Calculo o Inferno apenas como Sufoco Gelado subindo dos pés à cabeça. Sinistramente, silenciosamente, congelante. Depois, nada. Silêncio e névoa.
Se dizem que o Paraíso é o dolce far niente, o nirvana… o Inferno é o não poder fazer. Querer e não poder. Paralisia gelada. A indiferença do outro lado.
Vá procurar os caminhos do Céu e do Inferno em todas as gravuras e pinturas antigas. Bosch fica parecendo jardim de infância perto das orgias dos sites da internet. Bruegel é santo padre. Nos sites tudo muito colorido, explosivo e humano
Pobre Corão que descreve o Céu como lugar onde abundam jardins, fontes, vinho e virgens encantadoras. Tudo é permitido, mas tudo isso é muito humano. Apenas delícias que eram proibidas aqui na Terra. Permitir lá, num lugar onde ninguém tem inveja, é pregar no deserto. No Inferno, encontrar demônios alados é apenas figura de retórica. Aqui já temos todos os demônios. O nosso Céu é pegar o proibido aqui mesmo. Quem quer ser Caronte e receber a moeda da boca do cadáver? No entanto, a Felicidade na Terra é essa. Cada moeda que pegamos para nós, vem da boca de um morto.
O Apocalipse mesmo é muito humano. Um homem-bomba com carga suficiente para detonar a Terra inteira. Mas o sussurro do gelo sufocando é imbatível. Articulações enregeladas, alma dura, pensamentos formando estalactites. O frio, o frio, o frio… e o nada.
*Rui Werneck de Capistrano é entregador de gelo em barras