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130626-lynchDavid Lynch. © Ziza

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Mortes por armas nos EUA

Os recentes tiroteios no Texas e em Ohio reacenderam o debate sobre a letalidade das armas de fogo nos Estados Unidos. Tempestivamente, o Pew Research Center coligiu os dados mais atuais sobre mortes provocadas por armas no país.

Em 2017, 39.733 mortes foram causadas por armas – sendo 60% delas suicídios e 37% assassinatos. Considerando o total de assassinatos no país, três quartos foram por armas. De todos os suicídios, metade foi por armas. Em três anos os assassinatos por armas cresceram 32% e em uma década os suicídios cresceram 41%. Em bases per capita, a taxa de mortes por armas em 2017 foi de 12 pessoas por 100 mil – a maior em mais de duas décadas, mas menor que a do pico histórico de 1974, que foi de 16,3 por 100 mil. A taxa atual, de 4,6 assassinatos por 100 mil pessoas, está bem abaixo dos 7,2 registrados em 1974, assim como os atuais 6,9 suicídios por 100 mil estão abaixo dos 7,7 de 1977.

Os EUA estão na 20.ª posição mundial em taxas relativas de letalidade por armas. O ano de 2016 registrou 10,6 mortes a cada 100 mil pessoas, muito acima de países em condições socioeconômicas similares, como França (2,7), Canadá (2,1), Alemanha (0,9) ou Espanha (0,6), mas muito abaixo de vizinhos latino-americanos, como El Salvador (39,2), Colômbia (25,9) ou Brasil (19,4).

Um fenômeno peculiarmente norte-americano são os tiroteios em massa. Há grande variação nas estimativas, dada a dificuldade de definir consensualmente o termo “tiroteio em massa”. O FBI utiliza a indexação “incidentes com atiradores ativos” ou seja “um ou mais indivíduos ativamente empenhados em matar ou tentar matar pessoas em uma área populosa”. Segundo essa definição, 85 vítimas morreram em 2018. Já o Arquivo de Violência por Armas define tiroteios em massa como incidentes nos quais pelo menos quatro pessoas são baleadas. Nestes termos, 373 vítimas morreram em 2018. Apesar de as variações anuais no número de tiroteios em massa tornarem difícil identificar uma tendência inequívoca, o FBI registra um crescimento alarmante. Entre 2000 e 2006, a média de incidentes foi de 6,4 por ano; entre 2007 e 2013, foi de 16,4; entre 2014 e 2016, de 20; e em 2017 houve 30 incidentes.

Outra pesquisa recente do Pew Research permite vislumbrar a cultura e os hábitos sociais por trás desses fatos. Três em cada dez americanos possuem uma arma. Dois terços (67%) desses proprietários declaram que sua principal razão é a autodefesa – além disso, predominam a caça (38%) e o tiro esportivo (30%). Quase seis em cada dez americanos (57%) entendem que a legislação deveria ser mais restritiva, enquanto 31% estão satisfeitos e 11% acreditam que deveria ser menos restritiva.

Apesar das dissidências históricas entre republicanos e democratas, há algumas políticas sobre as quais há concordância. Nove em dez republicanos e democratas acreditam que pessoas com transtornos mentais, assim como aquelas registradas em listas de vigilância, não deveriam poder comprar armas, e a maioria dos democratas (91%) e republicanos (79%) é a favor da checagem de antecedentes para as vendas privadas de armas. Por outro lado, republicanos são muito mais favoráveis do que os democratas a que funcionários de escolas possam portar armas e que cidadãos possam portar armas em locais hoje proibidos (68% contra 22%). Os democratas são muito mais favoráveis ao banimento de rifles de assalto (81% contra 50%).

Em relação aos efeitos das restrições legais, os americanos estão divididos: 47% acreditam que elas reduziriam os tiroteios, enquanto 46% dizem que não mudariam nada. Já quanto aos crimes, 37% acham que aumentariam se mais americanos possuíssem armas; 33% dizem que não haveria diferença; e 29% acreditam que haveria menos crimes.

