O plano Guedes anunciado hoje como “Plano mais Brasil” reúne um conjunto de medidas que na prática suspendem os direitos sociais e o arranjo federativo previstos na Constituição Federal de 1988. Da mesma forma que o AI-5 suspendeu os direitos políticos e interferiu diretamente no “pacto federativo”, o plano Guedes suspende os direitos sociais e aniquila milhares de municípios.
Em primeiro lugar, ele foi criado para ativar os “gatilhos” previstos na EC 95, que de tão mal redigida, simplesmente tem gatilhos fajutos, já que a formulação do orçamento tem que seguir a imposição do teto de gastos. Esses “gatilhos”, agora acionados no caso de não cumprimento da “regra de ouro” (que não vem sendo cumprida há tempos), visam a promover um enorme arrocho dos gastos públicos, com foco particular no funcionalismo. O mais curioso é que não há diferenciação: o juiz que ganha R$ 40 mil e o professor que ganha R$ 2 mil serão alvo do mesmo arrocho, abrindo-se a possibilidade de redução salarial de até 25%.
Em segundo lugar, o plano “Mais Brasil” acaba de uma vez por todas com a possibilidade de planejamento de longo prazo no Brasil. Ela simplesmente extingue o PPA (Plano Plurianual) e acaba com vinculações, obrigação de gastos e fundos voltados para educação e saúde. Na prática, a EC 95 já havia reduzido, no longo prazo, o financiamento desses serviços públicos. O que o plano Guedes busca é destruir de maneira ainda mais acelerada os serviços públicos universais de educação e saúde, redirecionando estes recursos para o pagamento de juros da dívida pública.
Por fim, depois de proibir gastos, desvincular receitas, raspar o que sobrou dos fundos públicos e desvalorizar o servidor público, Guedes propõe destruir qualquer vínculo de solidariedade entre os entes federados, promovendo uma espécie de “cada um por si” federativo, onde só sobreviverão os estados e municípios ricos. Ele chega ao descalabro de simplesmente “extinguir” milhares de municípios, que se tornarão distritos de municípios maiores e pobres a quilômetros de distância e que já têm seus próprios problemas para resolver.
Nem os pequenos empresários vão escapar, já que o plano prevê uma forte redução das desonerações, que certamente devem atingir o SIMPLES, a folha de salário e até a cesta básica.
Em suma, o plano é a revogação da CF88 no capítulo dos direitos sociais e do pacto federativo. É um descalabro que só poderia surgir de uma mente autoritária, que não sabe o que é o Brasil e quer implementar uma ideologia atrasada que ele aprendeu nas décadas de 60/70. Guedes e Eduardo Bolsonaro tem exatamente isso em comum: sentem saudades do AI-5, cada um à sua forma. O mais assustador é ter gente que acha que AI-5 nos direitos políticos não pode, mas na economia “é o preço a se pagar pela estabilidade”. Já ouviram esse discurso antes?
Professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON-UNICAMP).
O menino de pele branca ainda está lá, embaixo d’água, olhos atentos, cabelo de milho, voz a agradecer a missa que mandamos rezar perto da casa dele, pois pediu para uma colega da escola depois que mergulhou e não voltou. Foi em sua casa que comecei a sair do gueto que nem sabia existir.
Porque acelerei um carrinho na pista no inimaginável autorama montada no quarto – e embarquei no carrinho para sair do cortiço e voar por aí na vida. Foi com ele também que descobri a vaca preta e o hambúrguer, há mais de meio século – e se alguém falar em americanização ou algo parecido, dou uma cabeçada para o nariz sair pela nuca.
Mais tarde, outro colega de classe a se despedir e submergir durante as férias. Respiro em terra firme e lembro dos dois, sempre, aqui.
Quem vai para a internet pedir a cabeça de alguém é tão diferente do hater que diz combater?
