Mural da História – Pauleiras – 2009

Justo neste domingo quando as cronicações do escriba saem publicadas, o registro melancólico de uma data – os 20 anos da morte do poeta Paulo Leminski (1944-1989). Em depoimento recente à TV Sinal (canal 16 – Net e 99 – TVA), criada e dirigida com rara competência pelo meu amigo Davi Campos, colheram-me meia hora das memórias e desmemórias do velho “Pablo” de guerra. Não precisa dizer da emoção nem da saudade. Praticamente crescemos juntos.

Ainda ontem – ouviu, Soldinha? -, Lema desfilava pela Rua XV as suas ousadas calças vermelhas e seu casaco de general, cheio de anéis… Aos 21 anos era um homem lindo – cabelos pretos, os dentes um riscar de pérolas, o corpo de judoca sarado. E os olhos que, nele, brilhavam, já então, assim de um modo vivaz e um pouco diabólico.

Não bebia, não fumava, não jogava conversa fora. Um beneditino – literal e figurativamente – né mesmo, “compá” Toninho Vaz? Mas aí vieram o final dos 60s e toda a década de 70 onde o desbum era a lei e sem o qual jamais seríamos os mesmos. “Sex, drugs and rock’n’roll”, nossa sina e fascínio. Calai, adictos da hora, vocês não sabem o que fazem. A droga hoje é suja e repetitiva, burra e rotineira. Cessai enquanto ainda vos resta uns fumos de santa malandragem.

Paulo Leminski vivia poesia noite e dia, acossadamente -sem intervalo, sem férias nem feriado. Lia, traduzia, criava – obsessão terminal, cheia de urgências. Uma vez lhe perguntei por que tanta fúria. Me respondeu, tolice!, que o seu tempo seria escasso sobre a Terra. Foi mesmo. Acertou. Doou-se às Letras como jamais vi em outra pessoa. Talvez João Antônio… Paixão, e um oscilante desespero.

Vinte anos! Passou, hein, Josely Vianna Baptista, minha sempre doce “hada”? Duas décadas, este domingo, 7 de junho, daquela quarta-feira exangue de 1989 quando, em vigília à porta da UTI do Hospital N. Sra. das Graças, você, saindo dela, na saleta contígua me abraçou sem palavra. Ficamos ali, eu, você, Margarida Gomes, nossa “doutora”, abraçados os três num silêncio que não precisou sequer de lágrimas. Paulo Leminski não era mais.

Acabara de morrer da Vida que nunca deixara por menos: o máximo no mínimo! Só hoje, aos 60, verifico como morreu cedo, um garoto de 44 anos que amava os Beatles e os Rolling Stones. Nunca mais, pelos botecos sórdidos das madrugadas cachorras os nossos uivos no escuro; nunca mais pelos espaços da moda, o nosso desfilar desbocado, arrogante. Jovens, o mundo inteiro era só teu e meu, bicho.

De mais ninguém. Amanhã, de novo, uma saudade triste há de continuar me perseguindo assim como uma estrela que não muda de lugar mas leva o céu consigo. Paulo, Pablo, Paulo Leminski.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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