Bolsonaro deu entrevista coletiva (sic) sobre a situação da Ucrânia. O vexame de sempre, na forma e no conteúdo: um presidente que não domina o básico do idioma, sem fluência, em frases de monossílabas – no idioma com quase 50% polissílabas – ele devia saber disso, já que é autor de dicionário de palavras cruzadas; o chefe de Estado sem a mais elementar noção de relações internacionais. Sempre a insistir na sua relação “excepcional”com Vladimir Putin, faz o biruta, na mudança dos ventos: o Brasil passa a ser neutro no conflito da Ucrânia, uma neutralidade que conflita com o voto na ONU condenando a agressão russa.
O brasileiro que analisa, porque pensa, o brasileiro informado, desliga a televisão para não renegar a brasilidade, o patriotismo e o amor à pátria que elegeu um inepto para dirigir o país e representá-lo perante o mundo. O brasileiro com o senso da relevância da imagem do homem público sente-se humilhado com tudo que Jair Bolsonaro diz e faz. Esse brasileiro conhece o Brasil e seus homens públicos; sabe que o presidente não difere, com a “honrosa” exceção da insanidade, dos políticos internos. Mas esses políticos cedem à experiência de séculos do Itamaraty na ação e leitura dos fatos da política internacional.
A política externa mantinha-se com dignidade e eficiência até que o dedo podre e a língua suja de Jair Bolsonaro puseram o Itamaraty como arauto do atraso e puxadinho dos filhos do presidente, réplicas de caráter do pai. Apesar de o mundo ver o brasileiro pelo exibicionismo cafona, o Brasil tem histórico de compostura dos chefes de Estado – que se transformam quando no Exterior. Bolsonaro faz no Exterior a política da roça – e vende-se como estadista. Ele está mais para Rodrigo Duterte, o celerado filipino, que para Lula da Silva, que se revelou estadista (apesar dos pesares que com Bolsonaro deixam de pesar).
Bolsonaro só não suja ainda mais a imagem do Brasil porque os EUA, líder na área de influência, tiveram – e podem reeleger – presidente pior que o brasileiro. Acontece que esta conclusão não pode ser comprada pelo valor de face, pois cada país tem seu valor, força e importância, e o Brasil se esforça por perder o que restava com Jair Bolsonaro e seu governo de terra arrasada – sentidos literal e amazônico. Donald Trump, o ex-presidente dos EUA, outro amigo de Bolsonaro, no começo aplaudiu a Rússia, dando a invasão da Ucrânia como obra de gênio; depois passou a condená-la. Um Bolsonaro pouco menos estúpido e que fala inglês.
Bolsonaro tratou a agressão da Ucrânia como briga de vizinhos. Não falava como estadista, sim como político da roça, para sua fauna negacionista, os ignorantes que o consideram melhor que Emmanuel Macron porque este, na reunião com Putin sobre a Ucrânia, sentou no extremo de uma longa mesa; e Bolsonaro, tão próximo, só não sentou no colo do russo porque os dois são apenas bons amigos. A entrevista coletiva recente, com um dois de paus à direita, não passou de recado de Bolsonaro ao vice Hamilton Mourão, que no momento certo e no vazio do titular fez avaliação adequada do conflito na Ucrânia.