Tortura nunca mais?

Elogios de Bolsonaro e Mourão a Ustra não foram postagem digital de mau gosto

Nesta semana, de acordo com a Folha, Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro e filho do candidato presidencial Jair Bolsonaro (PSL), “compartilhou em suas redes sociais a fotografia de uma cena simulada um rapaz sendo torturado”

A horrível imagem reproduzida pelo jornal mostrava, agonizante, um jovem de barba com um saco plástico que lhe envolvia a cabeça. No peito, levava inscrita a marca “#elenão”, que virou lema dos que se opõem à candidatura do capitão reformado.

Consta da notícia que o vereador carioca, “após a repercussão negativa” da foto, negou que quem escreve a hashtag #elenão “mereceria alguma maldade”. Melhor assim, pois entendeu que propor a tortura a opositores não pega bem. No entanto, a suspeita de que o recuo tenha sido apenas tático vai persistir enquanto declarações de seu pai e do general Hamilton Mourão estiverem no ar.

Em 17 de abril de 2016, quando as atenções da imprensa do Brasil e do mundo se encontravam postas na votação do impeachment de Dilma Rousseff, Jair Bolsonaro dedicou seu voto contra a então predsidente à “memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra”.

O referido militar consta no “Brasil: Nunca Mais”, relatório dos anos 1980 liderado pelo ex-cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, como tendo comandado o Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) em São Paulo entre 1970 e 1974.

No relatório, há cerca de 400 denúncias de tortura a prisioneiros políticos naquele local e época. Mais recentemente, no final de 2014, a Comissão Nacional da Verdade registrou a morte e desaparecimento de 55 deles nas mesmas circunstâncias.

Passados dois anos do momento em que Bolsonaro optou por se fazer mundialmente conhecido por reivindicar alguém vinculado à tortura e à morte de presos políticos, Hamilton Mourão, seu vice na presente corrida presidencial, afirmou na Globonews (8/9) que Ustra era “um homem de coragem, de determinação, que me ensinou muita coisa”.

Pressionado pela jornalista Miriam Leitão a se posicionar sobre os mortos e desaparecidos sob a custódia do coronel entre 1970 e 1974, Mourão reconheceu que “excessos foram cometidos”, mas afirmou que “heróis matam”. 

Em outras palavras, recusou-se a condenar a tortura, evitando comprometer-se com a palavra de ordem que selou o fim da ditadura: nunca mais. 

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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