Em um momento em que o Brasil discute seus regulamentos sobre armas, pesquisas como essas são oportunas para lembrar que o debate, além de ser conduzido com espírito cívico, deve ser abastecido por dados sólidos.

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Requiescat in pace

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Sabe de nada, inocente

O MINISTRO DO AMBIENTE, moço bonito mas ordinário, culpa os nortistas pelas queimadas na Amazônia. Pelo menos sabe que a Amazônia fica no Norte. No mais, sabe de nada, o inocente.

A CULPA pelas queimadas não é de quem queima. É de quem não apaga e não fiscaliza o ambiente. Culpar quem queima é como culpar a chaleira porque o chimarrão machucou a língua.

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15 pontos nos IIs (Paulo Leminski)

kamiquase-121. O Catatau é a história de uma espera. O personagem (Cartésio) espera um explicador (Artiscewski). Espera redundância. O leitor espera uma explicação. Espera redundância, tal como o personagem (isomorfismo leitor/personagem). Mas só recebe informações novas. Tal como Cartésio.

2. A espera de Descartes/Cartésio é uma espera cibernética.
A melhor definição para “informação”: expectativa frustada. Toda informação nova vem deuma “expectativa frustrada”. O Catatau é uma imagem ampliada dessa noção.

3. Cartésio espera Artiscewsky. O leitor também tem uma espera. Uma expectativa. O que ele— antes de ler — já sabe da mensagem. Ou crê saber.Informação é expectativa frustrada. No Catatau, a expectativa é sempre frustrada. O leitor jamais sabe o que deve esperar: rompe-sea lógica e as passagens de frase para frase são regidas por leis outras que não as normas da sintaxediscursiva “normal”. Existe literalmente um abismo de frase para frase, abismo esse que o leitor deve transpor como puder (como na TV, entre ponto e ponto). Mesmo quando um segmento cobra continuidade (parece fazer sentido), é apenas para contrastar com o efeito contrário, que sucede sempre.Dentro do Catatau, o leitor perde a mania de procurar coisas claras. Então, aquelas que são claras por si mesmas tornam-se escuras no seu entendimento.

4. Se disserem que a expectativa permanente no Catatau acaba por se tornar um estado monótono(caógeno), digo que pretendi realizar um dos postulados básicos da cibernética: a informação absoluta coincide com a redundância absoluta. O Catatau procura gerar a informação absoluta, de frase para frase, de palavra para palavra: o inesperado é sua norma máxima. A seqüência das frases de um texto coloca uma lógica. Mas nessa busca da informação absoluta, sempre novidade, novidade sempre, por uma reversãode expectativa, ele produz a informação nula: a redundância. Se você sabe só vem novidade, novidades vêm, e deixa de ser novidade. O Catatau é, ao mesmo tempo, o texto mais informativo e, por isso mesmo, o texto de maior redundância. 0 = 0. Tese de base da Teoria da Informação. A informação máxima coincide com aredundância máxima. O Catatau não diz isso. Ele é, exatamente, isso.

5. Catatau (aparentemente) é uma “narrativa” em “primeira pessoa”. É uma ego-trip. A narrativa na primeira pessoa é a mais econômica. Eu. Reduz a multiplicidade do universo ao âmbito de um ego só. Economia de um quadro de Mondrian.

6. Catatau procura captar, ao vivo, o processo da língua portuguesa operando. E mostrar como,no interior da lógica todo-poderosa, esconde-se uma inautenticidade: a lógica não é limpa, como pretende a Europa, desde Aristóteles. A lógica deles, aqui, é uma farsa, uma impostura. O Catatau quer lançar bases de lógica nova.

7. Para o europeu, o Brasil soava absurdo, absurdo que era preciso exorcizar a golpes de lógica, tecnologia, mitologia, repressões.
7.1 O ritmo, não o metro. O Catatau registra direções, não assunto. Oftalmografa a passagemdas distâncias nas células fotoelétricas das afinidades eletivas; regula a articulação das partículas atéestas se descontrolarem, gerando leis de crescente complexidade, que já emergem precipitandonovas catástrofes de signos. Por isso, atenção flutuante nas ex-abruptas passagens do sentido para o nonsense, do suspense para o pressentimento.

