A vida passa e a gente a mede do jeito menos expressivo que há: relógios e calendários podem ser insuficientes para determinar diferentes períodos, fases e etapas de uma trajetória. Se se usar percepção nos atos e imaginação nos fatos, a cronometragem não precisa ser anual, mensal, semanal, diária ou horária. Assim:
Foi escritor durante um livro e meia dúzia de leitores.
Traiu maridos por nove guarda-roupas e um parapeito no vigésimo andar.
Trabalhou como torneiro-mecânico durante um mindinho e como fresador durante um antebraço.
Fez carreira política ao longo de três mandatos municipais, dois estaduais e uma CPI.
Bateu na mulher por sete filhos e uma revolta dos vizinhos.
Transou sem riscos por incontáveis camisinhas de qualidade e uma com falha do controle.
Sobreviveu desempregado durante oito planos econômicos, 31 protestos e um desacato à autoridade.
Trabalhou na construção civil ao longo de 403 andaimes e uma roldana com defeito.
Foi pedestre durante centenas de faixas de segurança e um motorista sem habilitação.
Se alimentou do lixo por muitos bairros ricos e um atirador anônimo.
Brincou no decorrer de uns quantos parques sossegados, várias pracinhas tranquilas e um pittbull sem focinheira.
Lecionou na periferia por 4.217 alunos esforçados e um canivete numa mochila.
Foi caixa de confiança ao longo de dez empresase uma ocasião propícia.
Etc.