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Theatro 4 de Setembro, Praça D. Pedro II, Peresina, Piauí. Foto do cartunista que vos digita, em algum lugar do passado.

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Padrelladas

Lembro-me que não nos odiávamos quando de tratava de política. Havia raivas, debates e volta e meia o senador Arnon (pai do Collor) matava a tiros um senador. Era a exceção à regra. Discutia-se Política, as pessoas se interessavam pelos rumos do país. Em que exato momento toda a decência desceu pelo ralo e passamos a nos odiar como se fôssemos cães de rua? Quem alimenta em nós um ódio que não é nosso, que nos foi imposto, e que acabará deixando sequelas na sociedade brasileira? São perguntas retóricas.

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Dirceu reencontra Lula e diz que luta agora é retomar o governo

Ex-ministro afirma que, para voltar ao poder, PT precisa deixar claro que é de esquerda e socialista

O ex-ministro José Dirceu se reencontrou com Lula na noite de sexta (8), em Curitiba, pouco depois de os dois saírem da prisão. Os petistas foram a uma festa organizada para o ex-presidente na capital do Paraná, no apartamento de um amigo no bairro Batel.

Além de posarem para fotos, Dirceu gravou um vídeo ao lado do vice-presidente do PT, o deputado estadual Emídio de Souza (PT-SP), que o apresentou como “grande companheiro, nosso comandante José Dirceu, que também saiu da prisão graças à decisão tomada ontem [quinta, 7] pelo STF”.

Dirceu agradece aos militante do PT pela solidariedade e afirma que é preciso trocar a bandeira “Lula livre” pela da retomada do poder, deixando claro que eles defendem o socialismo.

“Eu estava na trincheira da prisão. Agora estou aqui de novo na trincheira da luta. Agora não é [a] do Lula livre. Agora é para nós voltarmos e retomarmos o governo do Brasil”, afirma o ex-ministro. “E para isso nós precisamos deixar claro que nós somos petistas, de esquerda e socialistas. Nós somos tudo o contrário do que esse governo está fazendo. Uma boa noite para vocês, viu.” ta falou em “safadeza” e “canalhice” do que chamou de “lado podre” do Ministério Público Federal, da Polícia Federal, da Justiça e da Receita Federal. Setores que, segundo ele, trabalharam para criminalizar a esquerda, o PT e o próprio Lula.

A soltura do ex-presidente ocorreu um dia após o Supremo Tribunal Federal ter decidido, por 6 votos a 5, que um condenado só pode ser preso após o trânsito em julgado (o fim dos recursos). Isso alterou a jurisprudência que, desde 2016, tem permitido a prisão logo após a condenação em segunda instância.

A decisão do Supremo, uma das mais esperadas dos últimos anos, tem potencial de beneficiar cerca de 5.000 presos, segundo o CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O Brasil tem, no total, aproximadamente 800 mil presos.

Em discurso duro de 16 minutos ao sair, o petista falou em “safadeza” e “canalhice” do que chamou de “lado podre” do Ministério Público Federal, da Polícia Federal, da Justiça e da Receita Federal. Setores que, segundo ele, trabalharam para criminalizar a esquerda, o PT e o próprio Lula.

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JAIR BOLSONARO conseguiu aumentar a audiência da Rede Globo depois de xingá-la em rede social. A Globo aumentaria ainda mais sua audiência se liberasse ao presidente os 10 minutos que ele quer para se defender. O Brasil teria finalmente aquilo que seria fundamental durante a campanha: Bolsonaro a cuspir fogo, revelando sua qualificação e preparo para a presidência da República. Até a Havan e os Supermercados Condor comprariam espaço de publicidade.

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A República do Major Parsifal

Vem aí profundas alterações constitucionais. Alguns juristas dizem que são mutações constitucionais.

Mutações são alterações na Constituição, sem que nos apercebamos. Um exemplo, fácil de entender, é do parente que vem passar apenas um final de semana em sua casa e acaba ficando por uma década.