8. Ao Catatau, dois movimentos o animam: um, documental, centrífugo, extroverso, se dirige para uma realidade extratextual precisa (referente), com toda a parafernália de marcação duma ambiência física, geográfica, histórica e portanto épica; o outro movimento, estético por contraste (sístole cardíaca do Catatau), chega às raias subterrâneas e canais atávicos da linguagem e do pensamento. O significado (semântica) do Catatau é a temperatura resultante da abrasão entre esses 2 impulsos: a eterna inadequação dos instrumentais consagrados, face à irrupção de realidades inéditas.

9. O Catatau é um caso textual de “possessão diabólica”: um texto “clássico” é possuído (possesso) por um monstro “de vanguarda”, que é o próprio catatau, chamado também de “Occam”, um princípio de perturbação da ordem, um agente subversivo, uma estática: o monstro é a personificação (prosopopéia) do conceito cibernético de ruído. As aparições do monstro fazem o texto voltar-se para si mesmo: o monstro é centrípeto. Ele denuncia o código em que a mensagem está sendo registrada.

10. Catatau é um texto em mutação: um mutante.

11. Na palavra “catatau”, animal e texto são sinônimos.

12. Catatau & psicopatologia. O ilusionismo solipsista (ego-trip) do personagem-Cartésio é o fiel retrato, em termos de realismo, do estado de espírito do colonizado, um homem fragmentado, desconexo, perplexo, atônito: alienado. Um dos fenômenos mais típicos do “delirium tremens”, alcoólico é a zoopsia, alucinação com animais repugnantes: cobras, ratos, lagartos. E de zoopsia que Cartésio sofre no parque, vendo todos aqueles bichos absurdos. O parque de Nassau é um lugar mental. Todo o texto é um parque de palavras, sentenças, períodos. O Catatau é um parque de locuções populares, idiotismos da língua portuguesa, estrangeirismos. Seu polilingüismo é o reflexo do polilingüismo do Brasil de então onde se praticavam as línguasmais desencontradas: o tupinambá da Costa e centenas de idiomas gês/tapuias, dialetos afros, português, espanhol e, em Vrijburg, cosmopolita, holandês, alemão, flamengo, francês, iídiche e até hebraico. Outro fenômeno psicopatológico transformado em recurso de base é o mentismo. Em psiquiatria, chama-se de mentismo um pensamento que vem por si, uma idéia fixa que vai e volta, contra o paciente, atingindo exatamente os pontos mais delicados de suas neuroses e psicoses. Mentismo ocorre sempre quando o personagem do Descartes/ Cartésio recusa, repele ou nega um pensamento que acaba de ter. Ele sempre atribuiu esses mentismos a um efeito do clima ou da erva que fuma. É a presença de um corpo estranho no pensamento organizado de Descartes. Por isso, Descartes/Cartésio é o “heauntontimorúmenos” = “o atormentador de si mesmo”, nome de uma peça de Terêncio.

13. Catatau é um texto colocado sob o signo da Ótica, Descartes sendo um dos pais da Ótica como disciplina científica, parte da Física. Está cheio de anomalias óticas: refrações, difrações, desvios, que incidem sobre as palavras, as sentenças, a linguagem e a lógica.

14. O bestiário. A bicharada, com que começa o Catatau, emblematiza o pasmo do europeu (esse desbestificado), pasmo esse, choque e pânico que os antigos tinham na conta de fonte dofilosofar (até para Aristóteles, o exercício da reflexão começava por um “thaumazein” | “espantar-se”). Ante esses animais, a lógica de Descartes vai para o brejo. Cada fera daquelas (tamanduás,jibóias, preguiças) estropiava uma lei de Aristóteles, invalidava uma fórmula de Plínio ou de Isidorode Sevilha. (p. 1-2) Ver bichos através/atrás de vidros, o longe crítico.

15. Mensagem afetada de elevado coeficiente de ininteligibilidade, legibilidade no Catatau está distribuída de maneira irregular.

