É hora de rezar

Não serei capaz de dizer que foram 40 minutos de puro desperdício de tempo, porque alguma coisa sempre fica. Depois da “entrevista” concedida pelo enlouquecido de Brasília ao Jornal Nacional, decidi o meu voto. Voto em William Bonner para presidente e Renata Vasconcellos para vice.

O “coiso” chegou com colinha na palma da mão e grande comitiva, imaginou constranger, assim, a Rede Globo. Qual o que! Foi o mesmo de sempre: vazio, idiota, tropeçando na língua e nas palavras e – sobretudo – uma presença profundamente desagradável na telinha.

Eu achava que o indigitado não compareceria ao estúdio global. Compareceu, mas foi como se não tivesse comparecido. Não tem o que dizer, não tem obra para mostrar, só as bobagens e os crimes que cometeu, por ação ou omissão. Em alguns momentos, repetiu o Maluf – lembram-se dele?! Perguntava-se a ele por que fora tão corrupto em sua passagem pela administração pública. E ele com a tradicional cara-de-pau e o sorriso cínico de praxe nos lábios, respondia com convicção: “Quero dizer que ninguém fez mais do que eu no governo”. E desfilava quilômetros de asfalto, viadutos e coisas que tal.

O capitão é o Maluf dos tempos atuais, com algumas pitadas de Collor. Vejo-o na televisão, contenho a ânsia de vômito e indago-me: Como o eleitor brasileiro fui capaz de colocar na presidência do Brasil, para governar o Brasil, um desqualificado desse naipe?!

E o eleitor? Desgraçadamente, é quem dá poderes a essa gente. Em regra, vota em quem as pesquisas apontam na liderança, como se eleição fosse corrida de cavalos. O cardápio que lhe é oferecido também não ajuda.

Então, ao que tudo indica, o capitão vai recolocar no trono o “Sapo Barbudo”, assim nomeado pelo velho Brizola. Ele, em si, recasado recentemente, não será o grande problema. A desgraça será quem ele trará de volta – aquela malta, tão daninha quanto os milicos de hoje – que repetizarão o Brasil e saborearão o poder pelo poder. E a conta será paga por todos nós.

Por isso, se você é religioso, prezado leitor, reze; se não é, chore. De minha parte, lembro-me, com profunda tristeza, das cartas de Albino Forjaz de Sampaio, da Academia das Ciências de Lisboa, publicadas em “Palavras Cínicas”, editadas pela livraria carioca H. Antunes, nos idos de 1936 e mais atuais do que nunca, e das quais extraio trecho da Primeira Carta:

“Aqui, para triunfar, é preciso ser mau, muito mau. Sê mau, cínico, hipócrita e persistente que vencerás. Serás aclamado, respeitado, invejado. Ri do Bem e da Virtude, da Alma e do Sentir. Ri de tudo, que é preciso que rias. Abafa um protesto com um sorriso, uma agonia com uma gargalhada, um estertor com uma praga.”

“Não ames nem creias. Todo homem que ama é homem perdido e todo aquele que crê nunca será ninguém. (…)

“Lembra-te que o ódio dá mais prazeres que o Amor.

“Se és bom, serás ridículo; se és mau, serás temido.

“Ou serás vencido ou vencedor. Se vencido, esperam-te todas as humilhações, desde o desprezo até a compaixão. Se vencedor, todos os triunfos, desde o respeito ao Capitólio.”

Dito isso, hoje nada mais digo. Não sou religioso, mas vou rezar. Já cansei de chorar.

P.S. – Ao contrário do desequilibrado do Planalto, Ciro Gomes foi bem na sabatina da Globo. Dominando o costumeiro destempero, mostrou conhecer os problemas do Brasil e ter um programa de governo, ao contrário dos demais concorrentes. Aí está um candidato a ser considerado. Vou considerar.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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