Três perguntas para Pablo Ortellado

Fundador do Monitor do Debate Político no Meio Digital e professor de Gestão de Políticas Públicas na Universidade de São Paulo, Pablo Ortellado fala sobre como a direita e a esquerda produzem e consomem “fake news”

1 – Quem tende a acreditar mais em fake news, a direita ou a esquerda?

“É difícil mensurar a circulação de mentiras e compará-las de maneira metodologicamente séria. Como cientista, portanto, a resposta é que não sei. Mas, como estudioso e observador do assunto, mesmo sem elementos empíricos para embasar essa opinião, eu diria que a circulação de desinformação é muito maior na direita do que na esquerda.

Isso se deve a duas coisas. Primeiro, ao fato de, no Brasil, a direita ter ficado muito radicalizada, apaixonada e, recentemente, inconformada com o resultado da eleição. Isso faz com que ela ‘compre’ muito fácil o que lhe é empurrado pela máquina de propaganda.

Em segundo lugar, há o fato de que a direita esteve nos últimos quatro anos no poder e, a partir do momento em que a imprensa cumpriu o seu papel de fiscalizar o poder, os apoiadores dessa direita se afastaram da imprensa profissional. Assim, perderam um contraponto possível para a desinformação.

Eu chamo a atenção para essa questão porque, agora que a esquerda passou a ser situação, é possível que tenhamos um fenômeno semelhante, mas com sinal invertido: à medida que a imprensa for fazendo o seu papel, de fiscalizar o novo governo e denunciar seus eventuais erros, pode ser que os leitores de esquerda se afastem da imprensa profissional e comecem a se encapsular na máquina de propaganda da esquerda — que também existe.”

2 – Que tipo de fake news tende a ser mais compartilhada?

“As que despertam o sentimento de indignação.

Em geral, no Brasil, isso se traduz em conteúdos noticiosos que recaem sobre adversários políticos na forma de acusações como a de que a esquerda roubou ou de que a direita agiu de forma discriminatória, por exemplo. Qualquer conteúdo que desperte sentimentos fortes é um propulsor de compartilhamentos, mas a indignação é o mais poderoso deles.”

3 – O governo Lula criará um órgão contra a desinformação. Há risco nisso?

“Acho que a própria ideia de tratar o problema da desinformação enquanto desinformação não é muito apropriado. Na Europa, por exemplo, que está lidando com o assunto de forma muito séria, a tentativa não é de regular a desinformação, mas os seus efeitos na saúde pública, no discurso de ódio, na integridade eleitoral e assim por diante.

Por exemplo: se você postar numa rede social que quem tomar vacina contra a covid vai pegar aids, você vai ser investigado e processado por crime contra a saúde pública, e não pelo crime de desinformação. É um caminho que eu julgo sensato, sobretudo porque evita que o Estado fique responsável por arbitrar o que é verdade e o que é mentira, o que é muito perigoso.”

Comprovado: fake news e a tia do zap, tudo a ver.

Com base no banco de dados do Facebook, Pablo Ortellado e o também professor da USP Márcio Moretto conduziram um estudo no ano passado com mais de 1 bilhão de usuários da rede em 46 países. O objetivo era aferir a relação entre o compartilhamento de conteúdos na rede social e a idade dos usuários, além da natureza do conteúdo compartilhado – se politico ou não político, se de direita ou de esquerda.

Em 43 dos 46 países analisados, os pesquisadores constataram que as pessoas mais velhas costumam compartilhar mais mensagens do que as pessoas mais jovens.

Num detalhamento do estudo feito com 203 milhões de usuários do Facebook em quatro países da América Latina — Brasil, Argentina, Colômbia e Chile –, os pesquisadores concluíram que, além de compartilhar mais links que os jovens, os usuários mais velhos também saem na frente em número de compartilhamento de notícias sobre política, em número de compartilhamento de fake news e em número de compartilhamento de fake news com viés de direita.

Para os autores do estudo, essas conclusões reforçam a necessidade de incremento das pesquisas que investigam a possibilidade de pessoas idosas serem mais suscetíveis a estímulos vindos das redes sociais do que os jovens. Os pesquisadores concluem o estudo com a sugestão de estender “também às gerações mais velhas” os projetos de alfabetização midiática que, em geral, têm como alvo apenas crianças e jovens.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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