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Pau no Leminski

© Tiago Recchia

Conheci o Paulo Leminski em 1963. Eu, aluno do curso Abreu, me preparava para o vestibular de Direito, ele, professor de história e do que chamavam de cultura geral. Foi impressionante. A figura de cabe­los longos, voz um pouco rouca e uma retórica indestrutível desfiava a história da humanidade e questionava a cultura estabelecida e os modelos literários que considerava gastos. Beirava os 20 anos e parecia ter lido tudo, de Platão a Joyce, e no original. No intervalo entre as aulas, dissolvia nossas dúvidas de estudantes de latim. O vestibular de Direito, nessa época, exigia português, história, latim e outra língua. Ele parecia saber tudo o que se precisava saber para as quatro provas.

Minha vocação de jurista dissolveu-se como tantas outras vocações definitivas que tive. Minha vida encaminhou-se na militância política e minhas ideias sobre arte e literatura estiveram engessadas pelos dogmas da época. Leminski era um ruído questionador. Presente em todos os debates. Das ideias políticas à literatura. Do cinema à música popular. E eu creio que essa foi sua contribuição permanente à cidade e a todos nós. Seu permanente comportamento transgressor, inconformista, iconoclasta, não permitia o conforto do consensual. Sua avidez pelo conhecimento o levou a todas as experiências e a todos os territórios, inclusive aos mais destruidores.

Eu o reencontrei quando ele passava pelo pior momento, mesmo assim lúcido e desafiante em seu transe suicida. Mais que isso, o re­encontrei através da obra. Li o Catatau, a obra mais instigante já es­crita nesta área do planeta. E me pareceu ver ali vertido, em exercício de ficção e linguagem, todo o conhecimento que ele acumulou desde sempre, em incrível monólogo onírico de René Descartes em visita a Pernambuco no período holandês. O espanto do filósofo diante da natureza dos trópicos e dos costumes nativos. A falência da razão cartesiana. “Duvido se existo, quem sou eu se esse tamanduá existe?”, pergunta o filósofo. Reli o Catatau com Décio Pignatari, que comandou a preparação de sua edição pela Travessa dos Editores. Foi novo apren­dizado. Durante meses trocamos ideias sobre as fontes e as invenções de Leminski, para perceber toda a extensão de seu processo criativo e de seu conhecimento.

É, para mim, a sua grande obra. Não creio que a poesia de Leminski tenha alcançado o grau de complexidade e tensão criativa do Catatau. Ela passeia por outro terreno, da cultura pop, o que não me impede de gostar e muito de poemas e letras que criou, onde se percebe o mesmo espírito transgressor. Nada que se compare ao desafio de inteligência que o romance-ideia propõe e que o transforma em obra seminal. Cer­tamente de digestão difícil e pouco compreensível para quem a aborda com ânimo de leitor de .narrativas horizontais ou para quem simples­mente não lê e não gosta porque sabe que o Catatau é um exercício que constrange a mediania. Para estes, o gênio de Leminski criou o mote que ele fez inscrever nos muros da cidade: “Pau no Leminski”

Fabio Campana|Revista Ideias 154|Agosto|Ano XI -11 de agosto| 2014

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Não fosse Kurt e era um conto

paulo-leminski-dico-kremer-(1)© Dico Kremer

Difícil associar Paulo Leminski ao Concurso Nacional de Contos promovido pelo Governo do Paraná, por intermédio da Fundepar, em fins da década de 1960. Foi esse o maior prêmio literário e o mais prestigiado concurso que a literatura brasileira conheceu a partir de 1968, quando Dalton Trevisan foi consagrado seu primeiro vencedor, enquanto Curitiba foi oficializada como a capital nacional do conto.

Em outra ponta, o jovem Paulo Leminski, recém-saído do Grupo Áporo, liderava manifestações de um ardor quase comparável às atuais rebeldias contra a Copa do Mundo, isso se o mundo fosse uma grande biblioteca.

Eram faixas denunciando o conto como o “Soneto do século XX” ou ironizando: “Conto só se for a cores”, desfiles interrompendo as palestras que acompanhavam o concurso, entrevistas furiosas, brados de ordem, clamores em defesa da vanguarda.

