Levou uma semana para que viesse a público a história do assassinato do congolês
Levou uma semana para que viesse a público a história do assassinato do congolês Moïse Mugenyi Kabamgabe. Em que tipo de buraco incivilizado uma pessoa é amarrada, espancada, morta e abandonada na areia sem que isso se transforme imediatamente num escândalo? Sem que haja revolta e que a vida pare? No Brasil. No Rio de Janeiro.
A novidade é que Moïse não estava num matagal da periferia, onde se mata e se morre todos os dias. A violência a qual foi submetido aconteceu na Barra da Tijuca e revela daqueles absurdos cotidianos que reafirmam a vocação macabra que o Estado abraçou nas últimas décadas, de paraíso do crime.
Quem mora no CEP “errado” enfrenta uma rotina de insegurança e barbárie que se alastrou como fogo na palha por todo Rio de Janeiro. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública aponta que 24 de 30 cidades com mais de 100 mil habitantes no estado têm índices de violência superiores à média brasileira.
A capital ainda não está nessa lista, mas o reflexo da selvageria se vê nas areias do cartão postal. Há cada vez mais notícias de tentativas de linchamento nas praias da Zona Sul. Gente que desacredita as instituições e prega que a “lei da selva” impere. Gente que enxerga algum tipo de justiça cada vez que um preto pobre é executado. Com o Rio entregue às milícias, a morte é menos importante do que a previsão do sol. Vida que segue.
É claro que nenhum crime é mais grave do que outro, assim como nenhuma vida tem mais valor do que outra. Mas algumas mortes viram símbolos de nossa falência como sociedade. Não é concebível que num estado pretensamente democrático um homem seja morto porque foi cobrar um pagamento atrasado. Tanto faz se na Baixada, na Barra da Tijuca ou na Zona Sul. Não é admissível que a morte da vereadora de uma capital continue sem solução depois de quase quatro anos.
A pergunta que se junta a tantas outras agora é: quem matou Moïse?