Bolsonaro e Clemenceau

*A guerra é uma coisa demasiado grave para ser confiada aos militares – Georges Clemenceau, primeiro-ministro da França, 1917-1920

Adendo ao post anterior: mais dois oficiais generais no governo, desta vez em Itaipu, nono e décimo. Errado? Absolutamente. Os militares são, junto com os diplomatas, os funcionários públicos mais treinados do Brasil. E são cidadãos como quaisquer outros, portanto não há nada que os impeça de ocupar cargos públicos. E estão ou na reserva ou são reformados, portanto não há como voltarem à ativa. A menos, no caso dos primeiros, que o Brasil entre em guerra contra a Venezuela.

Nove generais em postos de primeiro escalão – excluído o vice-presidente, também general – em um governo civil, leva a pensar sobre nosso regime representativo. Os oficiais generais do governo Bolsonaro ocupam cargos que na normalidade democrática – ainda estamos nela – são de extração civil, política ou na sociedade civil. Em  um governo com o de Jair Bolsonaro, que fez sua carreira como deputado em franco antagonismo à política civil e em exaltada celebração das virtudes da ditadura, a presença de tantos generais em funções políticas leva a pensar sobre nossa democracia – assim dita – representativa.

Como se trata de Jair Bolsonaro já fomos longe, como ele este post teria que ser escrito em monossílabos, aos arrancos. Basta dizer o seguinte: nossa democracia representativa só tem representação no Congresso, onde na sua maioria estão os piores, caricatos, desonestos, enfim os que parecem responder ao que espera a sociedade brasileira (excluídos os que estão presos, políticos ou não). Uma representação esquizofrênica: os eleitores escolhem os seus, os que os representam, para o Congresso. Não é novidade nem absurdo, há disso em todo mundo. Entre nós choca pela extensão e pela intensidade, coisa muito nossa.

Mas para o Executivo o eleitorado escolheu, com avassaladora votação, alguém que se cerca de generais. Ou seja, o presidente não confia no povo que o elegeu. Ele chegou à presidência num golpe do destino, o atentado que o manteve longe da interlocução dos comícios e do debate televisivo. Esse povo confia cegamente no presidente – ainda, pois é volúvel. O presidente sabe que em eventual crise não será o povo que o manterá no poder. O presidente sabe que em eventual crise serão os generais que irão mantê-lo no poder. Quem sabe, lá no recôndito inconsciente coletivo, seja isso o que o povo quer: a volta dos generais.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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