A lei 14.786/2023 de 28/12/23 criou o protocolo “Não é Não”.
A finalidade é de prevenção ao constrangimento e à violência contra a mulher e para proteção à vítima, bem como a instituição do selo “Não é Não – Mulheres Seguras”. Se compararmos a lei brasileira com a lei espanhola e outras, constatamos que pouco avançamos em matéria de proteção às mulheres.
Por exemplo, o testemunho da vítima não tem o peso probatório maior que o do agressor, ao contrário da nova legislação espanhola, que privilegia as mulheres.
Na caracterização do constrangimento a lei prevê a insistência, física ou verbal, o que deixa implícita a necessidade da repetição da conduta para a ilegalidade. A insistência é mais de uma vez ou o número de investidas tem que ser maior que isso?
O conceito de violência remete à legislação penal em vigor, outra repetição desnecessária. Em síntese, afirma-se que as leis devem ser cumpridas. No direito romano essa lei seria qualificada como imperfeita, pois não impõe sanção ou nulidade a ato praticado contra suas previsões. É um mero conselho legislativo, e, na prática, não possui nenhuma consequência.
Direitos e deveres sem sanções são como a deusa da justiça sem a espada da punibilidade, com a venda sobre os olhos bem amarrada, para não ver a realidade dos fatos.
Há uma exceção na lei: ela não se aplica a cultos nem a outros eventos realizados em locais de natureza religiosa. Então nesses locais, o não é um sim?
Essa excepcionalidade resulta do crescente estado teocrático que se instala no Brasil, e apequena o caráter laico das instituições.
Isso ocorreu, primeiro, com a quebra do estado secular nas telecomunicações, com a distribuição de centenas de emissoras de rádio e televisão para os setores neopentecostais. Segundo, na partidarização dessas empresas religiosas criando forças políticas sem limites de propaganda e de divulgação dos seus candidatos.
Uma nova moral política instala-se no país; a pauta dos costumes e o negacionismo são seus anexos. Tudo isso, em grande parte pelo favorecimento da imunidade tributária, a partir da década de 1990l que fez brotar o grande negócio da fé.
Coisas que jamais seriam permitidas no mundo civilizado, aqui prosperam.
Resultado, na lei do “não é não”, de pouco efeito prático, há essa aberração jurídica de que ela não vale nas instituições religiosas. Uma lei inconstitucional que assombra o mundo jurídico civilizado.
Na verdade, a lei não deveria ser aplicada apenas a bares e a casas noturnas, mas em qualquer ambiente público ou privado e poderia conferir valor probatório maior à palavra da vítima, coisas que são impensáveis no atual atraso histórico brasileiro.