Bom de mídia, o polaco fez o que pôde para ser preso em nome da literatura. Afinal eram os anos de chumbo, e o conto, oficialmente consagrado, tornava-se uma algema para a literatura.

Sintomático que os protestos leminskianos tenham chegado ao clímax em 1969, durante o II Concurso Nacional de Contos, quando o vencedor foi Rubem Fonseca.

Esgotada a febre de protestos, o fabbro foi para a oficina e daí em diante passou a ser visto circulando pelas ruas e bares com aqueles minúsculos papéis com frases porte-manteau carimbadas com o KTT.

Quase seis anos de alquimia, recortes, desenhos, montagens, anotações, tudo marcado com o indefectível KTT. Três preciosos cadernos de esquemas, mapas e busca de caminhos, entrevistas (originais não encontrados) para, finalmente, anunciar que, no alto do Pico do Marumbi, colocaria o ponto final em sua obra máxima, a mais cara, a mais buscada: Catatau, lançada em 1975, com todo o direito de é pater.

Organizado em sua desorganização, Leminski guardava tudo. Não tivesse ele feito uma convocação, em uma de suas últimas entrevistas, para que eu tratasse de sua obra como havia cuidado daquela dos simbolistas, e não teria saído em busca de seus perdidos do incêndio, pois à sua maneira, a biblioteca de um escritor é sempre um Templo das Musas.

E saí e busquei para encontrar em meio a livros raros e caros, manuscritos, obras inéditas (La vie em close, Metaformose, ambas com proposta de capas, esparsos que a família reuniu, editou e vem divulgando), cartas, recortes, entrevistas, bilhetes, sem contar a marginália, que por si só daria uma tese.

Mas, sem dúvida, o que me seduziu foi o Laboratório de Catatau, ainda inédito, e, em meio a artigos, entrevistas e recortes de jornal, a carta de Léo Gilson Ribeiro, na qualidade de integrante do júri do II Concurso Nacional de Contos do ano de 1969.

Na carta, recebida cerca de três anos após a realização do concurso, a revelação do equívoco. Leminski deixara de ganhar o II Concurso Nacional de Contos (1969) ou Rubem Fonseca fora o vencedor porque o júri confundira Kung (Leminski) com um certo Kurt.

A partir daí ficam interrogações: por que Leminski nunca divulgou essa carta? Por que não guardou o conto (de título ainda desconhecido) que inscrevera no concurso?

Esta última questão procurei responder indo à Biblioteca Pública do Paraná, que ainda guardava em seus depósitos todos os contos inscritos nos concursos da Fundepar, organizados por ano de realização. Eram milhares. Assim passei semanas em busca do texto de Kung e localizei Descartes com lentes (publicado em 1993, iniciando a Coleção Buquinista).

Muito mais do que a gênese de Catatau, um texto que teria mudado o rumo do conto brasileiro tão soneto que era com um choque de “ego-trip” na linguagem, marca da proposta do texto de Leminski.

Lá estava, sob uma árvore folhuda, o Cartésius, o experto em dioptria, com suas lentes e lunetas, observando os bichos no zoo, as formas vegetais e as naus aportadas em Vrijburg.

Lá estava a prosa nada cartesiana, Descartes ignorando Descartes e por que não aberto para “outros em mim que não sei”. Por isso, labirinto, por isso imprevisto para outra viagem, mais longa, aquela de muitos cadernos, de muitos KTTs, aquela da lente invertida que chega no Catatau

O conto do Kurt, o que não estava bêbado, esse talvez certinho como tantos- todos, foi considerado medíocre e assim confundido derrotou Leminski.

Kung-Leminski era Artyshewsky bêbado extravagante, ninguém entenderia. Teriam que esperar.  Que dizer do Catatau? História de uma espera.

Sobre o concurso, sobre o conto, sobre o prêmio, Dalton– sempre impecável a polir seus textos –pôde comprar, entre outras coisas, um prosaico Fusca que o acompanhou por muitos anos. Kung-Leminski trancou-se no laboratório e, em meio a experimentos, transformou-se em Occam, o monstro semiótico que habita as profundezas dos lagos e rios subterrâneos da Curitiba-Mundo, o personagem dessa “leminskiada barrocodélica” que é Catatau.

