Com esperança e confiança

Do alto de sua sabedoria, Rubem Alves dizia que a melhor coisa do mundo era poder escrever para o público. Mas, logo emendava que a pior também era. Nunca se sabe verdadeiramente o resultado, posto que, na maioria das vezes, apenas as discordâncias são publicadas. E normalmente, sem argumentos, apenas crítica pelo prazer de criticar.

De minha parte, já lhes disse e repito: colunista de jornal ou de blog é um ser solitário. Escreve para ser lido, mas nem sempre sabe se isso acontece. E, quando acontece, qual é o desenlace. Também não espera que o leitor concorde com as opiniões dele. Não pode nem deve. Mas, quando as manifestações aparecem, a favor ou contra, é sempre uma satisfação.

Mestre Zé Beto acha que escrevemos para nós mesmos. Numa das várias vezes em que decidi encerrar a luta e ele indeferiu a pretensão, disse que aprendeu isso com a caminhada. “Você precisa expor o que pensa em meio a essa balbúrdia incompreensível que é o Brasil hoje”. Sublinhou: “escrever é o que sustenta nossa alma. E quanto mais vivemos, seguindo o conselho de Nelson Rodrigues, para envelhecer rapidamente, um pouco de clareza para olhar em volta a gente tem”. E para fechar a negativa de baixa: “Você me apresentou o seu mestre Rubem Alves e eu vou apresentando ele – e você – a quem nos lê”.

Então, eis-me aqui novamente, em homenagem ao grande Zé Beto, um dos maiores jornalistas que conheci, competente, valente, destemido, imparcial. Além do que, um exemplo de vida, que enfrentou os vícios da juventude com galhardia e deu a volta por cima. É uma honra acompanhá-lo.

O que escreverei doravante, não sei. Talvez nada ou muito pouco sobre o psicopata que tomou Brasília de assalto. Ou sobre o piá de calças curtas que ora habita o Palácio Iguaçu. São a prova viva de como o Brasil anda carente de líderes, de administradores, de homens públicos. Sobrou-nos o rebotalho.

Para preencher este espaço sagrado, vou recordar-lhes a história do homem que gosta de flores. Nem meu é o texto, mas me foi enviado, anos atrás, por um gentil amigo e o acolhi com prazer. É oportuno porque fala de confiança e esperança, artigos raros hoje na praça.

O nome dele é Damásio de Jesus. É um homem que gosta de flores. E o seu gostar não é de hoje. Vem de longa data. Aliás, para ser mais exato, ele é louco por flores. Essa preferência – confessa – faz parte da sua própria natureza. Aprecia as flores sofisticadas, mas também ama as mais simples. Se alguém lhe perguntar como é, ele diz que é assim mesmo: é capaz de ficar horas e horas contemplando uma orquídea ou mesmo uma simples margarida.

Alguns anos atrás, Damásio quase perdeu o juízo. Neuza, sua mulher, levou-o a uma escola, em Bauru, no interior de São Paulo, e lá ele encontrou uma imensa árvore de folhas vermelhas. Resultado: durante uma semana, não falou de outra coisa em casa. Ele queria uma árvore como aquela para plantar em Arealva. Pois Neuza lhe fez uma grata surpresa: deu-lhe de presente oito mudas da planta de folhas vermelhas, que se chama eretrina. E todas elas Damásio plantou.

Durante todos os anos cuidou pessoalmente de cada uma delas. Viu as árvores crescerem e, a cada ano, indagava: “Será que este ano elas florescem?” Ficou aguardando ansioso as flores vermelhas brotarem dos galhos. As plantas, porém, não davam a mínima para a impaciência dele. Mesmo assim, cresceram quatro metros.

Afinal, as árvores floresceram. Mas nenhuma flor nasceu vermelha. Desabrocharam brancas, feias, opacas, completamente desbotadas. Damásio ficou triste, decepcionado. Ele queria flores vermelhas, e elas nasceram brancas. Não se conformava de ter esperado tanto tempo em vão.

-– Vou cortar estas árvores. Nós fomos enganados – disse à mulher.

Neuza interveio, com o bom senso feminino:

-– Você esperou tanto tempo. Por que não espera um pouco mais para ver o que acontece? Quem sabe elas não nascem assim e, aos poucos, vão mudando de cor?

Não é que Neuza, para variar, tinha razão!… As flores brancas desbotadas, de repente, começaram, pouco a pouco, a ficar vermelhas. Um verdadeiro espetáculo. Um deleite. E Damásio sofre só de pensar que, por pouco, a sua impaciência não pôs tudo a perder.

Hoje, Damásio ensina a quem quiser aprender que na vida tudo é assim. Se você sonhou com uma coisa e recebeu outra, confie, espere.

– Se você crê em Deus – assegura – tenha a certeza de que Ele sempre dá o que você precisa, no momento certo. Por isso, em vez de duvidar ou reclamar, siga em frente. O espinho de hoje pode ser a flor de amanhã. É preciso saber esperar, dar tempo ao tempo para as coisas acontecerem naturalmente. Até mesmo as flores só mudam de cor quando chega a hora.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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