SOS Campos Gerais.

Aquarelas de Dante Mendonça

Se o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão, o nosso planalto dos Campos Gerais vai virar um deserto verde. Deserto verde é a expressão usada pelos ambientalistas para exemplificar as conseqüências do crescimento vertiginoso das plantações de eucalipto e pinus no Brasil meridional. Onde se propaga o deserto verde, a biodiversidade se destrói, os solos se degradam, os rios secam.

Na borda do segundo planalto paranaense, os campos de São Luiz do Purunã compõem uma deslumbrante paisagem a caminho da extinção. Se na serra abaixo tantos se mobilizaram para salvar a Mata AtlânticaSOS Mata Atlântica -, algo de urgente precisa ser feito para preservar a vegetação nativa dos Campos Gerais, antes que transformem aquele imenso jardim em caixas de papelão.

Em 1884, o Visconde de Taunay descreveu o que era aquele imenso jardim de São Luiz do Purunã: “Ponto de parada obrigado ás tropas e mais commumente as carroças que veem dos Campos Geraes, e carregadas de matte, quase todo cacheado ou bruto, que buscam Curityba. Ao lado alteia-se o terreno coberto de lindíssima e folhuda grama que se prolonga para o interior do mais lindo bosquete, como que cousa arranjada com o cuidado de inteligentes jardineiros, zellosos em impedir e corrigir os exageros da natureza, mas attentos sempre em dar valor ás suas bellezas e indicações. E como falamos em orchideas, as innocentes parasitas, mencionemos a riqueza dos bosques que circundam S. Luiz do Purunan e que nos deram exemplares bellíssimos em musgos, odontoglossos, oncidios, bromeliasinhas e avencas de extraordinária delicadeza.”

O Rio Tamanduá nasce da lagoa no centro da vila de São Luís, e do Rio dos Papagaios corre para abraçar o Rio Iguaçu. Sábado passado passamos o dia nadando rio abaixo e, depois de um carneiro assado, me acomodei na varanda da Pousada Rio Tamanduá para aquarelar a paisagem. Observem em duas delas: nas colinas ao fundo, o marrom das plantações de pinus. Chernobyl é ali, onde não entra bicho, a folhuda grama desaparece, o bosquete some de vista. Nas margens do Tamanduá, não distante das pedras que servem de trampolim para os profundos panelões de águas límpidas, o pinus é o fantasma do paraíso.

Átila era o flagelo dos deuses: onde ele pisava não nascia grama. O pinus é o Átila do ecossistema: protegido por mãos poderosas, ele expulsa o tatu, o sapo, a anta, a capivara, a jaguatirica, o macaco, e o passarinho. Peixes, só no fundo do mar. No lugar da gralha-azul que semeia araucária, o vento semeia o deserto verde além do horizonte.

Nos Campos Gerais, o paraíso está por um fio. Em breve, veremos apenas uma aquarela na parede. Mas como dói!

Dante Mendonça [29/11/2006] O Estado do Paraná

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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