Cassiana Lícia de Lacerda – Revista Ideias|Agosto 2014|nº 154|Travessa dos Editores

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30 anos sem Paulo Leminski

múltiplo-leminski© Gustavo Marchesine

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O Bandido Que Sabia Latim

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Bolsonaro e a arte de ser desagradável

Logo que Jair Bolsonaro começou a ficar mais famoso, a partir de vídeos de suas grotescas performances espalhados pela internet, o que mais me impressionou foi a sua estratégia de marketing que basicamente consistia em ser desagradável. Era a continuidade do que ele vinha fazendo na carreira de deputado do baixo clero e que incrivelmente deu certo também na eleição para presidente.

Bem, até aí tudo bem, pode-se dizer com o peso do desconsolo de ter de passar a vida encarando esta realidade brasileira cada vez mais torta. Mas acontece que um sujeito asqueroso pode até se dar bem do ponto de vista eleitoral. O problema é que depois, com certeza, a continuidade da grosseria vai atrapalhar bastante na função para a qual foi eleito.

Pois é o que temos agora no Brasil. Bolsonaro desconhece essa necessidade evolutiva da política. Sua grosseria ensaiada para ganhar votos nem é novidade na política. A diferença é que até aparecer este presidente sem noção, as barbaridades eram abandonadas no palanque. Nas prefeituras, nos governos estaduais e até na presidência da República, mesmo os grandes canalhas se enquadravam na chamada liturgia do cargo, com a contenção da má índole ou da encenação eleitoral dentro de uma razoável adequação às formalidades públicas.

A razão de tal transformação é muito simples. É que levando para o mandato a brigaiada e os insultos de campanha fica impossível ser efetivo no trabalho, seja no Legislativo ou no Executivo. Isso foi demonstrado na própria carreira de Bolsonaro, que manteve durante três décadas o mesmo caráter de arrumador de confusão, o que serviu para que tivesse uma reeleição atrás da outra e até elegesse também os filhos, porém mantendo-se na baixa qualidade política do baixo clero da Câmara, onde era uma figura isolada, até o país virar de cabeça para baixo e ele se dar bem.

E agora o problema é todo nosso. Os brasileiros estão vendo o efeito disso no comando de um país que precisava de uma remexida geral em todos os setores, mas que infelizmente não sai do lugar, ainda atolado em problemas criados pelos governos anteriores do PT e que acabam sendo agravados por esta insistência de Bolsonaro em ser desagradável. O Brasil tem um presidente que parece começar o dia reunindo a equipe para estudar situações em que ele pode intervir piorando o que já não está bom. E o pior é que no final da jornada ele não só alcança como na maioria das vezes ainda dobra a meta.

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Jair Simão Bacamarte

DILMA foi impichada por causa das pedaladas fiscais. Entre as pedaladas fiscais e as queimadas na Amazônia a diferença está na extensão da gravidade. Nos dois casos houve descumprimento da lei pelo presidente da República. Dilma deixou de cumprir regras financeiras para agradar seu eleitorado. Bolsonaro deixa de aplicar normas de segurança para conter as queimadas na Amazônia.

Bolsonaro omite-se no combate para atender seu eleitorado, o agronegócio, a exploração de minérios e a grilagem de terra dos índios. Com a agravante de estimular desmatamento e queimadas com seu discurso de negação dos problemas ambientais e de ódio aos estudiosos do ambiente, a quem carrega em acusações ideológicas. O impiche que derrubou Dilma tem maior força para derrubar Bolsonaro.

Não vai dar impiche, pena, porque o presidente é inimputável, como Adélio Bispo, porque desliza no teflon, como Lula, porque as zelite não querem passar vergonha mais uma vez. A continuar como está, Bolsonaro termina o mandato em camisa de força, trancado pelos generais de pijama em quarto acolchoado no Alvorada, de onde sairá para atos oficiais no colo de um deles, o ministro ventríloquo.