Conheço gente que não diz mais o que pensa em redes sociais e até em círculos mais íntimos com medo da reação de familiares, amigos, colegas de trabalho, de seguidores. Não porque tenham opiniões controversas, porque sejam preconceituosos. Mas porque o preço de pensar, questionar, duvidar, trazer o contraditório têm ficado cada vez mais alto. Muita gente já não está disposta a contrair uma dívida, às vezes injusta, que talvez não possa jamais ser paga, de acordo com as regras de convivência estabelecidas por parte de uma sociedade cada vez mais inflexível.
A tolerância em relação às opiniões desapareceu. Com receio dos julgamentos, mas também para ser aceito, admirado, exaltado, percebe-se que os discursos estão cada mais sendo feitos sob medida para agradar uma audiência irascível diante de expectativas que crescem sem parar. O preço que se paga por aplauso, bajulação e um lugar no olimpo das virtudes morais. Ou isso ou o cancelamento compulsório. A moda que começou nos Estados Unidos, nos primórdios do #metoo, tem acertado cada vez mais alvos, mas o efeito prático, que seria transformar a sociedade num lugar mais tolerante, é o oposto.
Não se trata de fechar os olhos para racismo, homofobia, machismo, bullying, discursos de ódio, o problema é quando se apela ao tal cancelamento. Para banir e jogar ao ostracismo o intolerante, o remédio é sempre tão ou mais violento do que a ação que provocou a reação dos que se enxergam como os guardiões da ordem. O que se vê é mais xingamento, massacre, ridicularização, partindo de gente que se julga moralmente superior, mas que se transforma em agente linchador apesar do seu verniz pretensamente intelectual.
Na lista dos “cancelados” pela justiça da internet há de fato racistas, homofóbicos, machistas, maus caracteres, mas há também gente que é só ignorante, burra, inconsequente. E outro punhado que apenas ousa dizer aquilo com o que não concordamos. Exige-se perfeição de pensamento e de atitude. Não significa que as pessoas não sejam passíveis de críticas, mas fica claro que presunção da inocência, direito à defesa, nada disso é garantido nesse tribunal. As pessoas são julgadas, condenadas, “canceladas”, mas em geral o efeito prático é nulo, porque não há espaço para argumentação, discussão, reflexão, que sirvam para que o comportamento das pessoas evolua e mude. Por melhor que seja a intenção, se o resultado é a produção de mais ódio, de sofrimento de outra pessoa, apenas abre-se espaço para que mensagens de preconceito e estupidez sejam amplificadas e encontrem eco em quem se identifica.
Na cultura do cancelamento, por vezes, me vejo com menos ojeriza do broncossauro que falou ou fez uma idiotice qualquer do que pelas pessoas que vestem o manto da pureza intelectual, da defesa dos direitos humanos, mas que na primeira oportunidade se manifestam de forma tão idiota, raivosa, intolerante quanto o ignorante, preconceituoso. Defender e participar de linchamentos virtuais apenas coloca no mesmo patamar agressores e ofendidos. Gente que vai para a internet com hashtag de cancelamento contribui para a barbárie em que vivemos hoje.
Ninguém é tão perfeito e infalível que possa sentir-se à vontade para bancar o inquisidor. Mais do que desejo de justiça, o que move os canceladores é o poder. Quanto mais famoso o cancelado, mais fácil acumular likes e compartilhamentos, ganhar fama instantânea, quase sempre efêmera. Além da ilusão de estar do “lado certo”, de fazer parte de um grupo que, na teoria, é melhor do que os outros, de pertencer a um movimento de limpeza do mundo, de sentir-se engajado, socialmente empoderado, como se fosse possível remover cada indivíduo que não se adequa 100%. Um movimento, muitas vezes, suicida, em que os antagonistas defendem as mesmas bandeiras, ainda que de formas distintas. Feministas esculacham feministas, ativistas de movimentos sociais disputam protagonismo, apoiadores de causas importantes são defenestrados, todos queimando na fogueira da vaidade.