O major Parsifal comanda o processo desta nova Constituinte, ele é um homem de grande sapiência e de alto valor.

Parsifal entende que a vontade do povo está plenamente de acordo, basta consultarmos as redes sociais.

O major é casado com a distinta Filó. Eles creem na refundação da República, parecida com aquela que Deodoro implantou após a monarquia.

Aliás pensam em varrer as inverdades que foram contadas pelos livros de história sobre alguns amiguinhos do “Fal”, como é chamado carinhosamente por seus filhos, que são a cara do pai, esculpidos e encarnados.

Neste momento, sua esposa Filó está em Miami fazendo comprinhas de Natal, mas já recebeu um “zapzap” avisando-a das novidades.

Filó nasceu num pequeno município que poderá ser extinto, mas seguirá em frente, se acostumará com a nova cidade que até pode mudar de nome para Filó City.

O “Fal” está preocupado com as reações populares, mas nada que um velho e bom AI 5 não resolva. Depois é claro, algumas manifestações nas redes sociais e estará tudo resolvido.

Enquanto isso, o Supremo Tribunal Federal, que o ex-ministro Sepúlveda Pertence chama de onze ilhas isoladas, aguarda o recesso do fim de ano para as merecidas férias.

O povo se manifestar é apenas um detalhe, a previdência que o diga, mais de 75 milhões de afetados e ninguém foi consultado e nem será.

Os bancos homenageiam Parsifal neste Natal. O Futebol, os feriados do fim de ano e o Carnaval resolverão isto tudo.

Publicado em Claudio Henrique de Castro | Deixar um comentário
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Quem tem pena de Joice?

Ela é apenas vítima do machismo denunciado diariamente pelo feminismo, que despreza

Compreensível que parlamentares da oposição e críticos de Joice Hasselmann tenham se comovido e manifestado apoio após sua emocionada fala na tribuna da Câmara, em que denuncia a perseguição da qual tem sido vítima. 

É a reação natural. Qualquer pessoa minimante civilizada sente asco ao se deparar com ataques covardes e comportamentos animalescos, como o que temos visto a rodo na era da “nova política”. Compartilho do sentimento de horror ao linchamento que a deputada tem recebido, mas não consegui ficar tocada ao vê-la chorar, fragilizada, apesar de dizer que as lágrimas eram por seus filhos, afinal é “guerreira”.

Causou-me incômodo não sentir a empatia que esperava, apesar de repudiar tal situação. Fácil apiedar-nos dos filhos. A agressividade direcionada a Joice respinga ao redor, e ninguém quer ver a mãe achincalhada, vinculada a apelidos caricatos e a imagens grotescas.

Ao contrário do que tenho lido, Joice não está colhendo o que plantou, é apenas vítima do machismo denunciado diariamente pelo feminismo, que ela despreza e considera “cafona”. Não é uma revanche divina por ter, no passado, tratado outras mulheres com a mesma moeda. “Hei pessoal, a vaca da Dilma engorda. Espia Brasil”, tuitou em 2016, lembra-se? Não se trata de castigo, é apenas como a banda toca numa sociedade machista.

É obvio que ninguém, nem a própria Joice, merece ser tratado da mesma forma abjeta com que ela se direciona a adversários políticos, críticos e imprensa, mas é difícil acreditar na sinceridade daquelas lágrimas. A deputada usou e abusou da retórica bolsonarista durante sua campanha e depois de eleita.

Ataques, intimidação, deboche, xingamentos, fake news. De olho na Prefeitura de São Paulo, vale tudo, inclusive chorar em público e culpar o machismo por seu revés entre bolsonaristas. Lamento e condeno o linchamento. Minha sororidade fica por aqui.

