago e encostou a moto numa lancha em que pessoas, não por acaso, faziam um churrasco. Uma sirigaita na lancha trinou, “A gente veio fazer o teu churrasco, cara! Ai, que lindo, cara!”, e recebeu o talkêi do cara para gravar o encontro. Nada como um presidente tão acessível e humano. Perto dali, a Câmara e o Senado decretaram luto com bandeiras a meio mastro e o Supremo emitiu nota de solidariedade às famílias vitimadas pela pandemia.

Naquele dia, o Brasil atingia a triste marca de 10 mil mortos pela Covid-19, número que provocou viva comoção —como podíamos ter chegado a tal ponto? Pois, nesta quarta-feira, 1º de julho, o número passou de 60 mil, e o impacto não parece equivalente.

Talvez já tenhamos nos acostumado a esse placar que, de dez em dez mil mortos, se supera a cada quinzena. Talvez a próxima comoção só se dê na marca dos 100 mil, que, pelos cálculos dos médicos, fatalmente atingiremos. Vamos passear de barco?

Um dia talvez se saiba quantos, dos 50 mil óbitos desde 9 de maio, devem ser debitados a Bolsonaro. E aos governadores e prefeitos que, com a confusão provocada por ele, atreveram-se a abrir seus domínios antes da hora. E se as digitais no cabo das pás que jogaram terra sobre os caixões coincidem com as do volante da moto aquática.

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No sufoco do juramento

MÁRCIA HUÇULAK vai às lágrimas quando fala das vítimas do covid-19 em Curitiba. A secretária da Saúde é séria, compenetrada, profissional e muito humana. Mas devia também chorar pelo prefeito vacilante, incurável e contaminado pelo vírus da reeleição. Márcia sufoca sua revolta no juramento da Enfermagem.

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Bares do Leblon registram pico da curva da estupidez

No primeiro dia da reabertura dos bares no Rio de Janeiro, as imagens de uma multidão compacta na rua Dias Ferreira, uma das mais caras do mais caro bairro do Brasil, o Leblon, levaram cientistas a dizer que o pico da curva da ignorância foi alcançado no país. O pico da curva do egoísmo foi alcançado ao mesmo tempo.

Os bares entraram na onda e serviram drinks de cloroquina e remédio para vermes — este último, um sucesso entre os moradores do bairro. Segundo alguns teólogos, Deus está perdendo uma ótima oportunidade de mostrar que existe.

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O ex-ministro que nunca assumiu

Augusto, o cachorro, na verdade, é Zeus. Maria, que fala ao telefone com Bolsonaro na propaganda do governo, é Célia. A gripezinha, na verdade, é uma pandemia. Wassef não sabia como Queiroz foi parar na casa dele. Wassef, na verdade, sabia como Queiroz foi parar na casa dele. Regina Duarte vai para a Cinemateca. Regina Duarte, na verdade, não vai para a Cinemateca. A cloroquina funciona. A cloroquina, na verdade, não funciona.

Mais perdido que gafanhoto no meio de ciclone bomba, Bolsonaro, sem saber, nos deu a imagem perfeita de seu governo: Carlos Alberto Decotelli. De tanto embaçar os limites de verdade e ficção, Decotelli agora pode incluir em seu currículo um cargo inédito: ex-ministro que nunca assumiu.

É justamente esse limbo do ex-ministro que nunca assumiu que define a política de Bolsonaro até aqui. O recorte de tempo que começa com o anúncio de Decotelli e sua posse interrompida foi recheado de conflitos, atritos, guerras de narrativas. Tudo baseado em informações falsas, distorcidas ou manipuladas. Muito barulho por nada. Ficou dando a impressão de que muita coisa aconteceu. Na verdade, nada aconteceu. E assim caminha seu governo. E assim, na verdade, seu governo não caminha.

Na pandemia, se deixarmos de lado os atritos, as confusões e as guerras de narrativas, o que, de fato, foi feito? A imagem que vai permanecer é o Placar da Vida, criado pela Secom para celebrar o número de curados e ignorar os caminhões de mortos.

É justamente no limbo do conflito inócuo, sem vencedores, que se sustenta a base de apoio. Sem projetos ou ideias, o governo recruta e retém apoiadores pela única virtude que restou: a fidelidade. Um governo enérgico que, na verdade, está imóvel.

Ou então, numa hipótese talvez mais verossímil, talvez estejamos vivendo a realidade da série “Dark”. Atibaia, na verdade, é um grande portal onde as pessoas viajam no tempo. Presente, passado e futuro são uma coisa só. O que está imóvel está também em movimento.

Zeus o cachorro, na verdade, é Laika. Célia, que fala ao telefone com Bolsonaro, é Martha Nielsen. A pandemia, na verdade, é a peste bubônica. Wassef não sabia que Queiroz era um viajante no tempo e espaço. Regina Duarte vai para a Mesopotâmia. A cloroquina, na verdade, é o emplasto Brás Cubas.

Publicado em Renato Terra - Folha de São Paulo | Deixar um comentário
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Bolsonaro “diz que crise está controlada”

“Em conversas com ministros mais próximos no Palácio da Alvorada, Jair Bolsonaro diz que a crise está controlada”, segundo o Estadão.

“A tranquilidade do presidente se ampara na confiança de que quaisquer das investigações em curso não lhe alcançarão pelo menos durante o mandato (…).

No caso Queiroz, a análise é que se, porventura, o ex-assessor envolver o presidente no suposto esquema de ‘rachadinha’, o inquérito deverá ser paralisado. Pela legislação, o chefe do Executivo não pode ser investigado por fatos anteriores ao mandato.”

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Padrelladas

Diário da Pandemia

Tem dias que sou artista. Hoje, por exemplo. Disse aos berros: “Só tenho arroz pra comer”. Vizinho responde: “Olha o cara se exibindo. Tivesse eu arroz”.

Eles chegam todos os dias nos fins de tardes, alegres, felizes. Cantam o parabéns pra você como se alguém entre nós estivesse de aniversário. Finda a festa, não vão embora. Ficam por aí, escondidos em gavetas, misturados às gravatas no guarda-roupas. Chega o fim da tarde, agarram-se a mim, me dizem que precisam de minha companhia, esses bobos.

Nunca sei qual dos sentimentos vestir pela manhã. As esperanças estão rotas. As alegrias, sem sola. Ás vezes não tenho nada para vestir. Vou andar nu pela casa. Ou visto sobre a pele o sentimento misto de medo e horror.

Publicado em Nelson Padrella - Blog do Zé Beto | Com a tag | Deixar um comentário
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