O resultado é que vemos gente que diz combater a cultura do ódio com mais ódio, o que não faz o menor sentido. A pessoa que vai para a internet pedir a cabeça de alguém em nome de uma causa é tão diferente do hater que ela diz combater? Na teoria pode parecer que sim, na prática é apenas um idiota útil a serviço de mais intolerância.
O único aspecto positivo é que estamos mais vigilantes e, sim, o mundo está mudando, mas casos de preconceito que merecem punição devem ser denunciados. Virar persona non grata para um grupinho na internet serve apenas para aplacar a sede de vingança desses que se julgam justiceiros do bem, mas educativo mesmo é diálogo e, quando necessário, ter que acertar as contas na justiça.
Por enquanto o que se vê é a morte da liberdade de expressão e da comunicação. As pessoas falarão cada vez mais para suas bolhas, procurando apenas as palavras mais bonitas, medindo com cuidado o efeito de cada uma delas, para que apenas o que seu interlocutor quer ouvir seja emitido. Ainda prefiro quem diz o que pensa, o diálogo, o diverso, a provocação, o interlocutor interessado e interessante. Sem perceber, vozes que gritam contra a censura têm sido as que mais contribuem para que as pessoas se calem por medo dos julgamentos. E quem fecha a boca e foge de possíveis linchamentos não são os radicais, mas os moderados. E no meio dessa gritaria ninguém mais se ouve.
É claro que o botão do “deixar de seguir” é sempre uma opção para casos perdidos. E, francamente, também temos trabalho suficiente com nossa classe política que nos dá motivos de sobra para que sejam fiscalizados, cobrados, criticados, julgados, ironizados. Ônus da vida pública, de que se espera compromisso com a liturgia dos cargos.
O mundo nunca será esse lugar perfeito, livre de injustiças, de racismo, machismo, homofobia. O que não significa que não podemos lutar todos os dias para que seja um lugar melhor. Mas para isso não podemos escolher as mesmas armas que dizemos querer combater.
Felipe Pena faz um exercício psicanalítico: “Podemos concluir que a acusação freudiana tem um atenuante forte: o presidente é o real e legítimo proprietário da casa 58. Imagine se ele tivesse apenas visitado o lugar, como fez outro presidente em um certo triplex no Guarujá?”
As provas reunidas no inconsciente dos criminosos ainda não são aceitas em tribunais. Embora a psicanálise, assim como a polícia, também realize um trabalho de investigação, as conclusões retiradas de atos-falhos e recalques têm pouco valor para o positivismo dos juízes. Mas vamos pedir vênia aos colegas do direito para fazer um pequeno exercício psicanalítico.
Imagine que a maior emissora de TV do país tivesse acesso aos registros da portaria do condomínio onde mora o assassino de Marielle Franco. Pelos registros, na noite do crime, o homem que dirigiu o carro para o assassino chegou ao condomínio poucas horas antes do homicídio, mas, em vez de se dirigir à casa do comparsa, disse ao porteiro que iria para um vizinho.
Agora vamos elevar a imaginação a níveis surreais. Tente pensar que esse vizinho é o atual presidente da República. Eu sei, é inverossímil, nenhum presidente moraria a dez metros de um assassino. Mas vamos fazer o exercício e supor que, logo após ver a reportagem na TV, o presidente fosse a uma rede social esbravejar contra a emissora. Novamente soa irreal, pois um presidente jamais usaria um veículo extraoficial para responder a esse tipo de notícia. Mas vamos supor que, além de responder, ele ainda tenha cometido um ato-falho passível da mais óbvia interpretação freudiana.
Vamos supor que o presidente da República, sem ser perguntado, tenha dito: “não vão sossegar enquanto não prenderem um filho meu”. Como assim, presidente? Que filho? Ninguém falou em filho algum. O assunto aqui é o registro do porteiro do seu condomínio. O assunto é o anúncio do assassino dizendo que iria à sua casa. De que filho o senhor está falando?
