Bolsonaro & Mourão reescrevem a História do Brasil

Em breve, os novos livros didáticos, editados pelo Ministério da Educação do pastor Milton Ribeiro, vão contar a nova História do Brasil, reescrita a quatro mãos pelo capitão Bolsonaro e o general Mourão.

* A Ditadura Militar (1964-1985) nunca existiu. Foi uma ação patriótica de cunho preventivo, deflagrada para salvar o Brasil das garras do comunismo internacional que comia criancinhas, antes que elas fossem colocadas sob a tutela da pastora Damares à sombra da sua goiabeira.

* O juramentado torturador Brilhante Ustra nunca torturou ninguém. Era um homem honrado, um herói nacional, que defendia os direitos humanos dos seus subordinados (e mandava os inimigos para o inferno, de onde nunca deveriam ter saído).

* O Brasil foi o país que melhor combateu a pandemia do coronavírus e evitou uma recessão econômica que poderia provocar o desemprego, a fome e a miséria. Já pensaram nisso? Se morreram mais de 150 mil brasileiros e mais de 5 milhões foram contaminados pela Covid-19 a culpa não é do governo, mas das vítimas.

* É mentira da imprensa comunista internacional que os incêndios tenham calcinado 26,5% do Pantanal e consumido 13 mil quilômetros quadrados da Amazônia. As fotos de satélite foram tiradas na Califórnia. Nossas gloriosas Forças Armadas mobilizaram todos os seus batalhões para impedir que isso acontecesse aqui.

* Ninguém no mundo protege mais o seu Meio Ambiente do que o Brasil, graças aos esforços do general Mourão e dos óculos do seu ajudante de ordens Ricardo Salles, que enxerga longe, além da brava atuação dos bois bombeiros.

* Ricardo Salles é um humanista impoluto, defensor das matas e dos povos indígenas, que arriscou a própria vida para apagar o fogo e passar a boiada.

* Nossas crianças foram liberadas para trabalhar a partir de qualquer idade, em qualquer serviço, pois se trata de uma atividade saudável e educativa. Quando crescerem, poderão frequentar as escolas cívico-militares construídas pelo governo teocrático-miliciano implantado em 2019, que deu origem à nova História do Brasil.

* Agora só morre a bala quem for trouxa. Foram liberadas armas e munições à vontade para todos se protegerem contra os inimigos da liberdade de ir e vir.

* A violência doméstica só existe nos lares em que as mulheres não chamam mais os maridos de senhor e não obedecem às suas ordens.

* Os militares convocados para servir ao governo, em vez de dar golpes, agora ganham salário dobrado para cumprir uma missão patriótica, com grandes sacrifícios pessoais. O general Pazuello até descobriu a existência do SUS.

* A corrupção foi banida de todo o território nacional. Laranjais, rachadinhas, funcionários fantasmas, mochilas de dinheiro vivo e lojas de chocolate são coisas do passado.

* Acabou a inflação. Se alguém ainda está aumentando os preços, o governo não pode fazer nada, a não ser apelar para o patriotismo.

* A nova Previdência é igual para todos, assim como a lei, com a honrosa exceção dos militares, juízes, parlamentares e amigos do rei.

* Marielle não foi fuzilada pelas forças da lei e da ordem. Quase mil dias após a sua morte, desconfiamos que ela se suicidou com vários tiros para colocar a culpa no governo.

* Fabrício Queiroz é inocente. Trata-se apenas de um benemérito de famílias carentes, que deposita cheques para pagar as contas no fim do mês, sem pedir nada em troca. Foi o inspirador da política econômica de Paulo Guedes, que tira dos pobres e paupérrimos para dar aos maganos e aos bancos porque eles garantem os nossos empregos, o equilíbrio fiscal e os investimentos.

Em tempo: esse texto contém uma certa dose de ironia, mas é baseado em declarações e pensamentos oficiais. Imprima-se.

Vida que segue.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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