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Playboy – Anos 70

1971|Liv Lindeland. PlayCenterfold

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A indignação dos injustiçados

Os nobres deputados da ínclita Assembleia Legislativa do Paraná estão indignados com a RPC – Rede Paranaense de Comunicação, braço paranaense da Rede Globo de Televisão. E o que teria feito o pessoal da RPC para indignar suas excelências? Ora, teve o desplante de informar o distinto público que os eminentes parlamentares estavam recebendo verba de alimentação – paga, claro, com o nosso dinheiro –, ainda que morem e desempenhem suas funções nesta Capital.

Quer dizer, a rapaziada do jornalismo da RPC exerceu a sua atividade e cumpriu o seu dever, noticiando o que está sendo feito com o dinheiro do contribuinte, e isso melindrou os representantes da patuleia?!

Onze dos dignos deputados, incluindo o presidente “da Casa” – como gostam de sublinhar –, manifestaram o seu “repúdio”, taxando a cobertura da RPC/Globo de “sensacionalista e tendenciosa”. E elegeram o deputado Homero Marchese como traidor da classe por estar subsidiando a escandalosa emissora.

O primeiro-secretário – o plurivalente Luiz Carlos Romanelli, que já serviu Requião, Beto Richa e Ratinho Jr. – desceu do pedestal e subiu à tribuna não apenas para criticar a cobertura da Globo, mas também acusar Marchese de autopromoção, “enxovalhando os colegas”, ao tentar dar substância à “matéria tendenciosa da RPC”. Teve o imediato apoio de próceres como os deputados Do Carmo, Hussein Bakri, Galo, Douglas Fabrício, Mauro Moraes, Anibelli Neto, Michele Caputo e Soldado Fruet – da nata parlamentar.

Ninguém, no entanto, foi capaz de desmentir o pagamento e o recebimento do mino. O presidente do Legislativo, Ademar Traiano, garante que o benefício é permitido no Regimento Interno “da Casa”, mesmo que o parlamentar resida na cidade em que o gasto foi realizado, e teoriza sobre o direito ao pagamento de diárias. É incapaz de atentar, porém, que a diária, no serviço público, é definida como uma modalidade de indenização, que pode ser recebida pelo servidor (agente político é servidor público?) em pecúnia, quando se deslocar a serviço e de forma eventual, do local de exercício de sua atividade para outra localidade. Não parece ser o caso.

Tanto é que o Ministério Público entrou em campo para exigir regras mais rígidas e transparentes para o benefício. A Mesa Executiva da Assembleia formulou um projeto de resolução com o propósito de atender a recomendação da Procuradoria da Justiça. Mas os novos controles, ao que tudo indica, não são suficientemente rigorosos – e foi isso que disse a RPC, fazendo com que os nobres deputados sentissem-se injustiçados.

Com todo o respeito a tão augustas figuras, a RPCTV não foi tendenciosa e muito menos sensacionalista. Foi, se me permitem os coleguinhas do Alto das Mercês, incompleta. Fez o trabalho pela metade. A reportagem deveria ter arrolado todo o festival de verbas que os nossos prendados legisladores recebem a título de remuneração mensal, além do salário (em torno de R$ 29 mil), como gastos com funcionários comissionados de gabinete e cotas parlamentares para despesas com correio, passagens, consultorias, gráfica, locação de veículos, restaurantes, etc. A coisa passa de 100 pilas, rigorosamente repassados mensalmente pelo erário a suas excelências. É de se verificar se lá não tem também aquele auxílio-moradia difundido pelo Judiciário e estendido ao colendo Tribunal de Contas.

É certo que há quem ache isso tudo pouco. O deputado Luiz Carlos Martins, por exemplo – lembram-se dele? –, veio a público, outro dia, para reclamar do salário que passou a ganhar como parlamentar. Argumentou que não paga “metade de um carro popular”. Ele, que, além de deputado, é empresário no ramo da comunicação e está em seu sétimo mandato na Assembleia, garante que, antigamente, ia a uma concessionária e comprava um carro zero da melhor qualidade.

Não é de dar dó?