Ainda no campo das suposições, vamos imaginar que um desses filhos more no mesmo condomínio do pai e, diferentemente de seus outros dois irmãos políticos, não tenha imunidade parlamentar. Vamos supor que ele se apresse em revelar, também numa rede social, os registros em áudio da portaria. Pra que isso, garoto? Esses arquivos podem ter sido adulterados? “Podem não, eles foram periciados” – responderia o filho pródigo.
Oi? Periciados por quem? E, com mais um toque de surrealismo, as promotoras do caso aparecem no dia seguinte para dizer que, de acordo com a perícia, o porteiro mentiu. Quanto tempo durou a perícia, doutoras? Vinte e quatro horas, respondem as nobres representantes de MP, uma delas flagrada com a camisa de campanha do presidente em outra rede social. Como a justiça é rápida!
Nesse nível de surrealismo já não seria surpresa se um jornal paulista descobrisse que a perícia não foi realizada com precisão. Mas surreal mesmo, surreal de verdade, surreal nível salvador Dalí seria o próprio presidente da República dizer que teve acesso aos áudios “no dia do assassinato, antes de eles serem adulterados”. Opa! Aí, não. O presidente não confessaria o crime de obstrução à justiça. Até o ato-falho tem limites.
Poderia ser pior. O presidente poderia ser um conhecido apoiador de milicianos, os mesmos que são acusados de matar a vereadora. Um de seus filhos poderia ter empregado parentes desses milicianos em seu gabinete. Poderia até ter condecorado um deles quando era deputado estadual. Não, isso não aconteceria. A psicanálise trabalha com livre associação e, aqui, ela está óbvia demais. Até Freud desconfiaria de tantas evidências.
Só falta dizer que o filho mais novo do presidente namorou a filha do assassino. Ou que o filho vizinho (do pai e do assassino), que também é vereador, havia discutido diversas vezes com a colega assassinada. Isso também é óbvio demais e não prova nada.
Não importa que o filho vereador também seja defensor das milícias. Não importa que o filho vereador tenha um histórico violento. Não importa que o filho vereador tenha usado a gravação de um pedido de Uber como álibi. Afinal, só os acusados precisam de álibis e, até agora, ninguém o acusou. Ou será que Sigmund Freud passaria por cima das próprias desconfianças para apresentar a denúncia?
Como este artigo é apenas um exercício psicanalítico, podemos concluir que a acusação freudiana tem um atenuante forte: o presidente é o real e legítimo proprietário da casa 58. Imagine se ele tivesse apenas visitado o lugar, como fez outro presidente em um certo triplex no Guarujá?
A esta altura, presidente e filho vereador já teriam sido condenados a 13 anos e meio de prisão pelo atual ministro da justiça. Tão surreal que nem Freud se atreveria a explicar.
O PRESIDENTE da Funarte não esquentou a cadeira, como no geral acontece no governo Bolsonaro. Como todos os defenestrados, sai atirando com a pistolinha de ar comprimido. A queixa do cara da Funarte, cujo nome não importa, ficará no rodapé do rodapé: “Nunca fui recebido pelo presidente”.
A queixa é sugestiva dos homens e do momento desses homens. Como os outros homens do presidente (título do livro sobre Watergate), o cara da Funarte entrou no governo esperando o quê, um amante das artes? Bolsonaro não chega aos pés de Pedro Malasartes.
Ser recebido pelo presidente para elogiar Regina Duarte e ofender Fernanda Montenegro? Ora, bolas. Quem entra no governo Bolsonaro tem que levar pancada, ouvir besteira, discutir a terra plana e a santidade do coronel Brilhante Ustra e a virtude saneadora da tortura.
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi sorteado nesta segunda-feira (4) relator de uma notícia-crime apresentada por um grupo de 18 parlamentares – do PSOL, PDT, PC do B, PSB, Rede e PT – contra o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Os deputados e senadores acionaram o Supremo depois de Eduardo sugerir, em entrevista à jornalista Leda Nagle, um novo “AI-5” em caso de radicalização da esquerda. As informações são de Rafael Moraes Moura no Estadão.
