Fabrício me escreve para contar que é corno. Ao descobrir a pulada de cerca da namorada, não ficou possesso e nem terminou a relação, chegando até mesmo a sentir um certo alívio e um aumento da libido sexual em relação à parceira. Ele quer saber se está maluco.
Maluco, meu caro, é quem casa jurando fidelidade em igreja. Acreditando, de uma só vez, em casamento, fidelidade e igreja. Maluca (e chatérrima) é a cobertura que a mídia deu à traição do Neymar. Já a cobertura que as redes sociais dariam se a traição tivesse vindo de uma parceira de Neymar (imagina o desfile de comentários misóginos e nojentos?), me daria ainda mais engulhos.
Só lembro que Neymar existe quando ele precisa ganhar uma Copa do Mundo ou defender a democracia do pior presidente da história do Brasil. Ele falhou em ambas. De resto, não tem como eu me interessar por safadezas ou pedidos de perdão alheios, porque tenho mais o que fazer.
Mas voltemos à traição da namorada de Fabrício. Como humana que sou, já trai algumas vezes. Como de humanas que sou, perdi a conta das vezes em que fui corna. Tive reações das mais diversas. Aos 21 anos, fiquei meses sem dormir direito, chorando infinitamente, achando que o mundo tinha acabado e que eu não poderia confiar em mais ninguém. Aos 39, cogitei ficar brava, daí lembrei que eu também não era santa, bocejei e fui dormir porque no dia seguinte eu estava cheia de trabalho e ainda amamentava um bebê. As coisas que acabavam com a minha vida aos 20 anos hoje me parecem meio sonsas, principalmente depois da maternidade. Às vezes realmente acho que se minha filha estiver sem febre, todo o resto do mundo pode estar ardendo no inferno.
Estou pegando leve porque me refiro a uma sacaneta momentânea, a um “putz, escapou aqui uma merdinha depois de anos juntos” e não a descoberta de um ou uma amante que recebe juras de amor há anos. Jamais defenderei o serial flertation que se passa pelo fielzão do rolê. Supondo que a namorada de Fabrício faça parte do primeiro exemplo, eu defendo que ser corno para um homem pode ser prazeroso e relaxante como férias na Bahia.
Você não está maluco, querido leitor, você está liberto, solto, desamarrado.
Eu sempre defendi que não são somente as mulheres que sofrem com o machismo, o macho, o patriarcado e toda essa ladainha desgraçada de comandante-coronel-provedor-poderoso-não-pode-chorar-não-pode-brochar-não-pode-fracassar. Isso deve ser uma prisão insuportável também para os caras.
O que você sentiu, Fabrício, quando descobriu que é corno, foi um anjinho enviado de Deus com uma chave de ouro cheia de strass (anjo bom é anjo gay) para abrir as correntes pesadíssimas que seu pai, seu avô paterno e seu bisavô paterno foram tornando mais e mais grossas, e mais e mais enferrujadas, para você.
As correntes que dizem, século após século: “O macho é soberano, sagrado, perfeito, único e jamais pode ser feito de trouxa”. Agora que você é corno, você não precisa mais ter medo de ser corno ou de como se sentiria o dia em que porventura perdesse o controle do cosmos e da vulva de uma moça e, talvez, viesse a ser corno.
Ser trouxa é ser livre. Sylvester Stallone em “Rambo” acaba de virar patético. Você não sabe soletrar Arnold Schwarzenegger e nem quer aprender. Você está tão livre para brochar, que eu aposto que está até gozando mais. Está tão soltinho para chorar e se sentir humilhado, pequeno, um brasileirinho em meio a tantos, que eu vejo daqui o seu sorriso e a sua malemolência no andar. Seu peito aberto e imponente.
Viva o homem corno! Se eu fosse homem eu estaria morta de inveja de você.