Diário da Crise LXIII

Quando o video tão comentado ainda estava nas mãos do Ministro Celso de Mello, afirmei que ele daria uma boa série. Havia tantas coisas nele, que talvez fosse necessário dividí-lo em capítulos.

Ontem, escrevi apressadamente sobre o conjunto. Numa visão impressionista, considerei o video não uma reunião mas uma pajelança.

Este termo foi inventado por Brizola e é usado para designar encontros cujo único objetivo é animar as pessoas, sobretudo quando a moral anda baixa.

A imprensa já discutiu amplamente o tema central da reunião. Bolsonaro queria ou não interferir na PF? O vídeo ajuda a demonstrar isso, mas necessita de conexão com fatos anteriores e posteriores a ele. Aliás quase todas as investigações são um quebra cabeça em que as peças se encaixam pacientemente.

Vou falar hoje de algo que me impressionou e acho que daria um capítulo dessa série. Bolsonaro disse que as pessoas precisavam se armar e que seu governo iria estimular isso.

Aparentemente não há novidade. Mas olhando de perto, há uma grande novidade. Bolsonaro defendeu armar as pessoas para que se protegessem num contexto de violência urbana. No vídeo, ela falar em armar as pessoas para que defendam sua liberdade e posições políticas.

Num determinado momento, ele chegou a afirmar que se estivessem armadas, as pessoas resistiriam contra a quarentena.

Concordo com ele sobre as algemas, sou contrário ao uso de algemas, exceto em pessoas que representem perigo. Mas acho arriscado estimular as pessoas e usar armas para resolver suas divergências políticas.

Os generais estavam ao lado dele e nem se importaram com a fala. Parecem ignorar o que isso representa. Ou imaginar que liberando o uso das armas, eles serão compradas apenas por bolsonaristas.

A visão de Bolsonaro planta a semente de uma guerra civil no país. Creio que não ignora isso e ache uma guerra necessária.

As Forças Armadas, que tem o monopólio das armas, deveriam evitar isso. O Exército chegou a formular três portarias que controlam e rastreiam armas. Elas cairam por ordem de Bolsonaro.

Enfim, esse um dos lados mais perigosos que o vídeo nos mostrou. Quem nos garante que bolsonaristas armados aceitam com facilidade o resultado de uma eleição em que seu líder for derrotado?

O mais delicado nesse história é explicar para os filhos o que significou essa reunião?

Muita gente ficou perplexa com o nível governo que temos e não entende como a pandemia do coronavírus foi tão pouco e marginalmente citada numa reunião do Conselho de Ministros.

O que mais ouvi foi isso: assustador Mas esse é o nosso país. Já que muitos de nós decidiram viver para sempre por aqui, não há outro caminho senão fazer alguma coisa para mudar. Isso pode ser um alento para os dias que restam.

No meu artigo de segunda no Globo termino com essa frase: dessa vez não cairemos no erro de resistir com armas. Aprendemos com o passado e inventaremos novas táticas.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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