Para os parlamentares, a declaração de Eduardo Bolsonaro é “extremamente grave e atenta contra a Constituição”. O grupo acusa o filho do presidente da República de praticar incitação e apologia de crime, além de improbidade administrativa.
Na última quinta-feira, 31, o Estado/Broadcast antecipou que a cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) avalia que a fala de Eduardo está protegida pela imunidade parlamentar, sendo uma “simples opinião”.
O Ato Institucional nº 5 foi o mais duro instituído pela ditadura militar, em 1968, ao revogar direitos fundamentais e delegar ao presidente da República o direito de cassar mandatos de parlamentares, intervir nos municípios e Estados. Também suspendeu quaisquer garantias constitucionais, como o direito a habeas corpus, e instalou a censura nas redações. A partir da medida, a repressão do regime militar recrudesceu.
A menção ao Ato Institucional n.º 5 causou forte reação nos três Poderes, a ponto de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), dizer que a apologia à ditadura era passível de punição. Horas depois, o presidente Jair Bolsonaro, pai de Eduardo, desautorizou o filho, sob o argumento de que quem fala em AI-5 só pode estar “sonhando”.
Repercussão. Relator do caso no Supremo, o ministro Gilmar Mendes se manifestou sobre o episódio em sua conta pessoal no Twitter, na semana passada.
“O AI-5 impôs a perda de mandatos de congressistas, a suspensão dos direitos civis e políticos e o esvaziamento do habeas corpus. É o símbolo maior da tortura institucionalizada. Exaltar o período de trevas da ditadura é desmerecer a estatura constitucional da nossa democracia”, escreveu Gilmar no Twitter.
Gilmar foi o segundo ministro do Supremo que se posicionou publicamente sobre a declaração de Eduardo Bolsonaro. Na última quinta (31), o ministro Marco Aurélio Mello considerou uma “impropriedade” a sugestão do parlamentar. “Quanta impropriedade. Estão solapando a democracia”, disse Marco Aurélio ao Estado.
Enquanto a mancha se desloca para o Sul e ameaça Abrolhos, já não sei mais se a espero no Rio ou vou ao seu encontro. De qualquer forma, tento manter o foco no desastre ambiental enquanto as loucuras na política se desdobram num ritmo vertiginoso.
Pensei em refletir sobre a nova geração de políticos e como a linguagem da infância ainda está presente no seu imaginário.
Mudei de eixo à tarde. Vi imagens do depoimento de Alexandre Frota na CPI das Fake News. Ele exibiu cartazes com frases do guru dos Bolsonaro, Olavo de Carvalho. Era tão escandaloso que fiquei tentado a examinar o avanço da linguagem pornográfica no discurso da extrema direita.
Foi então que vi aquele vídeo da hienas cercando o leão Bolsonaro e pensei em voltar ao universo infantil. Não houve tempo. Eduardo Bolsonaro invocou o AI-5, numa entrevista a Leda Nagle. Voltei aos anos 60 e pensei até em mostrar como as coisas mudaram nesse quase meio século. Desisti desse esforço pedagógico. As pessoas que confundem épocas tão díspares não o fazem por ignorância, mas por necessidade. Constroem um enredo mental para o papel que amariam representar. No caso de Eduardo Bolsonaro, é a vontade de reviver a ditadura, com poder absoluto sobre a vida e a liberdade de expressão dos outros.
Em certas viagens a Ouro Preto, fantasio uma volta ao século XVIII. Mas só por alguns momentos, quando não há carros nem buzina.
Há tempos, quando Ronnie Lessa, acusado de matar Marielle Franco, foi preso, achei explosivo o fato de ser vizinho do homem que se tornou presidente da República. Imaginei como isso não daria um roteiro para uma série de televisão. Li que o filho mais novo do presidente namorava a filha do matador. Imaginei as possibilidades clássicas dessa história.
