Comecei pelo deserto, lugar do silêncio infinito, dos céus tingidos de rubro, das raras espécies que sobrevivem à severidade do tempo, à falta ou excesso da luz, à alta altitude. Munida dessa essência fundamental, parei, observei, voltei ao início de tudo, para depois jogar-me ao abismo. Ali onde me perdi, quase enlouqueci, me descobri.
Caí com toda a velocidade numa espiral de contradições, sinas, sonhos. Apenas o não nos devolve o sim, o que é de verdade, o que ensina a mudar. A realidade mostra todos os dentes, escancara os medos, mas também nos acorda do pesadelo.
Recomecei do zero, recolhi as dores e os medos, e segui por essa trilha desconhecida e imprevisível. Marquei minha pele com palavras que viraram sangue: “Irreversível. Como uma palavra sem volta. Como um rio que corre. Como o sol em meus olhos”.
Como profecia, o improvável acontece, o som do sonho desenha o sim, há leões na porta do mistério. Vejo o mundo submerso que volta à tona para respirar, descubro paisagens possíveis, refaço a composição do sal, curo as feridas.
Por fim, retorno ao começo, de onde vim, o que sou, como se não houvesse outra possibilidade. Ando pelas ruas da minha memória, me absolvo. Preencho todo o vazio com silêncio e delicadeza, com a certeza de que quando eu voltar será para sempre.