Caro leitor, imagino que, ao abrir o jornal nesta quarta (23) ou clicar no link que leva ao espaço que a Folha gentilmente me cede desde 2014, você esperasse ler sobre o inferno astral das Forças Armadas. Ou ainda sobre como o presidente Lula tem sido condescendente com o golpismo dos militares, ao recebê-los em pleno sábado na Alvorada para tratar de mais dinheiro para os batalhões.
Tudo isso também me interessa muito, mas ao ver a manchete sobre a pesquisa “Mulheres e jovens têm mais ansiedade que média da população”, infelizmente me reconheci na estatística. Segundo o Datafolha, um terço dos brasileiros relata ansiedade, problema de sono e de alimentação. Se fosse uma cartela de bingo, eu poderia gritar com a pontuação máxima, em mãos.
Apesar de o estigma ter diminuído, muito graças às redes sociais pelo compartilhamento de casos, de depoimentos, de gente famosa que saiu do armário das doenças mentais, a maioria ainda entende pouco sobre o que passa com alguém numa crise de ansiedade. Mesmo entre aqueles muito próximos é comum ouvir, “mas, assim, do nada?”
Sim, o episódio de pânico –é esse o sentimento quando a onda da ansiedade cresce como um tsunami, chega, assim, “do nada”. É impossível prever porque e quando ele se manifestará. Mas o que remexe as profundezas do indivíduo que sofre dessa doença mental não surge do “nada”. A minha experiência, veja, a minha experiência, mostra que por mais que se use todos os recursos, inclusive informação, a ansiedade dorme dentro de nós em banho-maria.
Mas basta um acontecimento mal resolvido –ou uma sequência deles— para que o mecanismo da panela de pressão seja acionado. O organismo começa a cozinhar sentimentos ignorados, mal digeridos. A consequência não é imediata, pode levar dias. Por isso, quase sempre é uma surpresa quando o apito indica o ponto de fervura, que nos desperta a sensação de morte.