Vejo surgir agora um novo personagem dramático: o porteiro do condomínio Vivendas da Barra. Ele é o mais antigo dos funcionários, deve conhecer todos os moradores, seus hábitos e relações superficiais. Sua lembrança do dia da morte de Marielle Franco enriqueceu as fantasias sobre a vizinhança de Bolsonaro com Ronnie Lessa, miliciano, matador e comerciante de armas.
Será que o porteiro realmente viu um dos assassinos procurando por Bolsonaro, que nesse dia estava em Brasília? Por que teria anotado o número da casa buscada pelo cúmplice do matador como se fosse a casa de Bolsonaro? Como pode ter ouvido a voz de seu Jair, sem estar sintonizado com o canal da Câmara dos Deputados, onde Bolsonaro estava naquele momento?
Não vou especular sobre esse mistério, enquanto não ouvir a versão do próprio porteiro. As procuradoras do MP do Rio dizem que ele provavelmente mentiu.
Mas por que um velho e experiente porteiro confundiu duas casas? Para nós que vemos imagens aéreas, elas são todas iguais. Somos traídos pela superficialidade de nossa percepção, como os esnobes que dizem que a caatinga é monótona porque toda a vegetação é igual.
Para ele, certamente cada uma delas tem uma história, desde o tipo de visitas aos pequenos cuidados cotidianos, instalação elétrica, vazamentos, no sentido literal.
Não entendo como pode ter confundido. Mentiu e enganou? Foi induzido? Sua memória funciona bem ou já dá sinais cotidianos de pequenas confusões? Para um roteirista, é relativamente fácil cobrir essas lacunas. Para mim, no entanto, os tempos são desconcertantes. Volto a perseguir a mancha. Também é desconcertante. Mas pelo menos vejo pessoas reais, com as luvas negras de óleo, tentando limpar as praias, proteger corais e mangues.
Deputados deveriam enfrentar o clã Bolsonaro e cassar o 03
A Câmara deve cassar o deputado Eduardo Bolsonaro por suas declarações sobre o AI-5? Pessoalmente, penso que sim, mas é preciso qualificar essa resposta.
O primeiro ponto é a liberdade de expressão. Sim, o filho trinigênito deu uma opinião, esdrúxula e democraticida, mas, ainda assim, uma opinião. Ele está, a meu ver, coberto pela garantia de inviolabilidade dos parlamentares “por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”, como estabelece o artigo 53 da Constituição.
No que, porém, consiste essa inviolabilidade? O próprio artigo 53 esclarece que deputados e senadores são imunes a processos nas esferas penal e civil. Ela não os protege contra as consequências políticas de suas palavras, o que nem estaria ao alcance da Carta fazer.
E entre os efeitos políticos possíveis de opiniões disparatadas estão os processos disciplinares por quebra de decoro parlamentar, puníveis com a perda do mandato, nos termos do art. 55 da Constituição. O regimento interno da Câmara e um punhado de resoluções da Casa determinam que todo deputado tem o dever de zelar pelo “prestígio, aprimoramento e valorização das instituições democráticas e representativas” e que deixar de fazê-lo atenta contra o decoro.
Pode-se argumentar que esse é um tipo demasiadamente subjetivo, um pequeno AI-5, que a maioria pode usar contra um parlamentar mais ousado. Pode ser, mas esse gênero de dispositivo é comum em códigos profissionais e se inscreve bem no sistema de freios e contrapesos que caracteriza as democracias. Se um parlamentar apresenta uma opinião tão chocante que faça a maioria absoluta de seus colegas superar o espírito de corpo e puni-lo, é porque ele de fato extrapolou.
Não creio que os deputados terão a coragem de enfrentar o clã Bolsonaro e cassar o 03, mas deveriam. Eduardo é reincidente na matéria, e as instituições precisariam deixar muito claro que reagirão a ataques.