Ademais, além de a afiliada RPCTV fustigar os desafortunados deputados, a matriz carioca revelou, ontem, no principal jornal da rede, a existência no país de mais de 13,5 milhões de brasileiros vivendo na pobreza absoluta, com rendimento mensal que não passa de R$ 300…

Em vez de reclamar, chorem, excelências! Isso lhes fará bem.

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Dedina Bernardelli

© Jorge Bispo

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ESSE MINISTRO, o Guedes, caiu do céu. Não por acaso recebeu o apelido de posto ipiranga do presidente da República. Em 130 anos de república ninguém sacou que tem municípios demais no Brasil, que funcionários públicos não devem ter estabilidade e aqueles que são militantes de partidos políticos menos ainda.

Ministros e mais ministros, presidentes que se sucedem, todos se proclamando salvadores da pátria, e nada se resolve, a crise diminui, aumenta, mas nunca desaparece. Agora, com as reformas propostas pelo ministro Paulo Guedes, o Brasil encontra o fim do túnel, afasta-se do precipício do qual há séculos está a um passo.

O que aconteceu? Simples, um milagre, como os da Bíblia. A solução veio pelas mãos do Messias, o verdadeiro messias, não o auto intitulado e enjaulado, o presidiário messias. Nosso Messias tem mais pressa que o da Bíblia, sem prazo para surgir para os judeus nem para ressurgir para os cristãos.

Nosso Messias chegou segundos antes do juízo final. Só tem um probleminha, merrequinha, em que o Messias, Jair Messias, e seu apóstolo Paulo, o Guedes, não igualam o messias dos cristãos: a multiplicação dos pães e dos peixes. O messias e o apóstolo multiplicam para os empanturrados e diminuem para os que têm fome.

Tem mais aquele pequeno detalhe, de que os justos herdarão a terra. Na terra de Messias, o Jair, e de Paulo, o Guedes, os injustos herdam as terras – devolutas, indígenas, públicas.

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Plano Guedes é um ‘AI-5 econômico’

O plano Guedes anunciado hoje como “Plano mais Brasil” reúne um conjunto de medidas que na prática suspendem os direitos sociais e o arranjo federativo previstos na Constituição Federal de 1988. Da mesma forma que o AI-5 suspendeu os direitos políticos e interferiu diretamente no “pacto federativo”, o plano Guedes suspende os direitos sociais e aniquila milhares de municípios.

Em primeiro lugar, ele foi criado para ativar os “gatilhos” previstos na EC 95, que de tão mal redigida, simplesmente tem gatilhos fajutos, já que a formulação do orçamento tem que seguir a imposição do teto de gastos. Esses “gatilhos”, agora acionados no caso de não cumprimento da “regra de ouro” (que não vem sendo cumprida há tempos), visam a promover um enorme arrocho dos gastos públicos, com foco particular no funcionalismo. O mais curioso é que não há diferenciação: o juiz que ganha R$ 40 mil e o professor que ganha R$ 2 mil serão alvo do mesmo arrocho, abrindo-se a possibilidade de redução salarial de até 25%.

Em segundo lugar, o plano “Mais Brasil” acaba de uma vez por todas com a possibilidade de planejamento de longo prazo no Brasil. Ela simplesmente extingue o PPA (Plano Plurianual) e acaba com vinculações, obrigação de gastos e fundos voltados para educação e saúde. Na prática, a EC 95 já havia reduzido, no longo prazo, o financiamento desses serviços públicos. O que o plano Guedes busca é destruir de maneira ainda mais acelerada os serviços públicos universais de educação e saúde, redirecionando estes recursos para o pagamento de juros da dívida pública.

Por fim, depois de proibir gastos, desvincular receitas, raspar o que sobrou dos fundos públicos e desvalorizar o servidor público, Guedes propõe destruir qualquer vínculo de solidariedade entre os entes federados, promovendo uma espécie de “cada um por si” federativo, onde só sobreviverão os estados e municípios ricos. Ele chega ao descalabro de simplesmente “extinguir” milhares de municípios, que se tornarão distritos de municípios maiores e pobres a quilômetros de distância e que já têm seus próprios problemas para resolver.

