Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann
Uma das principais lideranças do PT, a senadora Gleisi Hoffmann (PR), presidente nacional do partido, foi absolvida nesta terça-feira (19) da acusação de ter participado de esquema de corrupção e lavagem de dinheiro desviado da Petrobras.
Seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, e o empresário Ernesto Kugler também foram considerados inocentes das acusações da Lava Jato.
Os ministros da segunda turma do STF (Supremo Tribunal Federal) entenderam que a PGR (Procuradoria-Geral da República) não conseguiu provar os crimes que foram imputados pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot.
Os magistrados criticaram a estrutura da denúncia, considerada elaborada com base apenas em delações premiadas de pessoas com interesses pessoais em fazer acusações e que não apresentaram provas para corroborar seus depoimentos.
“São tantas as incongruências e inconsistências nas delações premiadas que elas se tornam imprestáveis para sustentar qualquer condenação”, disse Ricardo Lewandowski.
De acordo com a denúncia, Gleisi e Paulo Bernardo pediram e receberam propina no valor de R$ 1 milhão, paga em espécie e em parcelas, com valores que teriam sido desviados da Petrobras para financiar a campanha da petista ao Senado em 2010. Kugler teria operacionalizado a entrega, acertada entre Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, e Alberto Youssef, doleiro.
A investigação foi aberta em março de 2015, a partir da primeira lista de parlamentares alvos da operação, que incluiu dezenas de parlamentares e foi elaborada por Janot.
A denúncia, oferecida em maio de 2016, incluiu depoimentos de outros delatores, como o ex-senador do PT Delcídio do Amaral e o ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE).
Gleisi ainda é alvo de três processos no Supremo, todos relacionados à Lava Jato: quadrilhão do PT, delação da Odebrecht e caso Consist (desvios no Ministério do Planejamento).
Relator da Lava Jato no STF, Fachin considerou que a PGR não conseguiu comprovar que a petista recebeu dinheiro em troca de contrapartida e, portanto, ela não poderia ser condenada por corrupção passiva e consequente lavagem de dinheiro.
No entanto, o magistrado entendeu que os investigadores conseguiram comprovar ao menos uma entrega de dinheiro.
Com isso, desclassificou a conduta imputada a Gleisi pela PGR e lhe atribuiu responsabilidade por caixa dois. Seu voto foi seguido por Celso de Mello.
“Conforme atesta a prestação de contas apresentada pela denunciada nas eleições do ano de 2010, não se vê a declaração da referida quantia à Justiça Eleitoral, tratando-se de omissão que, por si só, materializa o crime de falsidade ideológica eleitoral”, declarou Fachin.
Divergência foi aberta por Dias Toffoli, que votou por rejeitar a denúncia na íntegra. Seu voto foi seguido pelos colegas Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
Para Toffoli, ao suprimir os depoimentos dos colaboradores, “restam apenas elementos indiciais” que não permitem concluir a prática de crime. “Os depoimentos dos delatores não foram harmônicos no que concerne à solicitação de recursos”, disse Toffoli.
As defesas dos acusados sustentaram que a denúncia foi oferecida apenas com base na palavra dos delatores.
“Vou votar pela absolvição pela falta de provas suficientes para condenação. O caso foi estruturado apenas no depoimento de vários delatores, que se contradizem. O reforço de provas materiais é raquítico e inconclusivo”, afirmou Gilmar.
Rodrigo Mudrovitsch, que defende Gleisi, disse que a PGR não conseguiu comprovar a entrega de dinheiro ilícito para a senadora e que os delatores apresentaram incongruências nos depoimentos.
“Estamos diante de ação penal única e exclusivamente lastreada nas palavras confusas e contraditórias de colaboradores”, afirmou, acrescentando que Youssef apresentou três versões diferentes sobre as entregas de dinheiro.
“Youssef não consegue concordar consigo mesmo”, disse o advogado, “o que mostra que ele não deve ter muita certeza sobre o que falar neste caso”.
Mudrovitsch criticou o método de trabalho com delação da PGR sob Janot. Para o advogado, as colaborações foram banalizadas. “Estes acordos não passam o teste atual da PGR”, disse, em referência às exigências da procuradora-geral Raquel Dodge sobre novos acordos de delação.
Juliano Breda, que defende Paulo Bernardo, também foi enfático nas críticas às colaborações. “Essas delações não passariam hoje”, afirmou, destacando que a PGR tampouco conseguiu provar a participação do ex-ministro nos supostos crimes.
Os criminalistas criticaram o que chamaram de “credibilidade seletiva” em relação à palavra dos delatores. “Não há registros de ligações telefônicas entre aqueles que a PGR diz estarem associados. Não há um e-mail, ligação telefônica entre Paulo Bernardo e Paulo Roberto Costa”, disse Breda.
Quando o julgamento terminou, a senadora publicou uma imagem em uma rede social com a frase “Gleisi absolvida”. Petistas comemoraram a decisão.
Para Mudrovitsch, o STF “estabeleceu marco importante acerca da impossibilidade de condenação de indivíduos apenas com base na palavra de colaboradores premiados”
Breda e Verônica Sterman, também defensora de Paulo Bernardo, disseram que o STF “fez justiça, absolvendo-lhe por unanimidade de uma acusação injusta” e que “a decisão tem importância histórica porque comprova o abuso das denúncias construídas a partir de delações sem prova”.
O advogado Cal Garcia, que defende Ernesto Kugler, disse que seu cliente sequer poderia “ter sido denunciado diante da manifesta ausência de provas”, mas que o colegiado o absolveu “de uma acusação injusta, fundada em delações inverídicas”.
Folha de São Paulo