Sandrine Herman – Sandrine Faure-Herman – diretora da coleção Surda de Olho e Mão, atriz francesa. Apresentou em linguagem de sinais o documentário Sou Surda e Não Sabia, dirigido por Igor Ochronowicz, 2009, França. Grosby Group
O DONO dos Supermercados Condor suspendeu a publicidade nas afiliadas da Globo, seguindo a recomendação do Duce Jair. O dono da rede Condor é aquele que na campanha presidencial teve que roer a corda quando a justiça eleitoral ameaçou puni-lo quando fez como o dono da Havan, ao tentar exigir dos funcionários voto no Duce Jair.
Mais um motivo para mudar para o Festval, a rede inteligente de Cascavel, que reduziu o Condor às ofertas de materiais de limpeza e aos hortigranjeiros das quintas. O Festval faria a alegria ao ex-quase-futuro embaixador Bolsonaro, filho do Duce Jair. Não fica nada a dever ao melhor supermercado dos EUA. Sem as bolsocretinices de Condor e Havan.
Naquela Copa do 7 a 1, a FIFA criou um país dentro do Brasil. Exemplo: nos estádios de futebol e nos arredores, a jurisdição brasileira não se aplicava ou valia pela metade. Será que hoje em dia, dentro das chamadas arenas vale o Código de Defesa do Consumidor?
Ontem, o consumidor torcedor que foi à Arena da Baixada teve vários de seus direitos do consumidor desrespeitados. É uma constante em todos os estádios brasileiros.
O pacote de pipoca foi cortado pela metade e o preço continuou o mesmo, ou seja, houve o aumento maquiado de 50% (cinquenta por cento) com reajuste no preço final de R$4,00. Multiplique-se isto por milhares de consumidores.
Determinados produtos eram vendidos pelos caixas, mas quando o consumidor se dirigia nas lojas, era informado que não havia mais. O torcedor voltava para o caixa e tinha que esperar um “supervisor” por quinze minutos ou mais e depois preencher um longo formulário para ter seu dinheiro devolvido. Um expediente malicioso para dissuadir o torcedor da exigência da devolução.
Venda casada dentro dos estádios é a prática recorrente, pois o torcedor consumidor não pode entrar portando pacote de pipoca, sanduíche ou copo plástico contendo cerveja ou água mineral. Obriga-se a consumir o que vendem ali dentro.
A promoção ao final do jogo de 50% (cinquenta por cento) de desconto também é outra irregularidade. O consumidor compra o ticket pagando preço integral e ao final não leva dois sanduíches em promoção. Adivinhe as razões dessas promoções.
Determinadas bebidas são ofertadas a preço único, mas no decorrer da temporada, ou conforme o jogo, são excluídas por outras de qualidade diversa das ofertadas.
Não há nenhuma liberdade de escolha de produtos por imposição monopolista da cesta de produtos ofertados.
A FIFA, a CBF e as Federações estaduais são um mundo jurídico à parte do Brasil. Impõem regras próprias, beneficiam determinados times pela distribuição das verbas de televisão. A Rede Globo (sempre ela), tem seus times de preferência no eixo Rio-São Paulo e manda e desmanda nos horários dos jogos, forçando uma grande diferença nos patrocínios de um campeonato, normalmente, com alta probabilidade de se conhecer, antecipadamente, os vencedores, sempre os mesmos. Os calendários são extenuantes e isso se resume numa coisa: não há profissionalismo.
O patrocínio das empresas públicas e bancos públicos é outra caixa preta que assola o futebol brasileiro. O sistema empresarial dos jogadores conta com bancas internacionais e contas em paraísos fiscais. O estatuto do torcedor é outra quimera, para inglês ver.
O modelo FIFA retirou a população dos estádios de futebol com a supressão das gerais. O Estádio do Maracanã é o símbolo de tudo isto.
Nossos craques vão para o exterior e não temos um mercado de futebol para concorrer com o mundo civilizado.
Ainda não tivemos uma investigação profunda neste estado de coisas – e nunca a teremos. O grande negócio do Futebol, no Brasil, prevalece a “regra de Gerson”: temos que levar vantagem em tudo, certo?
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