Quinze minutos depois, ao telefone, era Agrippino. Não deixou Augusto falar. Apenas disse: “Semana que vem, entro em férias na faculdade e embarco no vapor Fulano de Tal para Recife, onde vou fazer umas conferências, vão me pagar um bom dinheiro. O vapor faz uma escala em Maceió, que dura quatro horas. Telegrafe ao Graciliano para que ele me encontre no cais do porto. Quero conhecer o sujeito pessoalmente e almoçar a comida local”. Schmidt, em pleno domingo, foi ao Correio e telegrafou para Graciliano Ramos.
Na volta ao Rio, Agrippino Grieco lançou suas impressões sobre Graciliano Ramos: “Inteligentíssimo, talentoso, grande escritor e fala coisas sérias e producentes, mas muito tímido. Disse-lhe que fosse morar no Rio de Janeiro porque viver de literatura em Maceió é impossível. Mas ele disse que não poderia, tinha esposa e oito filhos para criar. Uma pena. Temo que se perca um grande romancista. Aos editores do Brasil, aviso que Graciliano Ramos já terminou o seu segundo romance, que se intitula “São Bernardo”. Augusto Frederico não gostou da última frase e tinha lá suas razões. São Bernardo, em 1934, foi publicado pela concorrente Editora Arial.
Numa de suas últimas entrevistas antes de morrer, em 1973, Grieco foi perguntado sobre quais eram os grandes escritores brasileiros. Não pensou cinco segundos e disparou: Dos mortos, Machado de Assis, Lima Barreto e Graciliano Ramos. Dos vivos, Jorge Amado, José Lins do Rego, Ciro dos Anjos, Érico Veríssimo e Lúcio Cardoso.
Graciliano Ramos, que não queria deixar Maceió, a esposa e os oito filhos, acabou aportando no Rio de Janeiro contra a sua vontade, em novembro de 1935. Após a “Intentona Comunista”, foi preso em Maceió, colocado a ferros no porão de um navio e desembarcou no Rio de Janeiro. Foi levado ao presídio Frei Caneca e depois para à Ilha Grande. Ficou onze meses preso, sem jamais ter sido interrogado, acusado ou julgado. Quando foi solto, telegrafou à mulher para que vendesse tudo e viesse com os oito filhos para o Rio de Janeiro.
Na prisão, elaborou várias notas para um livro que escreveu já em liberdade: “Angústia”. Não queria publicar, achava-o muito pessimista. José Lins do Rego, que leu os originais a pedido de Graciliano, foi contra. Disse que era uma obra prima e deveria ser editado. É tido, pelos estudiosos, desde os anos de 1960, como o primeiro livro existencialista do Brasil.
Depois, escreveu “Vidas Secas” (1938), para alguns o seu melhor livro; “Infância” (1945), livro de memórias; “Histórias incompletas” (1946); e “Insônias” (1947).
Em 1945, com a volta dos partidos políticos depois do Estado Novo, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro, tendo sua ficha sido abonada pelo próprio Luiz Carlos Prestes e, logo após, partiu numa longa viagem pela Europa com a segunda esposa Heloísa. Foi acometido por um câncer no pulmão em 1952 e veio a falecer em 20 de março de 1953.
Nas suas gavetas, foram localizados e publicados os seguintes livros: “Memórias do Cárcere” (1953); “Viagem” (1954) e outras dezenas de títulos.
No seu “Memórias do Cárcere”, Graciliano Ramos, entre tantos, traça perfis maravilhosos de “Apparício Torelly”, “O Barão de Itararé”; “Cubano”, um negro preso sabe-se lá porque, do médico Victor Konder (pai dos escritores Leandro e Rodolfo) e Octávio Malta, velho militante comunista e um dos mais importantes jornalistas da história do Brasil, sendo o “braço esquerdo” de Samuel Wainer na revista “Diretrizes” e no jornal “Última Hora”.
Pelo que li, depois que iniciei o vício, concordo com Agrippino Grieco, Machado de Assis, Lima Barreto e Graciliano Ramos formaram um grande trio que não deve nada aos maiores escritores do mundo.
PS – Segundo publicado no Facebook de Dacio Malta, filho de Octávio, ex-jornalista (“Veja”, “Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia”) e atualmente cineasta, a CEPE – Companhia Editora de Pernambuco prepara, para o meio do ano, a publicação de uma biografia e vários textos de Octávio Malta. Graciliano Ramos, certamente, aparecerá por lá.