Lágrimas mostram que Bolsonaro ainda é capaz de se emocionar

Presidente que se dizia “imbrochável” chora em público às vésperas de perder o cargo e o foro privilegiado

Para quem gostava de se dizer “imbrochável”, a cena não deixou de surpreender. Às vésperas do fim do mandato, Jair Bolsonaro perdeu a pose e chorou. O capitão estava no Clube Naval de Brasília, onde participou da confraternização anual das Forças Armadas.

A solenidade não tem mistérios. Acontece sempre em dezembro, o mês das inevitáveis reuniões natalinas. Pelo protocolo, o presidente é recebido pelos comandantes militares, faz um discurso e cumprimenta os oficiais-generais recém-promovidos. Depois todos se juntam para um almoço festivo.

O beija-mão de 2022 teve início pela Marinha. Ao lado da primeira-dama, Bolsonaro foi saudado por novos almirantes de esquadra, vice-almirantes e contra-almirantes. Quando o 13º se aproximou com sua mulher, o capitão começou a fraquejar. Na vez do 14º, debulhou-se em lágrimas diante das câmeras e da plateia fardada.

Em anos anteriores, os presidentes usaram a cerimônia para cortejar os militares e enaltecer os próprios feitos. Em 2010, Lula driblou o roteiro e arriscou uma piada. Disse ter descoberto que o jato presidencial, então chamado de Aerolula, não pertencia a ele. “Agora vai virar Aerodilma. Perdi meu avião”, gracejou.

Em sua vez de se despedir, Bolsonaro não quis usar o microfone. Entrou mudo e saiu calado, como tem ocorrido em suas raras aparições desde a derrota nas urnas.

O choro presidencial não gerou muita comoção. Bolsonaro se notabilizou como um governante insensível. Não derramou uma lágrima pelos mais de 690 mil brasileiros que morreram na pandemia. Em março de 2021, ainda debochou da dor das famílias enlutadas. “Chega de frescura, de mimimi. Vão ficar chorando até quando?”, perguntou.

O pranto de segunda-feira mostrou que o capitão também é capaz de se emocionar — desde que os problemas sejam dele, claro. Segundo aliados, Bolsonaro está abatido porque finalmente se deu conta de que não haverá golpe. A Constituição continua em vigor, e ele está prestes a perder o cargo e o foro privilegiado. Agora faltam 25 dias.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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