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Coisas ridículas para roteiros

Tinha algumas pérolas quase indecifráveis, como ‘o quadro do peito que tomba’

Encontrei ontem, fazendo uma limpa no computador, um arquivo com o título: “Coisas ridículas para roteiros”.

Tinha algumas pérolas quase indecifráveis, como “o quadro do peito que tomba”. Logo que saí da casa da minha mãe e fui morar sozinha, pedi a uma amiga artista plástica que pintasse um quadro meu… peladona. E para que eu queria isso? Não faço a menor ideia.

O zelador faz-tudo pendurou a obra em cima da cama, notando que o quadro se inclinava para a esquerda. Ela desenhou o seio esquerdo bem maior que o direito, e o quadro —mistérios da arte— pendia para o lado da teta maior. Eu tenho muita vergonha de lembrar tudo o que eu fiz antes dos 30 anos.

Estava lá também anotada a minha paixão avassaladora por um escritor carioca que havia lançado um livro repleto de sexo, sobre a procura da mulher idealizada.

Eu devorei o texto e fui sedenta procurar pelo rosto por trás daquelas palavras tão provocativas. Cheguei ao Orkut do autor e não pude acreditar. Alto, de cabelos cacheados e olhos claros penetrantes. Passei seis meses mandando mensagens eróticas para o cara, até uma amiga me falar: “Não, doida! Essa foto é do Bob Dylan bem novinho”.

Um dia, na rua da escola, um motoqueiro se acidentou e ficamos todos impressionados com aquele jovem estendido no chão, esperando a ambulância. Parecia descaso. Foi quando o professor Claudio, de biologia, abdicou da lição sobre mitocôndrias para nos explicar a importância de jamais mexer no corpo de um acidentado.

Pois bem, no fim de semana seguinte, eu caí da bicicleta e fiquei totalmente imóvel, dura, sem abrir os olhos nem responder à minha mãe que gritava: “Pelo amor de Deus, fala comigo!”. Chamaram uma ambulância, e eu só tinha ralado o joelho.

Aos 16, eu namorava um moço que já tinha outra namorada e, com medo que ele fosse para a casa dela, o tranquei em meu quarto.

Ele começou a ficar muito nervoso (eu era menor de idade!) e deu vontade de fazer cocô. No meio da fuga até o lavabo, minha mãe acordou para seu xixizinho da madrugada e ele se escondeu entre os meus brinquedos, ao lado do Alf, o ETeimoso.

No susto, minha mãe, que estava dormindo sem calcinha, caiu de costas sobre o sofá, gritando: “Eu vou chamar a polícia!”, e ele então se ajoelhou de frente para a não calcinha dela, piorando por demais a situação, e implorou que ela não fizesse isso.

“Doce avariado” era sobre um paquera de internet que pegou mais de 14 horas de ônibus vindo do interior do Espírito Santo para me pedir em namoro e me trazer um doce caseiro feito pela avó.

Quando me viu, disse que me achou diferente da foto e que agora não sabia o que fazer com a compota da vovó, que estragaria em 12 horas. Ficou puto e preferiu jogar a iguaria fora a ter que me dar.

Ainda sobre minhas aventuras amorosas, me lembrei de quando saí com um estudante de filosofia sem saber que seu principal hobby, em vez da pesca, era o “machismo-tiozinho”.

Ao ver em seu carro o adesivo “Olha esse filezão que eu pesquei”, desisti do cinema.

O “kit putaria santo sudário” falava da vez que fui parada no aeroporto de Turim levando metade de uma sex shop (era um namoro recente com um italiano), e, quando me perguntaram o que eu estava fazendo naquela cidade, respondi que tinha ido conhecer o santo sudário.

Estou há mais de 24 horas tentando lembrar, sem sucesso, o que querem dizer as anotações “lhama amigo do Kiko com dengue”, “piroca-tecnia” e “umbanda sem cueca”. A idade traz muitos esquecimentos. Ainda bem.

Publicado em Tati Bernardi - Folha de São Paulo | Deixar um comentário
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