Nem os pequenos empresários vão escapar, já que o plano prevê uma forte redução das desonerações, que certamente devem atingir o SIMPLES, a folha de salário e até a cesta básica.

Em suma, o plano é a revogação da CF88 no capítulo dos direitos sociais e do pacto federativo. É um descalabro que só poderia surgir de uma mente autoritária, que não sabe o que é o Brasil e quer implementar uma ideologia atrasada que ele aprendeu nas décadas de 60/70. Guedes e Eduardo Bolsonaro tem exatamente isso em comum: sentem saudades do AI-5, cada um à sua forma. O mais assustador é ter gente que acha que AI-5 nos direitos políticos não pode, mas na economia “é o preço a se pagar pela estabilidade”. Já ouviram esse discurso antes?

Professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON-UNICAMP).

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Zé da Silva

O menino de pele branca ainda está lá, embaixo d’água, olhos atentos, cabelo de milho, voz a agradecer a missa que mandamos rezar perto da casa dele, pois pediu para uma colega da escola depois que mergulhou e não voltou. Foi em sua casa que comecei a sair do gueto que nem sabia existir.

Porque acelerei um carrinho na pista no inimaginável autorama montada no quarto – e embarquei no carrinho para sair do cortiço e voar por aí na vida. Foi com ele também que descobri a vaca preta e o hambúrguer, há mais de meio século – e se alguém falar em americanização ou algo parecido, dou uma cabeçada para o nariz sair pela nuca.

Mais tarde, outro colega de classe a se despedir e submergir durante as férias. Respiro em terra firme e lembro dos dois, sempre, aqui.

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Cultura do cancelamento é barbárie ineficaz

Quem vai para a internet pedir a cabeça de alguém é tão diferente do hater que diz combater?

Conheço gente que não diz mais o que pensa em redes sociais e até em círculos mais íntimos com medo da reação de familiares, amigos, colegas de trabalho, de seguidores. Não porque tenham opiniões controversas, porque sejam preconceituosos. Mas porque o preço de pensar, questionar, duvidar, trazer o contraditório têm ficado cada vez mais alto. Muita gente já não está disposta a contrair uma dívida, às vezes injusta, que talvez não possa jamais ser paga, de acordo com as regras de convivência estabelecidas por parte de uma sociedade cada vez mais inflexível.

A tolerância em relação às opiniões desapareceu. Com receio dos julgamentos, mas também para ser aceito, admirado, exaltado, percebe-se que os discursos estão cada mais sendo feitos sob medida para agradar uma audiência irascível diante de expectativas que crescem sem parar. O preço que se paga por aplauso, bajulação e um lugar no olimpo das virtudes morais. Ou isso ou o cancelamento compulsório. A moda que começou nos Estados Unidos, nos primórdios do #metoo, tem acertado cada vez mais alvos, mas o efeito prático, que seria transformar a sociedade num lugar mais tolerante, é o oposto.

Não se trata de fechar os olhos para racismohomofobiamachismobullying, discursos de ódio, o problema é quando se apela ao tal cancelamento. Para banir e jogar ao ostracismo o intolerante, o remédio é sempre tão ou mais violento do que a ação que provocou a reação dos que se enxergam como os guardiões da ordem. O que se vê é mais xingamento, massacre, ridicularização, partindo de gente que se julga moralmente superior, mas que se transforma em agente linchador apesar do seu verniz pretensamente intelectual.

