Ruy Castro – Folha de São Paulo
RIO DE JANEIRO – Outro dia, em Copacabana, o taxista sugeriu que talvez nos livrássemos do engarrafamento na avenida Atlântica se fôssemos por dentro. Eu disse OK. Ele virou à esquerda e saímos numa avenida Nossa Senhora de Copacabana parada e ainda mais cheia. Perguntou a um colega e ficou sabendo que, lá na frente, dois carros tinham acabado de bater -daí a razão de estar tudo congestionado. Deu com as duas mãos no volante: “É a lei de Murphy!”.
Levei um susto. No passado, citar a lei de Murphy era uma brincadeira entre os iniciados. Murphy, claro, é o autor da frase “Se alguma coisa pode dar errado, dará”. É uma frase profunda -sobre o destino do homem, a inevitabilidade do fracasso, a falta de sentido do Universo, sei lá. Tinha mesmo de virar lei. E quem é esse Murphy? Não se sabe ao certo -pode nem ter existido e, se existiu, não sabe que criou sua própria lei.
Para fins contábeis, o verdadeiro Murphy é um escritor americano chamado Arthur Bloch, autor também de uma frase que complementa a lei original: “Não apenas dará errado, como isso acontecerá no pior momento possível”. E de um corolário ainda mais arrasador: “Murphy era um otimista”.
Bloch fez para nós, em pílulas, o que Schopenhauer e Nietzsche levaram a vida construindo: uma visão pessimista, logo realista, do mundo. Mais frases: “Se há possibilidade de várias coisas darem errado, dará errado a que causar mais prejuízo”; “Dixadas à própria sorte, a tendência das coisas é piorar”; “Toda solução cria novos problemas” etc.
O que me deixa contente é que um humilde taxista carioca foi desencavar um autor famoso nos anos 1980 e, depois, deixado de lado. O preocupante é que, se a lei de Murphy já chegou às classes populares, é porque até elas já sabem que, não importam os acertos do percurso, no fim vai dar errado.