Na lista dos “cancelados” pela justiça da internet há de fato racistas, homofóbicos, machistas, maus caracteres, mas há também gente que é só ignorante, burra, inconsequente. E outro punhado que apenas ousa dizer aquilo com o que não concordamos. Exige-se perfeição de pensamento e de atitude. Não significa que as pessoas não sejam passíveis de críticas, mas fica claro que presunção da inocência, direito à defesa, nada disso é garantido nesse tribunal. As pessoas são julgadas, condenadas, “canceladas”, mas em geral o efeito prático é nulo, porque não há espaço para argumentação, discussão, reflexão, que sirvam para que o comportamento das pessoas evolua e mude. Por melhor que seja a intenção, se o resultado é a produção de mais ódio, de sofrimento de outra pessoa, apenas abre-se espaço para que mensagens de preconceito e estupidez sejam amplificadas e encontrem eco em quem se identifica.

Na cultura do cancelamento, por vezes, me vejo com menos ojeriza do broncossauro que falou ou fez uma idiotice qualquer do que pelas pessoas que vestem o manto da pureza intelectual, da defesa dos direitos humanos, mas que na primeira oportunidade se manifestam de forma tão idiota, raivosa, intolerante quanto o ignorante, preconceituoso. Defender e participar de linchamentos virtuais apenas coloca no mesmo patamar agressores e ofendidos. Gente que vai para a internet com hashtag de cancelamento contribui para a barbárie em que vivemos hoje.

Ninguém é tão perfeito e infalível que possa sentir-se à vontade para bancar o inquisidor. Mais do que desejo de justiça, o que move os canceladores é o poder. Quanto mais famoso o cancelado, mais fácil acumular likes e compartilhamentos, ganhar fama instantânea, quase sempre efêmera. Além da ilusão de estar do “lado certo”, de fazer parte de um grupo que, na teoria, é melhor do que os outros, de pertencer a um movimento de limpeza do mundo, de sentir-se engajado, socialmente empoderado, como se fosse possível remover cada indivíduo que não se adequa 100%. Um movimento, muitas vezes, suicida, em que os antagonistas defendem as mesmas bandeiras, ainda que de formas distintas. Feministas esculacham feministas, ativistas de movimentos sociais disputam protagonismo, apoiadores de causas importantes são defenestrados, todos queimando na fogueira da vaidade.

O resultado é que vemos gente que diz combater a cultura do ódio com mais ódio, o que não faz o menor sentido. A pessoa que vai para a internet pedir a cabeça de alguém em nome de uma causa é tão diferente do hater que ela diz combater? Na teoria pode parecer que sim, na prática é apenas um idiota útil a serviço de mais intolerância.

O único aspecto positivo é que estamos mais vigilantes e, sim, o mundo está mudando, mas casos de preconceito que merecem punição devem ser denunciados. Virar persona non grata para um grupinho na internet serve apenas para aplacar a sede de vingança desses que se julgam justiceiros do bem, mas educativo mesmo é diálogo e, quando necessário, ter que acertar as contas na justiça.

Por enquanto o que se vê é a morte da liberdade de expressão e da comunicação. As pessoas falarão cada vez mais para suas bolhas, procurando apenas as palavras mais bonitas, medindo com cuidado o efeito de cada uma delas, para que apenas o que seu interlocutor quer ouvir seja emitido. Ainda prefiro quem diz o que pensa, o diálogo, o diverso, a provocação, o interlocutor interessado e interessante. Sem perceber, vozes que gritam contra a censura têm sido as que mais contribuem para que as pessoas se calem por medo dos julgamentos. E quem fecha a boca e foge de possíveis linchamentos não são os radicais, mas os moderados. E no meio dessa gritaria ninguém mais se ouve.

É claro que o botão do “deixar de seguir” é sempre uma opção para casos perdidos. E, francamente, também temos trabalho suficiente com nossa classe política que nos dá motivos de sobra para que sejam fiscalizados, cobrados, criticados, julgados, ironizados. Ônus da vida pública, de que se espera compromisso com a liturgia dos cargos.

O mundo nunca será esse lugar perfeito, livre de injustiças, de racismo, machismo, homofobia. O que não significa que não podemos lutar todos os dias para que seja um lugar melhor. Mas para isso não podemos escolher as mesmas armas que dizemos querer combater.

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Absolut

© Tuff Gong

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